Atriz se firmou como um dos rostos mais conhecidos da televisão com papéis emblemáticos e marcou sua carreira com humor e drama
A atriz campo-grandense Aracy Balabanian morreu aos 83 anos, na manhã de segunda-feira (7). A morte foi confirmada pela assistente pessoal da artista. Durante a carreira, ela colecionou papéis inesquecíveis, firmando-se como um dos rostos mais conhecidos da televisão brasileira. Conhecida pela versatilidade, marcou a TV com humor escrachado e drama profundo. Entre seus trabalhos mais conhecidos na televisão, está a personagem Cassandra, do programa “Sai de Baixo”, exibido pela TV Globo entre 1996 e 2002. Além disso, deu vida à célebre Dona Armênia, na novela “Rainha da Sucata”, um de seus trabalhos mais conhecidos.
Artistas lamentaram a morte da atriz e prestaram homenagens. Miguel Falabella, que contracenou com Aracy em “Sai de Baixo”, afirmou que tem lembranças coloridas e ensolaradas com a artista. “Minha amada Aracy, minha rainha, atriz de primeira grandeza, companheira irretocável, amor de muitas vidas. Obrigado pela honra de ter estado ao seu lado, exercendo nosso ofício, obrigado pelo afeto, pelos conselhos, pelas gargalhadas e pela vida que você tão delicadamente me ofereceu”.
Alexandre Borges disse que a artista vai fazer muita falta, pois era uma mulher fantástica, mas que deixa muitas obras. “Ela era uma amiga pessoal, linda, e deixa trabalhos maravilhosos”, disse, no programa “Encontro com Patricia Poeta”. Isabel Teixeira, que interpretou Maria Bruaca em “Pantanal”, homenageou a atriz e disse que vai continuar a seguir os passos trilhados por ela. “Aquele nosso encontro, quase marcado, vai ficar para mais tarde. Fica aqui minha singela homenagem e a promessa de que seguirei como uma navegadora atenta à rosa dos ventos desenhada por você. Todo meu amor a essa atriz maravilhosa, que deixa sua marca em várias gerações.”
Em Campo Grande
Na Capital, a FCMS (Fundação de Cultura de Mato Grosso do Sul) divulgou uma nota lamentando profundamente a morte da atriz Aracy Balabanian. “A atriz é filha de armênios que vieram para o Brasil, fugindo do genocídio promovido naquele país pelos turcos otomanos. Eles fixaram residência em Campo Grande, onde Aracy e os irmãos nasceram. Aos quinze anos, mudou-se para São Paulo com os sete irmãos e ajudava os pais na criação dos menores. Passou no vestibular para ciências sociais e para a Escola de Arte Dramática, vindo a abandonar os estudos de sociologia para se dedicar ao teatro, sua verdadeira paixão. Diz que viveu numa época que era considerado feio uma mulher fazer teatro, já que antigamente as mulheres tinham preferência a serem donas de casa e cuidarem dos assuntos domésticos… Diante desta perda irreparável, nos solidarizamos com amigos e familiares, neste momento tão difícil”, diz a nota.
Em Campo Grande, a atriz foi homenageada com o seu nome no teatro Aracy Balabanian, no Centro Cultural José Octávio Guizzo, que está fechado para reforma desde 2016. Em 2022, o Governo do Estado anunciou uma reforma no local com estimativa de investimento de R$ 8 milhões. A coordenadora do Centro Cultural José Octávio Guizzo, a atriz e produtora cultural Luciana Kreutzer, lamentou a morte da atriz e disse que estava nos planos convidá- -la para a reinauguração do espaço. “A previsão de entrega da reforma é o ano que vem e estava nos meus sonhos, nos planos da inauguração, convidar a Aracy. Sobre o teatro, eu assumi a gestão do Centro Cultural em 2017 e quando eu cheguei, o teatro já estava fechado. Ele foi fechado por por conta de falta de manutenção, tivemos algumas dificuldades administrativas para manter a manutenção em dia, tanto do prédio quanto do teatro. Ele já passou por duas reformas importantes. Ele tem quase 40 anos e o espaço é muito importante, porque ele foi berço da arte em Campo Grande, o centro cultural como um todo foi responsável pelo nascimento de muitos trabalhos. Muitos grupos que existem até hoje e que continuam reverberando com seus trabalhos, com seus projetos e a gente também entende a importância dele como uma questão de referência para os artistas locais. O teatro Aracy Balabanian foi palco de circuitos nacionais, que faziam troca com os grupos locais, com oficinas, por exemplo”.
