Com gastos de até R$ 140 mil mensais, comerciantes prevem cenário de insegurança nas compras e vendas
Com o início do debate acerca da regulamentação da reforma tributária, os trabalhadores das áreas de vendas e produção de bebidas alcoólicas estão se mostrando preocupados. O conflito gira em torno da estrutura do IS (Imposto Seletivo), que atua como uma sobretaxa instituída pela reforma tributária para incidir sobre produtos considerados prejudiciais tanto na saúde quanto ao meio ambiente.
Para os comerciantes, a aprovação do imposto seletivo pode apresentar desafios consideráveis, sendo uma das principais preocupações o efeito nas vendas e compras dos produtos. Miguel Barbosa Ferreira, que é dono do Bar Brasil há 21 anos, ressalta que, caso ocorra um aumento nos preços das bebidas alcoólicas, é provável que haja uma diminuição no fluxo de clientes do local.
“Essa aprovação não terá beneficio algum para os proprietários, pois se aumentar o preço a nível nacional, terei que aumentar aqui e com isso perderei a clientela”. Para enfrentar períodos de dificuldades financeiras, o dono do bar procura vender mais barato suas bebidas para manter os clientes, porém com isso o retorno financeiro é menor.
Com a incerteza em relação as vendas, comerciantes de pequeno e médio porte, que dependem de margens de lucro menores, podem enfrentar dificuldades para manter a competitividade. Miguel Barbosa atende em média 40 há 50 pessoas por dia, e explica que em tempos de crise a única manter o comércio aberto é insistir nas vendas e ter esperança em uma situação melhor para o futuro. “Atualmente eu estou trabalhando no vermelho pra manter o bar.”
O gerente da Divisão Conveniência, Flávio Henrique de Carvalho, explica que caso ocorra está aprovação que está sendo discutida no Senado a expectativa é de queda nas vendas e principalmente de fechamentos de estabelecimentos. “Se ocorrer essa reforma, muitos bares e conveniências serão fechadas. E tanto os donos quanto os gerentes terão que se adequar a essas novas regras”. Com gastos registrados em mais de R$ 100 mil por mês, Flávio Henrique explica que em finais de semanas com bastante público, chega a atender mais de 400 pessoas. “Com essa quantidade de clientes temos que ter um planejamento balanceado, principalmente quando chega no fim de ano, onde a demanda aumenta”.
Alisson Zana Félix é proprietário de uma mercearia localizado no Bairro Parati, e explica queque suas vendas já caíram cerca de 10% após o recente aumento de impostos sobre o cigarro e que os efeitos sobre as bebidas alcoólicas também diminuirão suas vendas. “Com o aumento no cigarro o pessoal já muda para outro estabelecimento. Se essa reforma for para frente, as vendas vão despencar ainda mais. Atualmente as despesas estão subindo e as vendas têm caído muito.”
Com uma média de gastos de cerca de R$ 10 mil por mês em bebidas, Alisson afirmou que os constantes aumentos de preços forçam os comerciantes a reduzir suas margens de lucro. “Diminuir a margem é a única estratégia que temos. Senão, como vamos vender”. O comerciante também mencionou o impacto geral do aumento de preços em outros produtos essenciais, como alimentos e energia, complicando ainda mais o planejamento financeiro. “Tudo tá subindo, desde verdura até o preço da energia. A gente tá empurrando com a barriga”.
Contra-ponto
O objetivo do imposto, que incidirá sobre produtos como cerveja, vinho e destilados, é aumentar a arrecadação do governo e promover uma distribuição mais equitativa da carga tributária. No entanto, suas implicações para os comerciantes e o mercado como um todo ainda precisam ser avaliadas.
Enquanto os fabricantes e importadores de bebidas destiladas solicitam a implementação de um imposto único, com uma alíquota igual para todas as categorias de bebida, as cervejarias argumentam a favor de um sistema progressivo, onde as bebidas com maior teor alcoólico suportam uma carga tributária maior.
Com a aprovação, a tributação progressiva poderá resultar em impostos mais altos sobre bebidas destiladas, como cachaça, vodca e uísque, enquanto as taxas sobre vinho e cerveja seriam reduzidas. Essa forma de tributação foi aprovada pela Câmara dos Deputados, que fez alterações no projeto original apresentado pelo governo. Agora, a regulamentação da reforma tributária será debatida no Senado.
Para o economista Eduardo Matos a medida do imposto seletivo poderá ter repercussões significativas tanto para a economia quanto para os consumidores. “Quanto mais essencial for o produto, menor será a influência que o aumento de preço terá sobre a sua demanda. Assim, setores que dependem de produtos não substituíveis podem enfrentar um impacto menor no faturamento, mesmo com a nova carga tributária”.
O economista ressalta que com uma mudança nos preços de produtos sob a reforma tributaria, haverá uma alteração no padrão de consumo dos clientes. “O hábito de lazer em consumir bebidas alcoólicas poderá ser substituído por outros hábitos. Sendo eles hábitos mais saudáveis, reduzindo o número de consumo de refrigerantes e bebidas com alto teor de açúcar e álcool.”
Sindicerv
Em entrevista exclusiva para o Jornal O Estado, o Presidente Executivo do Sindicerv (Sindicato Nacional da Indústria da Cerveja), Márcio Maciel afirma que toda e qualquer carga tributária afetará a situação da indústria como um todo. “Confiamos no trabalho do governo federal e sempre atuamos fornecendo estudos e estatísticas que embasam as decisões técnicas”.
Ainda sobre as demandas, Márcio Maciel afirma que os pleitos são: (i) tributação progressiva, de acordo com o teor alcoólico; (ii) aprimoramento do texto da Câmara em relação ao período de transição, para eliminar o risco de bitributação, especialmente entre 2027 e 2028; (iii) tratamento diferenciado aos pequenos produtores, independentemente da bebida produzida.
O Presidente Executivo explica que em relação ao imposto seletivo, há um entendimento sobre a necessidade de encaixar as bebidas nesta tributação, porém que isso não afete na carga tributária do produto. “Já pagamos a maior carga tributária da América Latina: 56% da cerveja são impostos. Somos conscientes de que as bebidas alcoólicas precisam estar no imposto seletivo, mas pleiteamos uma reforma que não implique aumento na carga tributária da cerveja, que traga as melhores práticas internacionais e que dê um tratamento diferenciado aos pequenos produtores, independentemente da bebida que produzam”.
Por João Buchara
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