Projeto que altera cobrança de taxas em cartórios é alvo de críticas

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Foto: Luciana Nassar/Wagner Guimarães/Alems

Embora o projeto que tramita na Assembleia reduza o repasse para alguns órgãos, ainda recebe críticas

Há muito tempo, sem sucesso, se discute na Alems (Assembleia Legislativa de MS) propostas que tem como objetivo alterar os valores das taxas cartorárias em Mato Grosso do Sul. Apesar de todos considerarem ser urgente a redução, ainda não se chegou a um consenso do valor que é necessário para que o projeto atenda realmente a sociedade. Uma nova proposta, enviada pelo Tribunal de Justiça, tramita na Casa de Leis, mas será que a proposta vai resolver a questão?

Segundo levantamento da Fiems (Federação das Indústrias do Estado de Mato Grosso do Sul), os valores praticados em Mato Grosso do Sul são os mais elevados do país. Estudos apontam diferença de até 4.000% entre as taxas cobradas em Mato Grosso do Sul, na comparação com outras regiões do país. Por conta dessa realidade, as pessoas que utilizam diariamente os serviços cartoriais passaram a procurar cartórios de outros Estados, principalmente do Paraná, onde os valores são muito menores. Assim, Mato Grosso do Sul perde, diariamente, clientes para outros Estados.

O texto do projeto prevê que o Funjecc, fundo gerido pelo Poder Judiciário, tenha redução de 33%, como meio de incentivar os cidadãos a realizarem atos em cartórios de Mato Grosso do Sul, em vez de buscar esses serviços em outros Estados. Como a proposta ainda não foi discutida com a sociedade, entidades estão se manifestando sobre o que acham do projeto que tramita atualmente na Alems.

O presidente da Fiems, Sérgio Longen, defende a ampliação da redução para outros serviços cartoriais. “No nosso entendimento, deveríamos ampliar essa proposta para 33% de redução também nos registros de cartórios. Desta forma, estaremos dando um passo importante na redução dos custos”, disse Longen.

A OAB/MS (Ordem dos Advogados do Brasil/Mato Grosso do Sul), manifestou ser contrária à proposta originária do projeto, pois embora em algumas faixas de imóveis haja diminuição de taxas, em outras há um aumento que precisa ser revisto.

Segundo o presidente da AAMS (Associação dos Advogados de Mato Grosso do Sul), André Xavier, a nova tabela traz avanços, mas determinados valores, como os de registros e escrituração de imóveis, têm de ser revistos, pois do contrário continuarão levando os sul-mato-grossenses a buscar serviços notariais em outros Estados.

Para o deputado João Henrique Catan (PL), a questão poderia ser resolvida definitivamente, com uma ação do governo estadual. “O problema das taxas cartorárias é o governo, que não quer enfrentar a situação. É preciso sentar com os órgãos que criaram fundos constitucionais em cima dos emolumentos e dizer: já que a arrecadação do Estado aumentou R$ 10 bilhões nos últimos 8 anos, o governador vai recompor isso.

Foram colocados estes fundos, a taxa está desatualizada, necessita de correção, há cartórios que ficam inviáveis. O problema não é do Tribunal de Justiça, não é do Ministério Público, dos criadores do fundo, da Defensoria da PGE. É preciso retirar esta modalidade de arrecadação orçamentária das taxas, isso tem que estar no orçamento do Estado, em 2024.

Assim, é preciso o Estado, o governador entender, retirar estes fundos, fazer um compromisso e compensar.”

Votação

O projeto de lei 338/23 já passou pela CCJR (Comissão de Constituição, Justiça, Redação) e está pautada para a sessão desta quinta-feira (7), a 1ª votação da proposta. Segundo a assessoria da presidência da Alems, o texto deve sofrer alterações, já que foram apresentadas pelos deputados, 11 emendas modificativas. O presidente da Alems, Gerson Claro (PP), declarou que está intermediando as discussões, para que o projeto que for aprovado beneficie a população. “Temos trabalhado junto aos poderes para buscar alternativas para reduzir os custos”.

Na proposta, há um capítulo específico sobre moradia popular que terá redução de 50% na taxa do primeiro registro para imóveis financiados pelo Sistema Financeiro de Habitação. Os beneficiários de regularizações fundiárias e reforma agrária, primeira inscrição de programa de agricultura familiar, terão isenção na taxa de registro do imóvel, conforme as dimensões do bem.

Pelas tabelas, o registro de uma transação imobiliária de até R$ 100 mil custará R$ 1.796,70; sendo de R$ 200 mil, a taxa fica em R$ 2.870,20; de R$ 500 mil, fica em R$ 3.920,20. O maior valor é de R$ 8,6 mil, para transações acima de R$ 9 milhões.

