O grupo de rap Brô MC’s está revolucionando a música sul-mato-grossense. Após suas apresentações nos Estados Unidos em setembro, a banda fez história ao ter sua música “JARAHA” incorporada à trilha sonora oficial do EA Sports FC 25, lançamento do álbum “Futuro Ancestral” com o DJ Alok e apresentações fora do Brasil. Formada em 2006, a banda faz história ao ser o primeiro grupo de rap indígena do país, com canções que narram o cotidiano e lutas das causas indígenas, que alcança sucesso internacional, e mostra que a arte pode ser manifestação política.
O grupo Brô MC’s é composto por quatro músicos da etnia Guarani Kaiowá: Bruno VN, CH, Kelvin Mbarete e Clemerson Batista. Originários das aldeias Jaguapiru e Bororó, localizadas em Dourados, eles utilizam a música, que emergiu nas periferias urbanas, como uma plataforma para compartilhar a riqueza e a resiliência de sua cultura. Através de suas letras, o quarteto expressa os desejos, medos e aspirações da juventude indígena em cada performance.
Futuro Ancestral
No dia 25 de setembro, O grupo Brô MC’s subiu ao palco do Grammy Museum, em Los Angeles, EUA, para uma apresentação que reuniu artistas, influenciadores e membros da Academia do Grammy, a prestigiada organização que premia as melhores produções musicais do mundo.
No aniversário de Brasília, o grupo marcou a estreia do programa “Futuro é Ancestral”, que une artistas de oito etnias indígenas e o renomado DJ Alok, parte do Instituto Alok, com a faixa “JAHARA”. O projeto busca valorizar a música ancestral e apoiar ações sociais e ambientais nas aldeias, reconhecendo o papel vital desses povos na preservação dos recursos naturais, resultando em um álbum de mesmo nome. A apresentação também contou com a participação de artistas como Mapu Huni Kuin, Rasu, e os grupos Yawanawa e Owerá, refletindo a rica diversidade cultural do evento.
Kelvin Baritê compartilhou para a reportagem a experiência do grupo durante sua recente viagem aos Estados Unidos, destacando que foi uma vivência incrível e única. Esta foi a segunda vez que a banda saiu do Brasil para se apresentar no exterior como MCs.
Embora não tenham realizado um show solo, a apresentação foi muito bem recebida, com o público vibrando e demonstrando apreciação pela performance. A experiência foi marcante, e a banda expressou grande satisfação com a recepção que recebeu.
“A recepção do público americano foi maravilhosa. O pessoal que estava lá realmente se conectou com a mensagem sobre a conscientização das mudanças climáticas. Eles aplaudiram bastante e demonstraram muito entusiasmo”, relatou Kelvin.
A apresentação conquistou o público ao mesclar ritmos eletrônicos, rap e trap, criando uma experiência musical única. O álbum, que celebra a cultura indígena com uma abordagem contemporânea, ressoou fortemente com a audiência, que vibrou com a fusão de estilos. A resposta positiva ao espetáculo deixou os artistas satisfeitos e motivados.
Durante o evento, a equipe também teve a chance de interagir com outros artistas. Embora as conversas tenham sido breves, a troca de ideias foi enriquecedora. Um destaque das interações foi a surpresa dos outros músicos ao saberem que o grupo é o primeiro do mundo a cantar rap em uma língua tradicional, uma conexão que se revelou muito significativa.
“Acredito que levar nossas músicas e realidades para um público global é fundamental. Isso ajuda a despertar o interesse de mais pessoas sobre a existência do povo Guarani-Caiowá de Mato Grosso do Sul, que muitas vezes é esquecido, já que a maioria das pessoas só conhece os indígenas da Amazônia”, relatou Bruno VN para o Jornal O Estado.
Processo Criativo
Bruno, compartilhou detalhes sobre o processo de criação da música “Jahara”. A colaboração com o DJ Alok aconteceu de forma espontânea. No dia da gravação, Alok perguntou se já tinham uma letra pronta, e Bruno explicou que o grupo prefere criar tudo na hora, fazendo as coisas acontecerem no momento. Com as bases e instrumentais prontos, a energia no estúdio fluiu naturalmente, resultando em uma produção repleta de brincadeiras e criatividade.
“A parceria com o Alok surgiu de forma bem natural. Nós escrevemos as letras e compomos tudo ali no estúdio, trabalhando junto com ele em tempo real. Como já temos a facilidade de escrever músicas, especialmente no estilo Guarani, o processo foi rápido e fluido. O próprio Alok já havia nos dito que queríamos participar do projeto “Futuro Ancestral”, e que não haveria um álbum dele sem a nossa contribuição”, explicou CH.
