“É de duvidosa validade jurídica o que se fez”, destaca advogado sobre criação de Comitê pela prefeitura

Foto:Arquivo/O Estado de MS
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Em meio a promessa de melhorias, Ministério Público deve investigar falta de água no CRS Tiradentes

A Prefeitura Municipal de Campo Grande confirmou na segunda-feira (8) que por meio do Decreto n. 16.372, de 5 de setembro de 2025, o Comitê Gestor da Secretaria Municipal de Saúde, de caráter provisório, com vigência de seis meses. No entanto, a decisão tem gerado polêmica e questionamentos sobre a validade dessa medida.

Em entrevista ao Jornal O Estado, o advogado André Borges, confirmou que a falta de comunicação entre a prefeitura e a Câmara de Vereadores para uma tomada de decisão tão significativa, levanta questionamentos sobre a sua validade. “É de duvidosa validade jurídica o que se fez. Lei criou toda uma estrutura e competências para a Secretaria de Saúde. Decreto não pode superar a eficácia de uma lei. O Comitê Gestor foi criado por Decreto. A Câmara de Vereadores sempre deve participar de atos importantes para a vida dos cidadãos. Numa república mais importante é o Legislativo, não o Executivo”, pontuou.

Segundo a prefeitura de Campo Grande, a medida administrativa faz parte do processo de reformas iniciado pela atual gestão, a partir da identificação de ações necessárias para a melhoria no desempenho e eficiência dos serviços prestados à população.

No entanto, desde a sua apresentação, após a retirada da ex-titular da Sesau, a Drª Rosana Leite, o tema tem gerado debates. A primeira delas, aconteceu ainda durante reunião com o comitê, quando o presidente da Comissão de Saúde da Câmara, vereador Vitor Rocha (PSDB), cobrou da prefeita e da equipe jurídica uma explicação sobre a ausência de um secretário formalmente nomeado para o comando da Sesau.

“Eles sustentam que o Comitê é legal, mas defendo que Campo Grande precisa de um secretário de fato e de direito, mesmo que interino”, disse Rocha. “Uma cidade com quase um milhão de habitantes, mais de 6 mil servidores na Saúde e um orçamento bilionário precisa de uma liderança dedicada integralmente”.

Além disso, o parlamentar elencou os principais desafios enfrentados pela rede, como a judicialização da saúde, o colapso na regulação hospitalar e a sobrecarga nas UPAs. “Sem nomeação, a prefeita acaba acumulando as funções de chefe do Executivo e da Saúde, concentrando responsabilidade demais em uma única pessoa”, alertou.

O tema voltou a ser alvo de discussões, ontem (9), durante a 48ª Sessão Ordinária da Câmara, quando o presidente, vereador Epaminondas Neto, Papy (PSDB), reforçou que também ficou surpreso com o anúncio e que pediu para que a Comissão de Saúde acompanhe os passos dados pelo grupo instituído.

“É legítimo que a comissão de saúde esteja a frente deste assunto, o que eu sei é que alguma coisa precisa ser feita. Qual seja a estratégia, alguma coisa precisa ser feita. Isso só evidencia que estamos no fim da linha para a saúde de Campo Grande como nunca antes estivemos”, afirmou.

Por sua vez, o vereador Carlos Augusto Borges (Carlão PSB), 1⁰ Secretário da Mesa Diretora da Casa de Leis, opinou que a Câmara precisa lutar pela revogação desse decreto. “Se o projeto chegar aqui hoje eu voto favorável, mas do jeito que está, está ilegal. Isso vai dar problema, vão ter que devolver dinheiro, se tem a Câmara para votar e dar legalidade é só mandar pra cá”, disse.

Pacientes sem banho
Enquanto as discussões sobre a saúde permanecem, os pacientes enfrentam situações críticas. A vereadora Luiza Ribeiro (PT) denunciou ontem (9) a falta de água no CRS (Centro Regional de Saúde) do bairro Tiradentes, que está sem abastecimento de água desde o último sábado (6). A parlamentar informou que vai comunicar o Ministério Público sobre o caso e cobrou providências imediatas da Sesau (Secretaria Municipal de Saúde).

