Quem conheceu o Papa João Paulo II de perto revive as emoções da visita realizada há 30 anos

Papa
Nilson Figueiredo

Há 30 anos o Papa João Paulo II desembarcou em Campo Grande encantando os campo-grandenses. A visita marcou a vida de milhares de pessoas que puderam ver mais de perto o Santo Padre da igreja Católica. O Papa que ganhou uma praça em sua homenagem tinha muitas características, dentre elas a personalidade simples e afetuosa. “O papa era um santo que primou por gestos humanos”, resumiu Dom Vitório Pavanello, Arcebispo na época em que João Paulo II visitou a cidade Morena, sendo então braço direito do Papa.

O Papa foi recebido na Base Aérea de Campo Grande e cumpriu uma longa agenda durante as quase 24 horas de visita. Entre o ponto de desembarque e a Casa da Missão Salesiana, onde o Papa descansaria, se tornou uma carreata, com a recepção dos fiéis. A agenda começou a ser cumprida então no dia seguinte, e o primeiro lugar visitado pela Santidade foi o Hospital São Julião. “O Papa se encantou com o ambiente. Ele ficou muito impressionado e disse ‘parece que aqui não se sente a dor’. Ele deixou um valor significativo em dinheiro para a instituição que desempenha um papel muito importante na Capital”, relembra o emérito Dom Vitório.

Em seguida, o Papa se encontrou com a multidão que o aguardava na Praça do Papa. A Santa Missa celebrada por ele reuniu mais de duzentas mil pessoas, de acordo com Dom Vitório, e para os fiéis o Papa proferiu palavras sobre a família.

“Eu não via a animação do povo antes, mas quando o Papa chegou tudo mudou, até o clima da cidade pareceu ficar mais ameno. Cerca de 250 mil pessoas assistiram à missa celebrada pelo Santo Papa no local onde hoje é a praça que homenageia sua visita, foi tudo perfeito”, conta Dom Vitório.

Proximidade

O Santo Padre foi recebido pelo então Arcebispo Dom Vitório, que passou a ser o ‘braço direito’ do Papa João Paulo II durante sua visita. Com alegria e entusiasmo, Dom Vitório lembra de um dos momentos mais importantes para a Igreja em Campo Grande, enfatizando sempre uma personalidade amável e carinhosa do Papa que conquistou milhões de pessoas com suas características.

“O papa João Paulo II era humano, gente como a gente. Ele era tão humano que eu o sentia quase como um compadre. Gente como a gente. Quando fui à Roma visitá-lo depois de sua vinda, foi da mesma forma, sem cerimônias. Ainda aqui em Campo Grande, depois do jantar, ele fez questão de, antes de se deitar, ir à cozinha, cumprimentar as cozinheiras, e as presenteou de forma afetuosa. Quando ele foi embora, se despediu pessoalmente de cada uma das pessoas e as abençoou, de forma muito gentil”, recorda.

A visita do Papa gerou reflexos importantes em Campo Grande que vão além dos estruturais. “A visita do Papa encantou muitas pessoas e provocou reflexos que podem ser sentidos até hoje, dentro das igrejas”, completa Dom Vitório.

O Papa visitou também o Museu das Culturas Dom Bosco, que segundo Dom Vitório, ficou encantado com a história que guarda o espaço. E então, o Papa se despediu de Campo Grande, embarcando para Florianópolis, seguindo seu curso, mas provocando transformações importantes naqueles que ouviram suas palavras.

“Essa visita foi um momento extraordinário, tanto para a igreja quanto para Campo Grande. O apoio do governo do estado e da prefeitura foi muito importante na época. Os gestores favoreceram e reestruturaram a cidade para a visita que recebeu elogios da Santidade”, afirma Dom Vitório.

Abençoados

O casal Edil Núncio de Avila e sua esposa Maria da Luz Pires de Avila vivenciaram uma experiência que poucas pessoas tiveram nessa vida. O senhor Edil, que faleceu em 2009, além de apertar a mão do Papa, recebeu um terço das mãos dele. Maria da Luz relata como foi esse acontecimento. “Foi uma benção muito grande para todos nós de Campo Grande, para minha família e para a cidade toda. Foi também um crescimento muito forte na fé. Quando terminou a palestra do PAapa, ele desceu a escadinha direto do altar da Igreja Santo Antônio, Nossa Senhora da Abadia, e foi direto ao meu marido e lhe deu a mão e lhe entregou um terço”.

A família Avila ofereceu pousada para duas freiras que vieram de Araçatuba e lembra do espírito de amor e de partilha que o Papa João Paulo II trouxe com sua vinda. “A gente se sente abençoada, porque o Papa escolheu justo Campo Grande para vir, a duas quadras da minha casa, e ainda nós tivemos o privilégio de receber duas religiosas, freiras, que vieram de Araçatuba e não tinham onde posar. Elas vieram me procurar e eu dei abrigo para elas, que dormiram aqui também, tudo isso é uma partilha muito grande, a gente se sentiu privilegiado, um privilégio muito grande”.

