Investigação: Relatório do DenaSUS indica a perda de 13 mil prontuários do CAPS Aero Rancho

Foto: Allan Gabriel
Foto: Allan Gabriel

Uma grave denúncia sobre o descarte irregular de prontuários médicos no CAPS (Centro de Atenção Psicossocial) Aero Rancho, em Campo Grande, desencadeou a Operação SOS Caixa Preta, deflagrada pelo DRACCO (Departamento de Repressão à Corrupção e ao Crime Organizado) em parceria com o Ministério da Saúde, por meio do DenaSUS (Departamento Nacional de Auditoria do SUS). A investigação, iniciada em abril de 2025, aponta a perda de cerca de 13 mil documentos sigilosos, que deveriam estar armazenados legalmente por até 20 anos.

Segundo relatório técnico do DenaSUS, dos mais de 23 mil prontuários relativos ao período entre 2009 e janeiro de 2024, apenas 10% foram localizados, cerca de 10 mil, de acordo com a delegada responsável pelo caso. O diretor nacional do DenaSUS, Rafael Bruxellas, revela que 90% do que foi apresentado não tinha comprovação da existência de prontuários nem físicos, nem prontuários digitalizados.

A análise também apontou que não apenas o sumiço da maior parte dos registros, como também a falta de controle no armazenamento e a ausência de digitalização adequada, mesmo após a contratação de um novo sistema eletrônico pela prefeitura, no valor de R$10 milhões. “Esses dados não foram migrados corretamente, e os prontuários digitalizados tampouco foram apresentados”, afirmou Rafael Bruxellas.

A delegada Ana Cláudia Medina, responsável pela condução da investigação, confirmou que o descarte foi feito de forma irregular e que três servidoras, duas da área administrativa e uma médica, foram afastadas por possível embaraço à investigação. “O que foi materializado até o momento é que os dados informados pelo CAPS não condizem com a realidade. Estamos apurando quem são os responsáveis e como se deu esse descarte”, declarou.

O caso levanta sérias preocupações quanto à continuidade e segurança do atendimento à saúde mental da população, já que a perda do histórico médico pode comprometer diagnósticos, tratamentos e até direitos trabalhistas e previdenciários dos pacientes. “Estamos falando de vidas. Esses pacientes, que ao perderem seu prontuário, perdem também o histórico clínico essencial para garantir um tratamento adequado”, ressaltou Bruxellas.

O diretor do Departamento esclarece que na fase inicial foram respondidas três perguntas, no qual foi possível concluir o relatório. “Essas três perguntas foram que nós nos debruçamos. Em um primeiro momento, houve extravio de prontuário ou não, se os prontuários estavam sendo corretamente armazenados, se havia digitalização desses prontuários e, por fim, se os pacientes tinham acesso a esses prontuários para que a gente não ferisse, para que o município não ferisse o direito dos pacientes”.

O relatório do DenaSUS já foi encaminhado à Defensoria Pública, à Sesau (Secretaria Municipal de Saúde) e à Polícia Civil, que continuarão conduzindo as oitivas e novas diligências. Entre as medidas recomendadas está a criação de uma comissão municipal responsável pela preservação e digitalização dos prontuários, além da possibilidade de reconstrução dos documentos, caso haja viabilidade técnica.

O Ministério da Saúde também alerta para possíveis sanções administrativas. Embora o descredenciamento do município esteja entre as medidas mais extremas, não está descartado caso não consiga comprovar capacidade de manter e prestar adequadamente os serviços. “Nós não vamos repassar recursos se a produção não estiver sendo comprovada corretamente”, frisou o diretor do DenaSUS.

A investigação segue em andamento e pode resultar em responsabilização criminal com base no artigo 314 do Código Penal, que trata da subtração ou inutilização de documentos públicos. O caso, que teve início após denúncias da Defensoria Pública e do Conselho Regional de Psicologia, segue sob vigilância federal e estadual.

Impacto direto nos pacientes

Os prejuízos à população atendida no CAPS Aero Rancho, o mais antigo da Capital, são concretos e imediatos. O extravio de prontuários compromete não só a qualidade do atendimento atual, como também a segurança do paciente em relação ao uso de medicamentos e diagnósticos anteriores. “Isso pode acarretar falhas médicas graves e até inviabilizar processos administrativos futuros, como aposentadorias”, explicou Bruxellas.

As autoridades buscam, agora, formas de mitigar os danos e evitar que novos episódios semelhantes ocorram. A prioridade é garantir a continuidade do serviço público com transparência, segurança e responsabilidade.

Em nota a prefeitura de Campo Grande informou que acompanha com responsabilidade as ações referentes à continuidade de investigação relacionada ao armazenamento de prontuários físicos em unidade de Saúde Mental. “O Município permanece colaborando com os órgãos de controle e reitera seu compromisso com a legalidade, a transparência e a qualidade na prestação dos serviços”.

Por Inez Nazira

 

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