Para situações que envolvam a inscrição de garantia referentes a crédito rural, que produtores precisam registrar em cartório quando obtêm financiamento, o projeto aponta que incidirá somente o Funjecc, no percentual de 5%, essa exclusão dos fundos deve reduzir os valores em pelo menos 30%. Para o registro referente ao valor de R$ 200 mil, por exemplo, a cobrança da taxa será de R$ 450; sendo acima de R$ 1,5 milhão, o valor ficará em R$ 3.750.

Alguns serviços que estão com os valores congelados desde 2014 serão atualizados. Para uma inflação acumulada de 72% em 9 anos, alguns serviços, como o registro de casamento, subirão 20,7%, passando de R$ 377,00 para R$ 454,95. Certidões simples custarão R$ 39,15. Escrituras sem transações de valores, como emancipação e união estável, ficarão em R$ 176,85; na tabela atual, consta o valor de R$ 131. Para as que envolvam valores, há uma série de preços, chegando a R$ 10,6 mil, quando a situação envolvida for superior a R$ 5 milhões.

Presidente da FCDL quer saber fundamento para aumentar

O projeto de lei 338/23 tem sido duramente criticado pela presidente da FCDL (Federação das Câmaras de Dirigentes Lojistas de Mato Grosso do Sul), Inês Santiago, que observa que, na verdade, o projeto traz reajuste de algumas taxas, enquanto reduz, minimamente, outras. Para ela, o que deveríamos estar discutindo é o porquê de termos essas taxas incluídas nos pagamentos dos serviços, e não o contrário.

“O que acontece com as altas taxas cartorárias? O grande responsável por essas taxas serem tão altas é que 35% a 40% de tudo que se paga em cartório, desde um reconhecimento de firma, passando por uma escritura, chegando a um testamento milionário, vai para os fundos do Tribunal de Justiça, do Ministério Público, da Defensoria e da Procuradoria-Geral do Estado. O que significa dizer que a cada R$ 100 que é pago, R$ 40 é repassado para esses fundos. Então, se não houvesse o repasse para os fundos, o R$ 100 viraria R$ 60 e não R $ 100”, explica Inês.

A presidente questiona a existência desses fundos para entidades que têm o seu próprio orçamento de receitas vindo da União para mantê-las. Além disso, destaca que esses recursos não são fiscalizados pelo TCE (Tribunal de Contas da União).

“Esse fundo, chega no caixa dessas entidades, que têm os seus próprios orçamentos de receitas vindo da União para mantê-las. E esse dinheiro, ele não é controlado nem fiscalizado pelo Tribunal de Contas do Estado. Então, ele pode ser usado pelo Tribunal, pelo Ministério Público, por quem quer que seja, da maneira como melhor lhes convier.

E o que nós não queremos discutir, mas estamos chegando nesse patamar, é que no ano de 2021 já se sabe que sobrou do fundo, só do Tribunal de Justiça, que é um órgão dos quatro, o valor de R$ 22.300 milhões. E por que se quer aumentar, então, dobrar o valor, em alguns casos até 150% de aumento, nos serviços cartorários, se nós não sabemos para onde vai esse dinheiro, como ele está sendo utilizado, e esse dinheiro não é um dinheiro do Tribunal. É um dinheiro do cidadão sul-mato-grossense, sai do bolso do cidadão.

E nós não temos uma prestação de contas de como é usado esse dinheiro.

Se está se pedindo aumento das taxas, para aumentar esse repasse, é porque esses milhões não estão sendo suficientes? O Tribunal precisa de mais dinheiro? Se, ele precisa de mais, como ele usou o dinheiro e o que está faltando? Então, essa é a questão que faz com que essas taxas cartorárias sejam valores tão altos”, diz a presidente.

Além da evasão, Inês destaca outro prejuízo que as altas taxas cobradas no Estado trazem, como deixar a população na ilegalidade por não ter como arcar com as altas taxas praticadas no Estado.

“E, é importante colocar, que em razão desse alto custo, por exemplo, das escrituras e o alto custo do registro de imóveis, por exemplo, que é só um exemplo, muito cidadão sul-mato-grossense fica na ilegalidade. Por quê? Porque compra um terreno com uma dificuldade gigantesca e não consegue escriturar o terreno e nem registrá-lo no cartório.

Quando ele vende esse terreno, ele vende com um contrato de gaveta, que um terceiro compra com um contrato de gaveta, e assim o sul-mato-grossense, fica na ilegalidade. Não porque ele quer, mas porque o valor das taxas cartorárias inviabiliza de estar na legalidade. Então, ele é empurrado para essa situação.

O acesso precisava ser mais facilitado, e por ser mais facilitado, ele teria que ser mais barato e não mais caro, como pretende-se que seja.”

Por Daniela Lacerda.

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