Brô MC’s, músicos indígenas, vira tema de questão do Enem

Brô MC’s
Foto: Muriel Xavier/Divulgação

Músicos indígenas de Dourados usam o rap para retratar história dos povos originários e viram tema de questão da prova nacional

Direto das aldeias Jaguapirú e Bororó para demarcar o Enem (Exame Nacional do Ensino Médio) e, consequentemente, todo o Brasil. Composto por quatro integrantes, o Brô MC’s, grupo de rap indígena douradense, foi tema de uma das questões da prova do Enem, neste domingo (5). Os rappers sul-mato-grossenses foram destaque na questão 25 do caderno amarelo, que exigiu dos candidatos reflexões a respeito da cultura indígena, além de provocar o fomento ao estudo da poesia dos povos originários e incitar o pensamento a respeito de uma questão de justiça social recorrente a essas comunidades: a demarcação de terras. 

Brô MC’s

Foto: reprodução

Direto de Dourados, cidade a 229 km da Capital, o grupo composto por Bruno Veron, Clemerson Batista, Kelvin Peixoto e Charlie Peixoto, quatro indígenas guarani-kaiowá, juntos há mais de uma década, é o grupo indígena mais antigo do país. Conforme destaca o rapper Clemerson Batista, o fato de o grupo ser citado no Enem, demonstra um avanço para as pautas indígenas, além de inspirar muita emoção e surpresa nos integrantes. 

“A família Brô MC’s está super emocionada por saber que a história do nosso povo originário, nossa ancestralidade, está sendo estudada e reconhecida. Isso é muito lindo. Nós estamos surpresos também porque não esperávamos que o nosso grupo, nossa família, fosse citado em uma das provas do Enem e isso foi muito bacana. Os Brô MC’s vem lutando há anos para mostrar o nosso trabalho. Para propagar sobre a questão indígena para quem não integra a nossa comunidade, para quem não é indígena entender melhor o que são as nossas lutas, quem somos nós. Quem sabe assim, conseguir ver que estamos na luta pela sobrevivência também. A família Brô MC’s está feliz por isso, foi lindo!”, exclama Clemerson.

Ativismo e música

Desde 2009, o grupo desempenha o papel de expressar, por meio do rap, anseios, sonhos e os receios das comunidades indígenas. Promovendo a fusão do português e guarani, os rappers cantam sobre a questão da identidade indígena, os altos índices de suicídio nas aldeias e a luta pelas terras. Com a composição “Koangagua”, que significa “nos dias de hoje”, os meninos abordam sobre como é fazer rap na comunidade indígena: “minha fala é forte e está comigo / Falo a verdade, não quero ser que nem você / Canto vários temas e isso que venho mostrando / Voz indígena é a voz de agora”, diz a tradução da letra, cantada em guarani. A respeito de como o rap transformou a vida dos integrantes, Kelvin discorre sobre como a música é um meio de amplificar a voz da comunidade por meio do Brô MC’s. 

“Acho que o rap nos transformou em uma espécie de porta-voz dos nossos irmãos e dos nossos parentes, que são oprimidos todos os dias e quase em qualquer lugar. Tanto da nossa comunidade indígena, a Jaguapirú e Bororó, mas, em especial, aos indígenas guarani-kaiowá, que estão nas retomadas. Então, levamos o apelo, a dor deles por meio da nossa música, que é o rap. Transformamos os sentimentos deles, que é o medo da opressão, a pressão psicológica, e transformamos essas informações em música, em poesia. É por meio do rap que vamos demarcando os espaços, para falarmos dessas questões que são muito importantes. Resumindo, é de cima do palco, que nós damos uma flechada de reflexão na mente das pessoas que não conhecem sobre as questões indígenas. O rap é nosso escudo de proteção. Se a galera ataca os indígenas, nós nos protegemos, respondendo com a música”, enfatiza Kelvin.

De MS para o Brasil 

Desde então, os quatro integrantes, que se consideram irmãos, caminham juntos, unidos pelo rap e em prol da cultura, língua e realidade indígena. Em parceria há mais de uma década, a combinação de música e ativismo rendeu aos meninos apresentações em diferentes partes do país, como São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais e Brasília. O Brô MC’s, além de ser o primeiro grupo de rap indígena do Brasil, também foi o primeiro grupo de rap indígena a tocar no Rock in Rio, em 2022, momento em que dividiram o palco com o rapper Xamã. Segundo CH (Charlie Peixoto), abraçar suas raízes e denunciar as questões sociais que afetam as comunidades indígenas seguirá sendo o maior projeto do grupo. 

“O rap traz muito para o lado social e é muito importante que a nossa voz possa ecoar, principalmente na educação, porque tudo começa na escola. Principalmente, acredito eu, que a maioria não conhece a verdadeira história dos povos guarani-kaiowá. Então, um dos nossos projetos é continuar levando essa história, essa voz indígena para as pessoas que não conhecem. Mas estamos com vários projetos que vamos apresentar ao decorrer do próximo ano, inclusive um documentário”, disse CH. 

Por meio de seu trabalho musical, os Brô MC’s promovem a valorização das línguas indígenas e a preservação de tradições ancestrais. Aos interessados em conhecer mais sobre o trabalho do grupo, o canal Guateka do YouTube, criado para divulgar a cultura indígena, exibe o clipe de “Koangagua”, música citada na matéria.

Por – Ana Cavalcante

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