O DIA É DAS MULHERES, MAS O PAPO É COM OS HOMENS
Todo homem é machista? Vamos com calma, mas afirmo que responderei à pergunta, no fim do texto. Caso não concorde, está tudo bem, mas lhe convido à reflexão. Em uma sociedade a qual suas estruturas são construídas para que os homens dominem os espaços públicos e as mulheres se limitem aos espaços privados, nós, homens, crescemos, “sem perceber” ou fingimos não perceber, que possuímos muitos privilégios. É tão “natural” que parecem ser relações imutáveis. Vimos nossas bisavós, avós, mães e irmãs executando, como obrigação, o trabalho doméstico e familiar.
Qualquer questionamento a tal situação é tido como desnecessário. Claro, o questionamento coloca em risco nossas zonas de conforto. Vou exemplificar com uma história familiar. Fernanda, minha irmã, em um almoço de fim de semana, chegou na mesa em que estava meu pai, meu cunhado e eu e disse: “o papo está bom? Vocês conversam enquanto a mãe, a Maria e eu trabalhamos para servi-los. Vamos ajudar? A obrigação não é só das mulheres”. Sim, ela jogou na cara o nosso privilégio de ser homem. Talvez você ache o exemplo besta, mas não é.
A dupla jornada de trabalho das mulheres se dá, exatamente, por situações como a exposta: enquanto nós, homens, desfrutamos de um tempo para conversar, estudar ou simplesmente ficar no sofá, elas, avós, mães, irmãs, esposas e empregadas domésticas estão lavando a roupa, cuidando dos filhos, fazendo o jantar, muitas depois de suas jornadas de trabalho fora de casa. O machismo é a soma de ações que garantem privilégios para nós, homens, ao custo de uma sociedade violenta às mulheres. Aqui, destaco que não se trata da sua ou da minha opinião, mas de dados objetivos incontestáveis que comprovam que, em função do machismo, o Brasil é o 5º país com mortes violentas contra mulheres, o 7º em assassinato de mulheres no mundo, que registrou em 2021 diferença salarial de 22% entre mulheres e homens que exercem a mesma função e que, entre 192 países, ocupa o 142º lugar no ranking de baixa participação das mulheres na política. Então, se existe machismo, pois os dados são incontrastáveis, quem são os machistas? Infelizmente, nós, homens, estamos machistas.
Precisamos assumir que o machismo não é uma condição imutável e, portanto, devemos deixar de estar machistas. Por mais desconstruído que tente ser, em especial por ser filho da Erondina, professora que nunca aceitou o machismo como condição inalterável, isso não quer dizer que não esteja machista, pois a sociedade se estrutura a partir do machismo e queira ou não queira nós, homens, desfrutamos desses privilégios, pelo simples fato de existir. Por exemplo, a chance de vencer uma eleição, ter um posto de trabalho mais bem remunerado, não sofrer violência doméstica e familiar ou não ser estuprado na rua, segundo os dados, é infinitamente maior pelo simples fato de ser homem.
O primeiro passo para mudança é que entendamos esse lugar de estar machista e o quanto ele é perverso com as mães, irmãs, esposas, filhas, sobrinhas e amigas, pois, assim, a partir do incomodo que é notar que todos nós estamos machistas, que podemos mudar nossas práticas. Termino o artigo pedindo desculpas à minha irmã Fernanda que, como mulher e médica, vive o machismo diariamente, dentro e fora de casa. O dia é das mulheres, mas a reflexão, para dar um fim no machismo, precisa ser feita por nós, homens. Todo homem é machista? Não, mas todo homem está machista, e necessita deixar de estar.
Para isso, precisamos mudar nossos comportamentos diários. Manoel de Barros sustenta que “desafazer o normal há de ser uma norma”. Sim, desfazer a normalidade do machismo que permeia todas as relações sociais deve ser, para nós, homens, uma norma diária.
Por Tiago Botelho.
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