O ator, professor e diretor de teatro, André Tristão, destacou a grande relevância artística nacionalmente de Aracy. “Eu iniciei minha carreira no teatro fazendo oficina no Centro Cultural José Octávio Guizzo e me apresentando no teatro Aracy Balabanian! Fico muito honrado por isso! Apesar dela não ter tido efetivamente uma relação com a nossa terra e com o teatro (espaço físico), mas, de alguma forma, pôde nos representar nacionalmente. Uma atriz de grande qualidade. Uma grande perda para o Brasil! Sem dúvida, Aracy jamais será esquecida! Em nossa Capital, o teatro que tem o seu nome está passando por um processo de reforma longo e demorado! Nós, artistas, não temos um teatro público para nos apresentar, Aracy não estará aqui para ver ele voltar a funcionar e tampouco não teremos ela de corpo presente na reinauguração”, lamentou o artista.
Carreira
Atriz, de origem armênia, era sul- -mato-grossense, de Campo Grande. Iniciou sua carreira em 1963, aos 23 anos. Mas a ligação com a dramaturgia surgiu antes, quando ela tinha 15 anos e assistiu a uma peça de teatro da atriz Maria Della Costa (1926-2015). A experiência a impactou fortemente, a ponto de revelar que era aquilo que queria fazer na vida. Entretanto, a atriz costumava dizer em entrevistas que viveu numa época em que era considerado feio uma mulher fazer teatro.
“A mulher era educada para ser dona de casa e obedecer ao marido”.
Boa aluna, a jovem estudou no colégio Bandeirantes, que lhe deu o suporte para entrar na Faculdade de Filosofia da Universidade de São Paulo, no curso de ciências sociais e, ao mesmo tempo, na Escola de Arte Dramática (EAD). Acabou abandonando, no terceiro ano, o curso de ciências sociais para terminar o de arte dramática com louvor, pois lá havia tudo o que precisava para se realizar. Na peça de formatura, encenou “Macbeth”, interpretando a personagem Lady Machbeth, que lhe rendeu uma nota 10. A peça “Os Ossos do Barão” (1962), de Jorge Andrade (1922-1984), foi a primeira que a atriz, então com 22 anos, participou ao ingressar no Teatro Brasileiro de Comédia (TBC). A obra foi um sucesso absoluto, com mais de 500 apresentações, sendo assistida por mais de 125 mil espectadores, permanecendo quase dois anos em cartaz.
Apesar do sucesso já no começo da carreira, Aracy enfrentou resistência do pai, que não aceitava ter uma filha na dramaturgia. No entanto, ela não desistiu e estreou na televisão em 1968, em uma montagem de “Antígona”, de Sófocles, na extinta TV Tupi. O apoio e a concordância só aconteceram quando a artista participou da novela “Antonio Maria” (1968), protagonizada por Sérgio Cardoso (1925-1972), ator de quem seu pai era profundo admirador. Foi assim que ele, além de aceitar a profissão da filha, passou a ser seu fã.
Na TV, a atriz viveu uma fase de ouro, atuando em novelas consideradas clássicas, como “Nino, o Italianinho” e “A Fábrica”, escritas por Geraldo Vietri (1927-1996). Depois do sucesso arrebatador que obteve com esses folhetins, a atriz foi convidada para realizar, na TV Globo, em parceria com a TV Cultura, o cultuado programa infantil “Vila Sésamo” (1972), durante dois anos. “Meu orgulho e felicidade é de ter feito esse programa. As crianças aprendiam a ler e a contar”. (Com informações da Folhapress).
‘Hoje seria crucificada pela Dona Armênia’, disse Aracy Balabanian em 2017
Aracy Balabanian achava que seria “crucificada” pela Dona Armênia, sucesso de “Rainha da Sucata” (1990) e “Deus nos Acuda” (1993), se o personagem fosse mais recente.
“Os armênios eram contra. (Para eles,) era um deboche, diziam que não falavam daquele jeito”, disse a artista ao Video Show (Globo), em 2017. O apresentador Otaviano Costa questionou como seria viver o personagem numa época, com a internet. “Eu ia ser crucificada”, respondeu Aracy. A artista disse que demorou a fazer comédia: “Fui sempre considerada a trágica brasileira. Até que o Silvio de Abreu começou a me chamar para papéis de comédia”.
