Água potável e rede de esgoto vão chegar a todas escolas urbanas e rurais

O movimento para encher garrafinhas e canecas aumentou depois que os alunos souberam que a água era “outra” / foto: Marcos Maluf
O movimento para encher garrafinhas e canecas aumentou depois que os alunos souberam que a água era “outra” / foto: Marcos Maluf

[Texto: Bruno Arce e Eliane Ferreira, Jornal O Estado de Mato Grosso do Sul]

criança se refrescando na torneira da escola Orlandina Oliveira/ Foto: Marcos Maluf

Quase 35 milhões de brasileiros não têm acesso ao serviço de abastecimento de água tratada, conforme o Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento, de 2021. Além disso, quase 100 milhões não têm acesso à coleta de esgoto, o que representa 44,2% da população nacional. Para aumentar o percentual de acesso, o Novo Marco Legal do Saneamento, de julho de 2020, estipulou metas para que 99% da população brasileira tenha serviço de água potável e, pelo menos, 90% possam ter à sua disposição coleta e tratamento de esgoto, até 2033.

Campo Grande-MS já cumpre a meta do Novo Marco Legal com uma década de antecipação, quando o assunto é água tratada. Conforme a concessionária responsável pelo serviço urbano de água e esgoto, Águas Guariroba, a água tratada chega a 99,8% da população. Quanto ao esgoto, o atendimento é para 82%. Agora, por iniciativa e investimentos bancados pela empresa, a capital sul-mato-grossense escreve um capítulo que deverá ser exemplo nacional, com a implantação do projeto Escolas Saneadas.

Em 2022, a concessionária implantou o Escolas Saneadas, para levar água tratada e rede de esgoto para todas as escolas públicas, tanto municipais quanto estaduais, localizadas nas áreas urbanas.

 

Isadora Andrade, coordenadora de operações da Águas /Assessoria

“Ver os depoimentos da frequência dos alunos e dos benefícios para a comunidade é o que dá mais ânimo”

O presidente do Instituto Aegea, Édison Carlos, esteve em Campo Grande e visitou uma unidade educacional atendida dentro do projeto Escolas Saneadas. Édison destacou que a iniciativa antecipa em 10 anos a meta do Marco Legal do Saneamento e que a Capital é pioneira no país, inclusive dentro da área de atuação do Grupo Aegea. “Nos parece muito mais correto antecipar nas escolas a chegada destes serviços porque nossos filhos, nosso futuro, estão ali. As crianças e os jovens são os mais atingidos por doenças de transmissão hídrica, que vêm de água poluída e esgoto. É um programa que queremos estender para toda a Aegea”, destaca Édison.

Michelly Bispo, Aluna da E.M. Orlandina Oliveira, na Colônia de Águão / foto: Marcos Maluf

“Agora a gente bebe água boa para a saúde. Não temos mais medo da dor de barriga.”

Resultado na comunidade

“Diminuiu a evasão escolar e aumentou a participação familiar. Além disso, a qualidade de vida melhorou muito para as crianças”. O relato é de Cleidevânia Chagas, diretora da Emei (Escola Municipal de Educação Infantil) Tia Eva, que fica dentro da Comunidade Quilombola Tia Eva, zona urbana de Campo Grande. A comemoração da diretora é porque no fim de 2022 foi implantado esgotamento sanitário, o que colocou fim a cinco fossas sépticas que estavam dentro do pátio e impossibilitava a plena circulação das crianças.

Cleidevânia Chagas recorda que, antes do serviço de esgotamento sanitário chegar à Emei, o mau cheiro exalado das fossas tirava a concentração das crianças e o esgoto transbordava e escorria para o terreno vizinho. “Era muito comum casos de diarreia e dores estomacais nas crianças.

“Agora, acabou e isto, para mim, é qualidade de vida e meio ambiente. Agora, a gente tem até lista de espera de estudantes que não são da comunidade e que os pais querem matricular aqui”, diz.

