Temendo perda de até R$ 13 milhões em repasses, titular da Sejusp terá reunião para tratar do tema
Ao mesmo tempo em que Mato Grosso do Sul quebra recordes nas apreensões de drogas, a Sejusp (Secretaria de Estado da Justiça e Segurança Pública) ameaça retirar, a partir de setembro, policiais civis e militares da Operação Hórus, capitaneada pelo governo federal, instituída pelo então ministro Sérgio Moro no ano passado. A operação é responsável por prejuízos milionários às facções criminosas. O motivo é a súbita redução de recursos oriundos do Fundo Nacional de Segurança Pública por parte da gestão Jair Bolsonaro ao Estado: cerca de R$ 13 milhões.
A decisão da Senasp (Secretaria Nacional da Segurança Pública), responsável por gerir o fundo, foi anunciada na sexta-feira (7). A partir de agora, o dinheiro é dividido levando em conta o cálculo pelo número absoluto da população de cada estado e não mais pela média por 100 mil habitantes. O critério de possuir áreas de fronteiras também caiu de peso 10 para 5. Mato Grosso do Sul tem 1.550 quilômetros de fronteira seca com Paraguai e Bolívia, notórios exportadores de drogas e armas. Seguindo a nova conta, Mato Grosso do Sul receberá pouco mais de R$ 26,4 milhões ao invés dos R$ 39,5 milhões obtidos neste ano, fazendo o Estado cair da segunda posição no ranking – onde ficava atrás apenas de São Paulo -, para o 14º lugar, sendo ultrapassado por unidades federativas mais populosas, como Minas Gerais, Bahia, Pernambuco, Ceará, Maranhão, Rio Grande do Sul, Paraíba, Rio Grande do Norte, Alagoas, Acre, Santa Catarina, Espirito Santo e Tocantins.
Surpreendido pela medida, o secretário Antônio Carlos Videira se encontra hoje (13) com a cúpula da Senasp junto de representantes de outros estados afetados, como Mato Grosso e Amazonas. Segundo ele, a expectativa é pela revisão da medida. “Tem que ser reconsiderado. Não vamos aceitar uma proposta feita provavelmente por alguém que nunca tenha estado na fronteira. Somos o Estado que mais apreende drogas no Brasil”, afirmou Videia ao O Estado.
“Carga Pesada”
Os números comprovam a indignação de Videira. Segundo dados da Sejusp (Secretaria de Estado da Justiça e Segurança Pública), as autoridades municipais, estaduais e federais apreenderam ao todo cerca de 424 toneladas de drogas até aqui neste ano no Estado. São 1,9 tonelada por dia, maior média obtida na história. O volume, por exemplo, é 88% que as 225,8 toneladas de entorpecentes apreendidas no mesmo período em 2019. Em nota, a Sejusp aponta que apenas no âmbito da Operação Hórus, no período de 23 de setembro do ano passado até segunda-feira passada (11), somente através das ações do DOF (Departamento de Operações de Fronteira), foram apreendidas 155,8 toneladas de drogas, 235 veículos que transportavam entorpecentes, US$ 2,9 milhões (cerca de R$ 15,9 milhões), 4,4 toneladas de agrotóxicos, 937,8 mil pacotes de cigarros e 1.735 pneus contrabandeados. Ainda foram realizadas 333 prisões em flagrante e recuperados 114 veículos roubados ou furtados. Comparativamente houve um aumento de 181,9% no total de apreensões.
A Hórus é de responsabilidade da Seopi (Secretaria de Operações Integradas), mais um dos órgãos criados por Moro, que deixou a atual gestão federal em 24 de abril. O Estado apurou que, no convênio acertado entre União e governo do Estado, a autarquia de responsabilidade de Bolsonaro paga a diária dos policiais, que atuam pela operação em seus horários de folga. Os demais gastos são todos de responsabilidade da administração Reinaldo Azambuja. “Não adianta jogar todo o policiamento estadual para atuar na fronteira. Como fica a violência doméstica, as famílias de vítimas de assassinatos, roubos e furtos na Capital e nas divisas? Tem de ter uma contrapartida para investimento. Como fazer se eles cortam os recursos? Manutenção do equipamento, custeio dos nossos presídios, tudo isso é nosso, bancando sozinho”, disse o secretário Antônio Carlos Videira. A assessoria de imprensa do Palácio do Planalto diz que a medida ainda é “uma proposta em estudo”.
Idealizador de Fundo vê com ressalvas (mais uma) mudança de critério
Um dos criadores do Fundo Nacional de Segurança Pública em 2001, o então secretário nacional da Segurança Pública, coronel José Vicente da Silva Filho, não vê com bons olhos a mudança de critérios de distribuição do dinheiro. “Não podemos apontar nada, mas pode ser dois fatores: garantir mais dinheiro para estados mais populosos, que podem estar tendo aumento da criminalidade, ou garantir que o dinheiro gire mais, fazendo com quem recebeu mais, agora dê chance a outro, afinal os tempos são de crise econômica e de arrecadação”, disse ao O Estado, excluindo Mato Grosso do Sul. “O que não deveria ser o caso de MS, assim como São Paulo, Paraná e Rio de Janeiro, por motivos sempre muito bem explicados, seja de fronteira ou de criminalidade organizada”.
O Fundo Nacional de Segurança Pública foi instituído por lei e tem por objetivo garantir recursos para aprovar projetos, atividades e ações nas áreas de segurança pública e de prevenção à violência, observadas as diretrizes do Plano Nacional de Segurança Pública e Defesa Social. “O problema é que desde então se muda os critérios [de distribuição dos recursos] conforme a gestão federal”, disse Vicente. Em 2018, até dinheiro oriundo das loterias passou a integrar o fundo, fazendo crescer o bolo. A última alteração nas regras do Fundo é de julho do ano passado, foi capitaneada pelo então ministro Moro e acrescentou taxas de produtividade e metas para os estados atingirem tendo como objetivo maiores fatias de dinheiro. Além do combate à corrupção, passou a ser critério a inclusão das polícias estaduais no banco de dados nacional, por exemplo.
(Texto: Rafael Ribeiro)