Ao longo dos últimos dias, a Justiça Federal de São Paulo e o Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF-3) garantiram ao Estadão o direito de ter acesso aos papéis por causa do interesse público em torno da saúde do presidente da República. A decisão de Noronha, no entanto, derrubou o entendimento da primeira e da segunda instâncias.
“Agente público ou não, a todo e qualquer indivíduo garante-se a proteção a sua intimidade e privacidade, direitos civis sem os quais não haveria estrutura mínima sobre a qual se fundar o Estado Democrático de Direito”, escreveu Noronha em sua decisão.
“Relativizar tais direitos titularizados por detentores de cargos públicos no comando da administração pública em nome de suposta tranquilidade da população é presumir que as funções de administração são exercidas por figuras outras que não sujeitos de direitos igualmente inseridos no conceito de população a que se alude, fragilizando severamente o interesse público primário que se busca alcançar por meio do exercício das funções de Estado, a despeito do grau hierárquico das atividades desempenhadas pelo agente público”, concluiu o presidente do STJ.
Para o advogado do Estadão Afranio Affonso Ferreira Neto, a decisão de Noronha “afronta o devido processo legal, a lei orgânica da magistratura e a Carta Magna”. “Vamos recorrer ao próprio STJ e ao STF, já”, disse Ferreira Neto.
O Estadão pediu que Noronha se considerasse “impedido” de analisar o recurso da AGU por ter antecipado em entrevista ao site jurídico JOTA a sua posição sobre o tema. Na última quinta-feira, o ministro afirmou que “não é republicano” exigir que os documentos de Bolsonaro sejam tornados públicos.
“Essa decisão poderá chegar a mim com um pedido de suspensão de segurança, então eu vou permitir para não responder. Mas é o seguinte, eu não acho que eu, João Otávio, tenho que mostrar meu exame para todo mundo, eu até fiz, deu negativo. Mas vem cá, o presidente tem que dizer o que ele alimenta, se é (sangue) A+, B+, O-?”, disse Noronha na ocasião.
“Não é porque o cidadão se elege presidente ou e ministro que não tem direito a um mínimo de privacidade. A gente não perde a qualidade de ser humano por exercer um cargo de relevância na República. Outra coisa, já perdeu até a atualidade, se olhar, não sei como está lá, o que adianta saber se o presidente teve ou não coronavírus se foi lá atrás os exames?”, afirmou o presidente do STJ.
Depois de questionar sucessivas vezes o Palácio do Planalto e o próprio presidente sobre a divulgação do resultado do exame, o Estadão entrou com ação na Justiça na qual aponta “cerceamento à população do acesso à informação de interesse público”, que culmina na “censura à plena liberdade de informação jornalística”. A Presidência da República se recusou a fornecer os dados via Lei de Acesso à Informação, argumentando que elas “dizem respeito à intimidade, vida privada, honra e imagem das pessoas, protegidas com restrição de acesso”.
(Texto: Terra)