A mudança na unidade educacional é aprovada por pais de alunos. Cristian Grando tem um filho, de 5 anos, na Emei Tia Eva. “Este serviço que a Águas Guariroba trouxe para a escola, de 100% de água tratada e esgoto coletado e tratado, nos deixa mais tranquilos, enquanto pais, na certeza de que as crianças estão com a estrutura de saúde adequada para crescerem com segurança e aprendizado. Como eles passam boa parte do dia na escola, é como se fosse uma reforma e uma melhoria na casa em que mora”, valoriza.

O trabalho de implantação de água tratada e depois da rede de esgoto dentro da Emei Tia Eva, que totalizou aproximadamente 60 metros de rede, faz parte do projeto Escolas Saneadas e tem como objetivo universalizar o acesso ao serviço de esgotamento sanitário nas escolas públicas de Campo Grande, inclusive as estaduais. A iniciativa deve beneficiar 50 mil alunos em 116 escolas, sendo que destas 15 já foram contempladas e outras 19 devem receber o projeto este ano. A ação tem como meta executar 27 mil metros de rede de esgoto.

A engenheira química e coordenadora de operações da Águas Guariroba, Isadora Andrade, reforça que a meta é visitar todas as escolas, fazer o levantamento de quantas fossas tem cada uma delas e quantas vai precisar tamponar.

Na comunidade Tia Eva, por exemplo, foram identificadas cinco fossas e elas ficavam na área de circulação de crianças. “Eu sempre falo que trabalhamos com propósito. Ver o depoimento da diretora da frequência dos alunos e todos os benefícios para a comunidade é o que dá mais ânimo para continuar o projeto”, afirma a engenheira.

Iniciativa ganhou reforço em 2023, com o projeto Escolas Saneadas

Água se tornou motivo de encantamento em escola rural/ Foto: Marcos Maluf

O Escolas Saneadas deu mais um passo importante para o meio ambiente, saúde e responsabilidade social, em 2023. Trata-se do desafio de atender mais escolas dentro do município de Campo Grande que não tem água tratada ou saneamento ou não têm nenhum deles. Entre as unidades educacionais, estão escolas da zona rural do município, inclusive bem afastadas dos próprios núcleos habitacionais.

A primeira escola rural que foi beneficiada fica dentro da Comunidade Colônia do Aguão, que tem aproximadamente 500 moradores. O núcleo habitacional tem um poço que também fornece água para a unidade educacional, com 152 alunos, e para a única unidade de saúde. Este projeto piloto de escola saneada na área rural já está em funcionamento desde o mês de julho de 2023. Lá, foi realizado teste laboratorial que constatou que a água não era potabilizada, ou seja, fora dos padrões para consumo humano.

A merendeira Petrúcia Juventino Ribeiro trabalha há 33 anos na escola municipal Orlandina Oliveira Lima, que fica na Colônia do Aguão. Ali, viu filhos estudarem e agora acompanha uma neta, na mesma comunidade. Ela é responsável pela merenda do período matutino que, na maioria das vezes, é bem reforçada e com cara de almoço mesmo. Quando soube do projeto Escolas Saneadas Rurais na comunidade e que, por tabela, a escola também receberia da mesma água com tratamento, diz que a felicidade tomou conta.

“Agora é água de qualidade! A gente ficou muito feliz e a criançada também. Eu percebi que agora eles vêm mais vezes encher a garrafinha no bebedouro. É outra realidade que estão vivendo, bem diferente Saneadasdo que quando entrei aqui”, sorri.

Garrafa cheia de água

A merendeira Petrúcia tem mesmo razão quanto ao aumento da presença dos alunos no bebedouro depois que a água da escola passou a ser clorada e monitorada para manter o padrão de qualidade. A aluna do 4º ano da escola Orlandina, Michelly Lesmo Bispo, 10 anos, mora no Assentamento Conquista. Todos os dias enche a garrafinha mais de uma vez para matar a sede. “Agora a gente bebe água boa para a saúde, sem germes. Não temos mais medo de dor de barriga”, diz.