Na ocasião, ela contou o trabalho que mais a orgulhava: “Meu maior orgulho e felicidade foi ter feito ‘Vila Sésamo’ (1972). As crianças aprendiam a ler, muita gente dizia ‘meu filho não falava e começou a dizer ‘um, dois, três, quatro, cinco…’. Já me chamaram de ‘a minha Xuxa’”. A atriz morreu nesta segunda-feira (7), aos 83 anos. Segundo a TV Globo, ela enfrentava um câncer de pulmão.
Aracy Balabanian nasceu na cidade de Campo Grande, em fevereiro de 1940. Segundo a TV Globo, a atriz é filha de imigrantes armênios e passou a morar em São Paulo ainda criança. Foi na capital paulista que Aracy teve o primeiro contato com o teatro. “Estava emocionada porque era aquilo que eu queria. É muito difícil para uma criança de 12 anos, ainda mais naquela época, querer ser atriz e já perceber que ia ter muitas dificuldades”, disse, em entrevista publicada pelo site da emissora.
Destaque na TV
Após enfrentar a resistência do pai, Aracy estreou na TV Globo com a novela “O Primeiro Amor” (1972), de Walther Negrão. Ela interpretou a psicóloga Giovana, que disputou o amor de Luciano (Sérgio Cardoso) com Paula (Rosamaria Murtinho) e Maria do Carmo (Tônia Carrero). O primeiro papel de destaque na TV veio com Gabriela, do programa infantil “Vila Sésamo” (1973). Já como protagonista, Aracy gravou as novelas “Corrida do Ouro” (1974) e “Bravo!” (1975).
Entre 1986 e 1988, a atriz participou de duas novelas da Rede Manchete. Após fazer parte dos elencos de “Mania de Querer” (1986) e “Helena” (1987), ela retornou à Globo para “Que Rei Sou Eu?” (1989). Um dos principais papéis da artista veio em “A Próxima Vítima” (1995). Ela interpretou Filomena Ferreto durante a exibição do sucesso da TV Globo. Antes, Aracy fez grande sucesso com o papel de Dona Armênia em “Rainha da Sucata” (1990). Ambas foram escritas por Silvio de Abreu.
A carreira de Aracy ficou marcada pela personagem Cassandra, em “Sai de Baixo”. Durante o programa de humor que permaneceu no ar por seis anos, a artista contracenou com Miguel Falabella (Caco Antibes), Luís Gustavo (Vavá), Marisa Orth (Magda), Tom Cavalcante (Ribamar) e grande elenco. Após o sucesso do humorístico, Aracy ainda atuou nas novelas “Sabor da Paixão” (2002), “Da Cor do Pecado” (2004), “A Lua me Disse” (2005), “Eterna Magia”, (2007), “Passione” (2010), “Cheias de Charme” (2012), “Saramandaia” (2013), “Geração Brasil” (2014), “Sol Nascente” (2016) e “Pega- -Pega” (2017). Em 2019, fez seus últimos trabalhos como atriz. Naquele ano, atuou em “Sai de Baixo – O Filme” e participou do especial de fim de ano da TV Globo, “Juntos a Magia Acontece.
Aracy optou por não se casar e ter filhos
Aracy Balabanian manteve relacionamentos amorosos com homens anônimos e famosos, mas optou por não se casar e não ter filhos, para se dedicar completamente à sua carreira. Em entrevista para “Quem”, Aracy revelou o motivo desta decisão: “Tenho vários filhinhos. Tenho 13 sobrinhos, 12 sobrinhos-netos e já, já serei bisa- -tia-avó, acho que é isso. E tenho Antônia (Sampaio Saraceni), minha afilhada, uma paixão na minha vida. Está com 10 anos, é filha da Gogoia (Sampaio, figurinista), participo de tudo da vida dela. Levo ao dentista, ao balé. Amo comprar roupinhas. Ela tem cabelo cacheado e, de vez em quando, quer fazer chapinha… Pego de cabelo cacheado e a entrego de cabelo liso”, disse ela, na época.
Além disso, Aracy Balabanian já contou, em sua biografia “Nunca Fui Anjo”, que realizou dois abortos. O primeiro, devido à falta de condições financeiras para ser mãe solteira e o segundo por não querer um filho do homem que a engravidou. “A profissão não era regulamentada, não tínhamos bons salários, licença-maternidade e direitos”, diz, no livro. “Fiz um segundo aborto porque meu filho teria um pai que não desejaria para ninguém.
Por – Ana Cavalcante e Kátia Kuratone
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