“Todos os fatos foram marcantes, mas a passagem do Papa, quando ele desembarcou no aeroporto, desceu pela Duque de Caxias, no papamóvel, foi uma emoção muito grande, a gente poder ver ali de pertinho, outro fato foi a gente também termos sido escolhidos para estar lá na igreja do Santo Antônio.”, diz Maria da Luz. “Me lembro que cada um tinha um lugar marcado, para sentar na igreja. A segurança dava um crachá com o lugar onde cada um ficaria. Na igreja ele exalou um perfume, um perfume, não dá pra descrever, um perfume especial, um perfume divino. Quando o papa chegou a primeira coisa ele foi ajoelhar no pé do Santíssimo. A gente se sente privilegiado por poder participar desse momento, a primeira e única vez que o Papa veio para Campo Grande”, relembra Maria da Luz.

Conheci um Santo

O músico Luis Henrique Avila se recorda dos preparativos para a realização da missa e relata como esse acontecimento mexeu com todo o bairro Santo Amaro. “Como nós moramos praticamente ao lado da praça, estamos a 200m da praça, nós vimos tudo acontecer, o antes, o durante e o depois. Vimos esse terreno que era puro mato, ser limpo, preparado, eu lembro que eles fizeram um altar, um morrão, eu lembro que a gente ia lá, foram meses que a estrutura estava sendo preparada, e tirava foto, a missa em si, e era tudo aqui do lado de casa, e toda aquela movimentação de comércio e foi tudo aqui ao lado de casa”.

“Depois que acabou virando uma praça, que hoje toda a comunidade ao redor se beneficia dela, acontecem eventos, a festa junina da cidade acontece aqui ao lado de casa, é uma praça onde as pessoas praticam esportes, tem o memorial com a foto do Papa e de todos os outros Papas da história então ficou um marco histórico de um acontecimento que marcou a história da cidade. E nada ficou como era antes depois que ele passou por aqui”, aponta o músico.

Luis que já havia sido coroinha na igreja Nossa Senhora Auxiliadora, tinha muitos amigos entre os meninos que participaram da missa do Papa, e compartilhou com os garotos, sua experiência como coroinha. “No dia da missa estava muito calor, e era um mar de gente, impossível para uma pessoa que nem eu contar, era para eu ter sido coroinha, eu fazia parte daquele grupo da paróquia daqui do Nossa Senhora Auxiliadora, mas eu já tinha estourado a minha idade, eu já não estava mais servindo o altar, eu estava muito grande, eu estava como auxiliar do Luilton, eu estava transmitindo a minha experiência para os mais jovens, talvez se eu fosse um ano ou dois mais novo, es estaria ali servindo essa missa, mas eu fiquei muito feliz porque todos os meus amigos passaram por isso e eu compartilhei dessa mesma alegria que eles compartilharam”.

Na memória de Luis Henrique prevalece o sentimento da graça por ter visto de perto o homem que se tornou santo.“Eu gostaria de ressaltar, é que anos depois, a gente sente a presença, a energia que ele irradiava, tanto que hoje ele é considerado Santo, ao saber da notícia de que o Papa João Paulo II havia morrido, a primeira coisa, que eu ouvi foi uma voz dentro de mim falando ‘Eu conheci um Santo’”.

Mais perto de Deus

O empresário e jogador de basquete Vinícius Baccin tinha apenas 11 anos quando foi coroinha na missa celebrada por João Paulo II na praça do Papa, ele revelou como foram esses momentos especiais, onde houve até uma interação espontânea do sumo sacerdote com o grupo de coroinhas. “Existia uma expectativa muito grande em torno de tudo, tanto de segurança, como seria estar próximo de uma das pessoas mais conhecidas e importantes do mundo. Em Campo Grande foi a única cidade que tinha coroinhas. Como fazíamos parte da mesma comunidade a gente virou tipo celebridade no bairro e foi tudo muito legal e marcante”.

Vinícius foi agraciado com uma demonstração de carinho do Santo Padre, através de uma quebra de protocolo, que já era uma marca do Papa polonês. “Era tudo muito rígido quanto à segurança do Papa, muitos seguranças e protocolos, mas o Papa João Paulo II sempre era lembrado por quebrar esses protocolos, ai ficamos na expectativa que ele quebrasse algum conosco, e foi exatamente o que aconteceu”.

“Tem uma foto após a missa, onde ele veio até nós e em bom português pediu para tirar uma foto com todos que tinham o auxiliado na missa, foi nessa hora ele veio em minha direção se postou ao meu lado e descansou a mão no meu ombro. Eu estava tão anestesiado que só fui entender a grandiosidade disso dias depois quando vi a foto. Teve uma interação que haviam dito que seria uma benção inicial antes da missa onde ele entregaria um terço, que era algo programado, mas essa foto com todos foi fora do que estava estabelecido e foi muito o estilo dele”, relembra o empresário.

“Eu tinha completado 11 anos há poucos dias, a comunidade do Paulo VI sempre foi muito atuante na celebração das missas e festividades católicas, e o grupo de coroinhas é bem antigo, Luilton Pouso que estava a frente desse grupo da época, e o convite para o grupo de coroinhas foi conseguido por ele se não me falha a memória, então ele merece muito crédito por isso. Foi a primeira vez que senti uma energia diferente de uma pessoa de carne e osso. Isso eu não me esqueço nunca. Com 11 anos eu me senti mais perto de Deus”, conclui Vinícius Baccin. (Texto: Beatriz Magalhães com Marcelo Rezende)

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