O grupo trouxe algumas ideias prontas, e a equipe trabalhou para construir o beat, especialmente na parte eletrônica. Elementos como “maracatu” e “taquara” foram integrados à sonoridade, que já faz parte da identidade do grupo.
“Esses elementos já fazem parte da nossa identidade. Sempre buscamos incluir referências indígenas nas nossas criações, tanto nas batidas quanto no processo de composição. Isso traz uma riqueza única, Sempre incorporamos referências indígenas tanto nas nossas músicas quanto no processo de criação. Essa conexão com nossas raízes é fundamental para o nosso trabalho”, argumentou Bruno.
Futuro e Retomada
O Brô’s MC está com uma agenda repleta de compromissos até o final do ano. Entre os principais eventos, a banda está organizando um show especial para comemorar seus 15 anos de carreira. Detalhes sobre a apresentação serão divulgados nas redes sociais do grupo assim que confirmado.
Além da celebração, os artistas também se preparam para lançar seu novo álbum, intitulado “Retomada”, ainda neste ano. Outra conquista importante para o grupo é a finalização do seu estúdio, um passo significativo para a produção de novas músicas.
Os Brô MC’s também continuam a desenvolver o projeto “Futuro Ancestral” e possuem diversos outros projetos em andamento. O grupo incentiva os fãs a acompanharem suas redes sociais, onde atualizações sobre shows e eventos serão frequentemente postadas.
“Temos uma parceria com o Instituto Alok, que está ajudando na produção do nosso álbum ‘Retomada’, que será lançado em breve. Estamos super felizes com essa colaboração, pois trabalhar com o DJ Alok e seu instituto tem sido uma experiência incrível”, afirmou Bruno.
Para o futuro, o grupo Brô MC’s planeja se aprofundar ainda mais em sua música e arte, com o objetivo de representar o Brasil e o mundo. Os integrantes expressam grande satisfação em levar sua língua e cultura por meio da música, promovendo o conhecimento e a apreciação do Guarani-Caiowá entre um público mais amplo.
“Saber que o povo indígena também pode alcançar esses espaços é inspirador. É um degrau que estamos subindo, e esperamos que outros grupos sigam em frente e conquistem ainda mais”, destacou CH.
ARTEvistas
As canções da banda abordam frequentemente a luta pela demarcação das terras indígenas, refletindo a realidade enfrentada pelas comunidades. Temas como alta densidade populacional, falta de representatividade, violência e até casos de suicídio são recorrentes em suas letras. Por meio da música, a banda não apenas expõe essas dificuldades, mas também celebra a rica cultura das etnias indígenas de Mato Grosso do Sul.
“Infelizmente, muitas lideranças Guarani-Caiowá são silenciadas na luta pelos seus direitos. Ao levar essas questões para o palco, através da nossa música, estamos mostrando ao mundo a realidade que vivemos. O público pode ver que não somos apenas uma parte da história indígena, mas que existem muitos povos no Brasil, cada um com suas lutas e necessidades”, detalhou Bruno.
Os integrantes esperam que, ao ouvir sua música, outras comunidades indígenas se sintam motivadas a se levantar e unir forças. Para eles, é essencial que todos os povos indígenas do Brasil lutem juntos pela defesa de seus direitos e pela demarcação de suas terras. A união, acreditam, é fundamental para que possam conquistar seus objetivos e fazer com que o mundo preste atenção às suas realidades socioambientais.
“Quando subimos ao palco, estamos representando todos os povos indígenas do Brasil. A mensagem que trazemos é sobre a verdade e a realidade que vivemos, dia após dia, convivendo com o medo de perder líderes e parentes. Em Dourados, nas aldeias Jaguapiru e Bororó, estamos no coração de uma luta intensa. Queremos que o público, indígena ou não, entenda a gravidade da situação e se levante em solidariedade. Vivemos em um mundo que precisa urgentemente de cura, e estamos aqui para alertar sobre isso”, detalhou Bruno.
Através de suas canções, a banda busca não apenas retratar sua realidade, mas também destacar a crise ambiental que afeta suas comunidades. Eles alertam que, sem a demarcação das terras originárias, o mundo não conseguirá suportar os impactos dessa negligência. O Pantanal, enfrenta incêndios devastadores, e o povo Guarani-Caiowá clama por ajuda, tornando essa mensagem urgente e necessária.
“As músicas que canto foram escritas há mais de quinze anos, mas ainda refletem a mesma situação que enfrentamos hoje. Não queremos que essa realidade continue invisível. É por isso que lutamos, para que todos compreendam a profundidade da nossa situação e para podermos, juntos, construir um futuro melhor”, finalizou Bruno.
Através de suas letras, que tratam de direitos, luta e resistência, O Brô MC’s busca conectar comunidades indígenas e não indígenas em uma causa comum, promovendo a conscientização e a solidariedade em torno de suas realidades.
Por Amanda Ferreira
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