Mulher morre após teste clandestino com cloroquina nebulizada

Cloroquina
reprodução/Portal Norte

O auxiliar de produção Kleison Oliveira da Silva, 30, recebeu o vídeo da sua esposa, Jucicleia de Sousa Lira, 33, sorridente durante uma sessão de nebulização de hidroxicloroquina. Foi assim que Kleison descobriu que sua mulher, em estado grave e dias após um parto de emergência, havia recebido um tratamento experimental baseado em um medicamento ineficaz contra o novo coronavírus em Manaus.

Depois da nebulização, a saúde de Jucicleia não parou de piorar. Até que, em 2 março, a técnica em radiologia morreu, 27 dias após o nascimento do filho único. O hospital informou à família que a causa foi infecção generalizada em decorrência da Covid-19.

A responsável pela nebulização da hidroxicloroquina e pela viralização do vídeo é a ginecologista e obstetra paulistana Michelle Chechter. Ela atuou em Manaus com o marido, o também médico Gustavo Maximiliano Dutra.

O viúvo diz que, durante as conversas no hospital, Michelle Chechter não o consultou sobre a nebulização ou o vídeo. Ele só descobriu que a esposa havia assinado uma autorização. São três parágrafos curtos com quatro erros gramaticais e de grafia.

Ali, a paciente concorda que Chechter utilize a “técnica experimental nebuhcq líquido, desenvolvida pelo dr. Zelenko”. Além disso, ela autoriza o uso do depoimento gravado na UTI e o relato do caso numa revista científica.

Relatos obtidos afirmam que pelo menos outras três pacientes receberam nebulização mesmo sem terem autorizado. Todas morreram. Uma delas teria sido Ingrid Chaves, 32, internada com Covid-19 quando estava grávida de cinco meses.

Para a OMS, a hidroxicloroquina oferece risco adicional para mulheres grávidas. “Embora a hidroxicloroquina tenha sido usada em gestantes com doenças autoimunes sistêmicas, como o lúpus eritematoso sistêmico, grávidas podem ter ainda mais razões para relutar em usar hidroxicloroquina para profilaxia de Covid-19”, diz a instituição.

Exeprimento foi criado nos Estados Unidos

O “protocolo” adotado em Manaus foi criado pelo médico ucraniano-americano Vladimir Zelenko. Ele foi alçado à fama em março de 2020, quando sua defesa do uso da cloroquina contra a Covid-19 foi encampada pelo então presidente Donald Trump, de forma semelhante ao que ocorreria em seguida no Brasil.

Em abril de 2020, Zelenko se tornou alvo de uma investigação preliminar de um procurador federal por ter mentido que seu estudo havia recebido o respaldo da FDA, a agência norte-americana que regula medicamentos.

Sem ética

Para aplicar o tratamento experimental, que consiste na inalação de comprimidos de cloroquina macerados e diluídos, Chechter ignorou todas as boas práticas, segundo o infectologista Francisco Ivanildo de Oliveira, gerente médico do Sabará Hospital Infantil, em São Paulo.

As irregularidades começam pela ausência da aprovação prévia por um comitê de ética em pesquisa, exigência legal no Brasil. Outro problema é que, na autorização apresentada à paciente, ela não foi informada sobre os riscos, conforme as normas brasileiras do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.

(Com informações da Folha de S. Paulo)

 

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