Confusão continua e sempre há um parlamentar apresentando projeto ou propondo discutir o assunto
A simples menção ao nome “Mato Grosso” costuma gerar dúvida e hesitação: “Você quis dizer Mato Grosso do Sul?”. Essa correção recorrente revela uma confusão que persiste há décadas. Neste 11 de outubro, Mato Grosso do Sul comemora 48 anos de sua criação, oficializada pela Lei Complementar nº 31, de 1977. Ainda assim, quase meio século depois, a semelhança com o nome do estado vizinho continua causando confusão, inclusive entre pessoas de outros estados, das quais ainda confundem os dois ou sequer sabem que houve uma divisão. O resultado são imprecisões em mapas, roteiros turísticos e até em produções de televisão.
Diante disso, parlamentares sul-mato-grossenses têm apresentado propostas ao longo dos anos para reforçar a identidade do Estado, muitas delas tendo o ‘Pantanal’ como elemento principal.
A mais recente ocorreu em 2024. O Projeto de Lei 160/2023, de autoria do deputado Junior Mochi (MDB), foi sancionado e passou a inserir formalmente o “apelido”, “O Estado do Pantanal,” abaixo do logotipo oficial do governo estadual. A mudança visual, embora não altere o nome constitucional de “Mato Grosso do Sul”, procura fixar a imagem do bioma mais emblemático do Estado como identidade pública. O PL acrescenta o inciso III ao artigo 2° da Lei 4.702/2015, que dispôs sobre a identidade visual do governo estadual.
A estratégia de Mochi, de usar um codinome sem alterar o nome constitucional, foi pensada como um meio-termo. Ele sabe que a mudança direta enfrentaria resistência política, custos burocráticos e debates legais. “Não estamos apagando Mato Grosso do Sul, apenas agregando algo que nos representa fortemente, como o Pantanal”, afirmou.
Mochi destacou também a incoerência na Constituição Federal de 1988, que menciona o “Pantanal Mato-Grossense”, ignorando a maior parte do bioma que pertence ao MS. “Precisamos corrigir até mesmo esse tipo de equívoco. Nossa flora, fauna e símbolos como o tuiuiú fazem parte da identidade sul-mato-grossense. São riquezas que nos pertencem”.
O parlamentar reforça que a medida pode ter grande impacto no turismo, já que o Pantanal é considerado a maior planície alagada do planeta e atrai o olhar de visitantes do mundo inteiro. “Temos uma riqueza natural que precisa ser associada diretamente ao nosso estado. Dois terços do Pantanal estão aqui, mas ainda perdemos turistas para o Mato Grosso por conta da falta de clareza”.
“Criação” em vez de “Divisão”
Em 2019, o deputado estadual João Henrique Catan (PL) apresentou um projeto que trouxe uma importante correção histórica para Mato Grosso do Sul. A Lei Estadual nº 5.412/2019 alterou o nome oficial do feriado estadual comemorado em 11 de outubro, que antes era conhecido como o “Dia da Divisão do Estado de Mato Grosso”, para o “Dia da Criação de Mato Grosso do Sul”.
Essa alteração visa mudar a narrativa sobre a origem do Estado. Segundo o parlamentar, a mudança corrige uma leitura histórica equivocada. “Passamos todos esses anos comemorando a divisão de um estado que não nos pertence, quando, na verdade, deveríamos celebrar a criação do nosso estado. Isso é um resgate da nossa identidade”, afirmou.
Para Catan, o nome atual pode até causar confusão, mas não representa um prejuízo direto ao estado, desde que haja um esforço contínuo de valorização da história e da cultura local. “É uma questão de ensinar, divulgar, explicar. Assim como existem o Rio Grande do Sul e o Rio Grande do Norte, também pode haver Mato Grosso e Mato Grosso do Sul”, argumenta.
O deputado ainda defende que essa mudança não só ressignifica o feriado, mas também ajuda a educar a população sobre a verdadeira história da criação de MS, diminuindo a confusão que ainda existe entre os estados vizinhos.
Mudanças estagnadas
O ex-governador e deputado estadual Zeca do PT foi além dos símbolos. Ele defendeu, durante seu primeiro mandato (1998-2002), e defende até os dias de hoje, que o nome do Estado seja oficialmente alterado para “Estado do Pantanal”.
Ao jornal O Estado, Zeca lembrou o episódio em que esteve em Londres, promovendo
pacotes turísticos do Pantanal na embaixada brasileira. “As operadoras diziam: ‘os europeus pedem para ir ao Pantanal, e vendemos para o Mato Grosso’
Quando explicávamos que a maior parte está no Sul, eles se surpreendiam. Isso é prejuízo direto ao turismo”, contou.
Para ele, o nome atual é fruto de um descaso histórico: “Quando dividiram o estado, a elite daqui só quis governar. Nem se preocuparam com o nome. Ficou Mato Grosso lá, aqui, Mato Grosso do Sul. Se fossem justos, chamariam o outro de Mato Grosso do Norte. Isso até hoje gera confusão”.
Zeca também ironizou quem acusava sua proposta de mudar o nome como uma manobra partidária. “Chegaram a dizer que eu queria mudar o nome para fazer propaganda do partido. Isso é ignorância. O nome seria Estado do Pantanal, com a sigla PN, como qualquer outro estado teria. A ideia era valorizar o turismo e a nossa imagem no exterior”, defendeu.
A deputada Gleice Jane (PT), que nasceu após a criação de MS, vê a proposta com bons olhos. Para ela, a mudança de nome ou a adoção mais explícita do Pantanal fortalece a identidade cultural, turística e até econômica do Estado.
“Quando a gente olha para o Nordeste, o Sul, o Rio de Janeiro, todos têm uma identidade muito forte. E a nossa? Ainda é confusa. As pessoas confundem a gente com o Mato Grosso. Mas temos algo único: o Pantanal. E isso pode nos colocar no mapa nacional e internacional”, afirmou.
Segundo ela, a resistência que existia no passado, inclusive dentro do Estado, tende a diminuir: “Hoje é mais fácil entender que essa mudança é estratégica, não ideológica. É uma ferramenta para desenvolvimento e valorização do nosso povo”, completou.
48 anos
Hoje, embora ainda não haja movimento consolidado para uma mudança formal completa do nome do Estado, os gestos simbólicos recentes, como a adoção do codinome e a alteração do termo “divisão” para “criação”, indicam um movimento de ressignificação identitária.
Assim, mesmo aos 48 anos, Mato Grosso do Sul mantém viva uma luta silenciosa pela própria definição, tentando que sua identidade deixe de ser confundida, e se torne reconhecida.
Por Brunna Paula
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