Com água tratada, Petrúcia prepara a merenda para mais de 150 alunos da escola rural da Colônia Aguão/ Foto: Marcos Maluf

No 5º ano da mesma escola estuda Kattleya Nóbrega Gargan, de 10 anos, que mora no Assentamento Minas de Prata. A pequena diz que os pais também comemoraram quando o projeto chegou à escola, por meio do poço da comunidade. “Eles disseram que isto era muito bom. A saúde tem que estar em primeiro lugar. Eu gostei bastante de tomar desta nova água”, diz.

Sem garrafinha, mas com copinho que o acompanha nas aulas do 4º ano, Arthur Felipe Cavalcante, 9 anos, vem do Assentamento Conquista todos os dias estudar na escola Orlandina. “Eu aprendi que água tratada evita doenças e agora a gente tem isso aqui, igual tem o pessoal, lá na cidade”, vibra.

O diretor da unidade educacional, Antônio Donizete de Souza, explica que a água atende todos os serviços e necessidades na escola, inclusive para irrigar uma horta agroecológica, que é utilizada como atividade pedagógica. “Quando a gente soube do projeto da água tratada, ficamos muito satisfeitos. Soubemos do projeto de tratamento de esgoto. Vai ser um sonho realizado quando chegar”, conta.

O entendimento sobre a importância da água tratada é o mesmo reflexo sentido na UBSF Aguão, que é gerenciada pela Neide Pinheiro de Lima Severo.

“Diminuiu muito os casos de diarreia na comunidade depois da cloração no poço, que também atende nossa unidade, nossos colaboradores e os pacientes. Aqui, na região, a água tem muito calcário e toda vez que limpava a caixa d’água saía uma crosta. Agora não tem mais isso”, comemora.

Sistemas individualizados para atender as escolas do campo

O Escolas Saneadas deve ser concluído até o fim do próximo ano, nas unidades educacionais públicas urbanas de Campo Grande. Paralelamente, está em andamento o projeto para atender as rurais, estas que não estão dentro do contrato de concessão com a prefeitura da Capital, mas que há garantia pessoal do geólogo e diretor-presidente da Águas Guariroba, Themis de Oliveira, de que vão ser atendidas com recursos 100% bancados pela concessionária e sem cobrança posterior da comunidade.

Água potável é garantia de saúde (Foto: Marcos Maluf)

Está em andamento o processo de levantamento, análise e necessidade específica de cada unidade escolar pública rural, inclusive nos distritos de Anhanduí e Rochedinho. Caso a escola tenha poço, a água será tratada e, se for abastecida por poço de terceiro, também vai ter o mesmo serviço, só que com maior alcance de beneficiários, como no caso da Colônia do Aguão.

A análise tem como objetivo trazer segurança quanto a qualidade da água nas unidades educacionais/ Foto: Marcos Maluf

Outro desafio que, aparentemente, é maior diz respeito ao serviço de coleta e tratamento de esgoto na área rural, por não ter rede. Para isto, está sendo desenvolvida uma tecnologia com a empresa Tigre Tubos e Conexões. “Eles têm um sistema pequeno de biodigestor. Com a parceria, vão nos fornecer a tecnologia, que iremos utilizar nestas escolas rurais. A água vai sair com uma qualidade tão grande que as escolas irão irrigar hortas, por exemplo”, revela Themis de Oliveira.

O diretor-presidente da Águas destaca ainda que não vai ser preciso um corpo hídrico para jogar o resíduo do tratamento de esgoto e que cada escola rural vai ter um sistema de tratamento pensado exclusivamente para atender a demanda de cada unidade educacional.

“O sistema tem um nível de tratamento tão eficiente que a água do esgoto vai ser usada para irrigar. Sai zero de contaminação, zero de patógenos, zero de conteúdo em suspensão e pode ser usada em hortas, pomares. Pode infiltrar no solo sem nenhum problema”, diz Themis de Oliveira.

Sobre o projeto ser pioneiro no país, Themis de Oliveira destaca que a decisão é porque no ambiente escolar, além de chegar até as crianças e melhorar a qualidade de ensino dentro das escolas, também repercute nas famílias. “Isto vai além do saneamento, mas do resgate da cidadania. Sou um apaixonado pelo saneamento e acho que entregar isso para as crianças é cuidar do futuro”, conclui.

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