Rol taxativo de procedimentos da ANS afeta autonomia médica

STJ
Foto: Agência Brasil
Por Rafaela Alves – Jornal O Estado

Lista para a cobertura dos planos de saúde era considerada exemplificativa antes da votação do STJ

O STJ (Superior Tribunal de Justiça) alterou o entendimento sobre o rol de procedimentos listados pela ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar) para a cobertura dos planos de saúde. Antes considerada exemplificativa, a lista passou a ser considerada taxativa. 

Entretanto, além de afetar diretamente os consumidores de planos médicos, o rol taxativo vai prejudicar também a autonomia médica, uma vez que os médicos não poderão considerar a individualidade dos pacientes para indicar o tratamento mais adequado à sua condição, interferindo, assim, na condução de cada caso. 

O STJ deixou numa brecha, mas apenas para casos excepcionais. De acordo com o presidente do SinMed-MS (Sindicato dos Médicos de Mato Grosso do Sul), Marcelo Santana, só de uma questão individual ter que de ir para uma decisão judicial, já está interferindo na autonomia médica. 

Presidente Sinmed-MS

Foto: Divulgação/Sinmed

“Sempre que você interfere nessa questão [da individualidade de cada paciente] você está influenciando, alterando, uma decisão médica e eu acho que a prescrição médica deve ser sempre respeitada, porque cada tratamento é individualizado. Quando um médico prescreve, ele prescreve de acordo com aquilo que ele julga ser necessário para o paciente”, assegurou. 

As operadoras do setor já tinham a prática de recusar a cobertura de exames, procedimentos, tratamentos multidisciplinares especializados, cirurgias ou até medicamentos que não constam na lista da ANS e isso já fazia com que os consumidores recorressem à Justiça para ter seus pedidos acolhidos. Agora, o número de judicializações deve ser ainda maior. 

No entanto, segundo a advogada especialista em Direito da Saúde e Tutelas de Urgência contra Planos de Saúde e também presidente da Comissão de Defesa do Direito da Pessoa com Autismo da OAB/MS (Ordem dos Advogados do Brasil – secção de Mato Grosso do Sul), Raíssa Duailibi Maldonado Carvalho, nem tudo está perdido e a partir da nova decisão os trabalhos para conseguir os tratamentos que são negados pelas operadoras terão que ser feitos em cima das exceções impostas pelo STJ.

“Precisamos comprovar que os tratamentos prescritos são necessários e trabalhar em cima das exceções. E mas do que nunca o papel do médico será fundamental, porque o laudo com a prescrição será essencial, ele terá que ser rico em detalhes para que possamos pleitear os tratamentos judicialmente”, explicou. 

Ainda conforme a advogada, quem faz tratamentos através de liminares pode ficar tranquilo, uma vez que as operadoras só podem suspender as liminares ativas através de nova decisão judicial e não apenas por conta do julgamento que tornou o rol dos procedimentos da ANS taxativo. 

“Até porque a decisão proferida não tem efeito vinculante, ou seja, os Tribunais não são obrigados a seguir esse entendimento [do rol taxativo]”, complementou a advogada. Mas esse é, justamente, o medo da servidora pública Flávia Caloni, que tem um filho de 13 anos autista e que ganhou por meio de liminar direito ao tratamento ABA, uma terapia voltada para análise do comportamento, que custa em média R$ 4 mil na Capital.

 “Com essa decisão do rol taxativo a luta será ainda maior para quem vai depender de um tratamento específico e que não está listado. Até agora os planos de Campo Grande e do Estado, até onde eu sei, ainda não se movimentaram para isso e nosso maior medo é, justamente, que nossas liminares sejam derrubadas”, pontuou Raíssa Duailibi.

SUS

A dificuldade para conseguir iniciar ou seguir com tratamentos ainda não previstos no rol de coberturas da ANS pode afetar ainda o SUS (Sistema Único de Saúde). Segundo o secretário estadual de Saúde, Flávio Britto, as pessoas que não conseguirem os tratamentos com os planos de saúde poderão tentar pelo SUS, com isso, irá aumentar também as judicializações na rede privada de saúde. 

“Eu não tenho esse número com exatidão, mas de certo isso ocorrerá. Na verdade grande parte da população tem dois planos de saúde, o privado e o do SUS. Por exemplo uma pessoa que tem um infarto de madrugada, ele vai parar na Santa Casa, pelo SUS, independente de ter plano privado ou não, ele vai bater na porta do Sistema Único de Saúde. Então obviamente isso vai impactar muito”, esclareceu.

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