Entidades filantrópicas lutaram pela queda do reajuste, junto ao STF, mesmo após a sanção
Por Brenda Leitte e Suelen Morales – Jornal O Estado do MS
Desde que foi regulamentada há 36 anos, no dia 25 de junho de 1986 (pela Lei nº 7.498 de 1986), a classe da enfermagem, que inclui técnicos e parteiras, segue sem um piso salarial nacional. Os trabalhadores de saúde lamentaram, nessa segunda-feira (5), a decisão do ministro Luís Roberto Barroso, do STF (Supremo Tribunal Federal), de suspender a lei do piso nacional da enfermagem, que já havia sido sancionada há um mês pelo presidente Jair Bolsonaro (PL).
Segundo a decisão do STF, há riscos à prestação do serviço de saúde e possibilidade de demissão em massa diante dos novos salários. Barroso deu um prazo de 60 dias para que os entes públicos e privados da saúde esclareçam o impacto financeiro do piso e afirmou que o tema deve ser debatido com os demais ministros do STF nos próximos dias.
O secretário estadual de Saúde, Flávio Britto, ponderou que não se pode ir contra uma decisão já judicializada pela Suprema Corte. “Primeiro que qualquer piso salarial no nosso país sempre é muito bem-vindo. O Governo do Estado só faria a aplicação no final ou no início do outro ano. Agora para a iniciativa privada esse impacto seria imediato. Acredito que temos que respeitar a decisão e ainda ontem fizemos uma reunião levantando o impacto que isso trará para o Estado, estamos fazendo esse levantamento conforme o solicitado”, disse.
Já a Sesau (Secretaria de Saúde de Campo Grande) informou em nota que ainda avaliará os eventuais impactos da lei. “Cabe destacar que a gestão administrativa de Campo Grande é sensível às demandas da categoria, tendo concedido diversas melhorias e conquistas históricas aos enfermeiros e técnicos de enfermagem. O salário do enfermeiro teve uma evolução de ganho de 56,9% nos últimos cinco anos, saindo de R$ 2,067,00 para R$ 3,639,00. Já os técnicos de enfermagem tiveram aumento de 65,2%, saindo de R$ 1.200 para R$ 1.837.”
Retrocesso e desrespeito
Em contrapartida, a suspensão foi vista como um retrocesso e desrespeito à classe dos profissionais da saúde. “Recebemos com indignação e decepção, pois todas as questões já foram tratadas nas comissões que transitou a PL, sendo considerado constitucional. Não compete ao STF discutir empregabilidade ou dados econômicos. A decisão do ministro é monocrática, sendo assim é questionável”, posicionou o Siems (Sindicato de Enfermagem de MS).
Para a jovem enfermeira Gabrielli Almeida, de 23 anos, começar a carreira em meio a um cenário de desvalorização não é nada motivador. “É frustrante ver anos de luta da nossa classe e que ainda assim, depois de tantos anos, não ter o reconhecimento que merecemos. Só queremos um salário justo e condizente com nosso trabalho e capacitação. No meu último plantão, meus colegas disseram que estão desanimados e pensando em abandonar a profissão”, enfatizou ao jornal O Estado.
Foi avaliado ainda que os hospitais públicos, Santas Casas e unidades ligadas ao SUS poderiam ser os mais impactados e atendeu ação da CNSaúde (Confederação Nacional de Saúde, Hospitais e Estabelecimentos e Serviços), que questionou a constitucionalidade da lei que estabeleceu o piso da categoria. Em 18 de agosto deste ano, a falta de orçamento e a exigência de aumento dos salários dos profissionais da classe acarretaram em pedidos de auxílio estadual e federal, feitos por hospitais da Capital.
Recursos insuficientes
Diante disso, a Santa Casa de Campo Grande, que também assinou a Carta, alegou que o piso impactaria em R$ 3,3 milhões por mês. “É preciso que os responsáveis pela referida lei façam a alocação dos recursos necessários para a cobertura da despesa. A Santa Casa vem trabalhando com déficit milionário como as demais filantrópicas do país. Na decisão, o ministro reafirma que o recurso do SUS cobre apenas cerca de 60% das despesas.”
Conforme a Lei nº 14.434/2022 que havia sido sancionada no dia 4 de agosto deste ano, o piso salarial dos enfermeiros foi fixado em R$ 4.750. Para técnicos de enfermagem, seria 70% (R$ 3.325) deste valor e, para auxiliares de enfermagem e parteiras, 50% (R$ 2.375). A regra valeria para contratados no regime da CLT (Consolidação das Leis do Trabalho).
Por fim, o Siems assegurou que a luta continua e que a classe pretende recorrer da decisão do STF. “A categoria conta com seu poder mobilização, e irão usar mão desse recurso com apoio de todas as entidades da Enfermagem. Existem medidas jurídicas que o sindicato adotará”, finalizou a nota.
Sindicato planeja protesto nessa sexta-feira em Campo Grande
O Cofen (Conselho Federal de Enfermagem) afirmou que todos os estudos de impactos orçamentários já foram devidamente apresentados e debatidos em todas as esferas e, justamente por ser viável a aplicação, a lei foi sancionada pelo presidente Jair Bolsonaro no dia 4 de agosto de 2022.
“A decisão do ministro atende a conveniência pura da classe empresarial, que não quer pagar valores justos aos serviços prestados pela enfermagem. A lei é um dispositivo constitucional que permitirá lutar para erradicar os salários historicamente miseráveis da categoria e estabelecer condição digna de vida e de trabalho para o maior contingente de profissionais de saúde do país”, reforçaram em nota.
Diante disso, o Siems organiza em Campo Grande um protesto geral na sexta-feira (9), a partir das 10h, na Praça do Rádio Clube. No total, a Capital conta com 4.405 enfermeiros, 8.706 técnicos em enfermagem e 1.097 auxiliares.
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