Segundo Luiza, desde domingo (07) ela vem recebendo mensagens de profissionais de saúde e pacientes relatando a falta d’água na unidade. “Nós fomos no CRS Tiradentes, chamados pelas equipes médicas e usuários do SUS, por causa do caos que está essa unidade. Desde sábado está faltando água. Como é que se faz atendimento clínico sem água? Pacientes estão sem tomar banho, com medo de usar os banheiros, e as equipes não têm condições de realizar os atendimentos adequadamente. Água é essencial para limpeza, higiene, atendimento e até para oferecer aos pacientes”, afirmou.

A vereadora destacou que a Vigilância Sanitária prevê normas que garantam condições mínimas de higiene e que uma unidade de saúde não pode funcionar sem água. “Já falei com o secretário de Governo, com assessores da Secretaria de Saúde, mas até agora não tivemos uma solução. A unidade está sem direção desde sábado, pois a diretora está de licença maternidade, e a transição na secretaria está desorganizada. Solicitamos que os pacientes sejam removidos com urgência e que o atendimento emergencial seja suspenso até que a situação seja normalizada”, reforçou.

Luiza informou que o Ministério Público será acionado para acompanhar o caso e cobrar providências.

“O resultado vai ser visível”
A nova coordenadora do comitê gestor da Sesau (Secretaria Municipal de Saúde), Ivoni Kanaan Nabhan Pelegrinelli, afirmou que pretende entregar resultados muito antes do prazo estabelecido pela prefeita Adriane Lopes (PP). “A prefeitura no decreto estimou seis meses. Mas, no nosso plano, isso pode acontecer em um período bem menor. “Muito antes.”, disse Ivoni em entrevista exclusiva ao O Estado.

Ex-secretária de Saúde de Iguatemi, Ivoni foi escolhida para liderar a reestruturação da rede pública de Campo Grande, que enfrenta gargalos como superlotação nas UPAs, falta de leitos hospitalares e fila de espera com mais de 100 mil pacientes.

Segundo ela, o foco da prefeita é reorganizar a estrutura e garantir qualidade no atendimento: “A prefeita quer que os serviços de qualidade cheguem lá na ponta para o usuário do SUS. Ela quer qualidade de serviços”.

Embora o comitê funcione com gestão colegiada, Ivoni afirmou que tem liberdade para decisões urgentes. “Eu tenho autonomia, porque eu sou a gestora do comitê, mas as nossas decisões sempre vão ser tomadas em conjunto, até porque cada um é de uma área”, explicou. “Mas eu tenho total autonomia, porque eu sou a ordenadora de despesa e sou a coordenadora do comitê”.

Ampliação de leitos é prioridade
Um dos principais problemas relatados pela população é a falta de leitos hospitalares. Segundo Ivoni, a equipe já está se movimentando para enfrentar esse desafio: “Já estamos em contato para tentar fazer a compra de mais leitos, de vagas. Estamos em estudo. Então essa será uma questão do comitê: tirar esse gargalo das unidades. É uma das primeiras intervenções”.

Sobre a possibilidade de parceria com a rede privada, Ivoni confirmou: “Já iniciamos um estudo sobre isso”. Ela também destacou que o comitê está em fase de diagnóstico da situação em toda a rede: “O comitê iniciou o trabalho em reunião com o Conselho Municipal, uma aproximação com a Câmara de Vereadores, para entender as demandas e dar continuidade para a nossa reestruturação”.

Crise ou reorganização?
A exoneração da ex-secretária Rosana Leite foi vista como um sinal de crise na gestão da Saúde, especialmente após a série de denúncias e reclamações da população. Ivoni nega que a criação do comitê seja reflexo de instabilidade:

“Esse comitê é para uma reestruturação, para uma melhoria na qualidade da saúde. Esse é o objetivo do comitê: qualidade no serviço para os usuários e para a população de Campo Grande”.

Ela reforça que a gestão colegiada não será permanente: “Eu acredito que é provisória. Só para dar uma reorganização”.

Quem são os membros do Comitê Gestor da Sesau
-Ivoni Kanaan Nabhan Pelegrinelli – Coordenadora Geral;
-Catiana Sabadin Zamarreño – Planejamento e Execução Estratégica;
-Andréa Alves Ferreira Rocha – Jurídico;
-Isaac José de Araújo – Finanças e Orçamento;
-Vanderlei Bispo de Oliveira – Administrativo;
-André de Moura Brandão – Contratações.

Por Suelen Morales e Michelly Perez

 

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