Mulheres muçulmanas são ‘leiloadas’ online na Índia

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Afreen Fatima, 22, ainda está muito assustada para sair de casa depois que descobriu que estava sendo leiloada online com outras mulheres muçulmanas por ativistas de extrema direita hindus —eles também ameaçaram sequestrá-la e vendê-la como escrava sexual.

“Não consigo dormir de pensar que eles podem me atacar na vida real”, diz ela.

Fatima recebeu um telefonema de uma amiga depois da meia-noite em 4 de julho, informando que suas fotos particulares e links para seus perfis em redes sociais tinham sido publicados no site Sulli Deals sem seu consentimento. “Fiquei enojada. E não conseguia entender o que estava acontecendo.”

Naquele dia, mais de 90 mulheres muçulmanas, incluindo estudantes, ativistas e jornalistas, foram “leiloadas online”, provocando indignação entre a comunidade muçulmana.

Os homens hindus de direita tinham criado um projeto comunitário na plataforma GitHub, onde qualquer pessoa podia conseguir o “Sulli Deal” do dia. “Sulli” é um termo pejorativo usado para mulheres muçulmanas na Índia. Quando um usuário selecionava a opção “negócio do dia” na tela de abertura, ela exibia a foto de uma mulher.

Antes que fosse derrubado, o site já funcionava havia 20 dias e tinha divulgado fotos dessas mulheres e links para seus perfis em redes sociais.

Depois de semanas de indignação, cobertura na mídia e parlamentares pedindo a ação da polícia, nenhuma prisão tinha sido feita. Enquanto dois boletins de ocorrência foram feitos —em Uttar Pradesh e Déli—, três vítimas disseram à Folha que não souberam se foram registrados boletins contra suas queixas.

“Certamente os especialistas em crime cibernético da polícia de Déli podem localizar digitalmente quem cometeu a ofensa”, disse a advogada Vrinda Grover, que representa algumas das vítimas. “A polícia de Déli deve ser capaz de rastrear casos desse tipo. Se não estão fazendo isso, o que podemos pensar?”

Desde que o Partido Bharatiya Janata (Partido do Povo Indiano) chegou ao poder, em 2014, os muçulmanos da Índia sofrem constantes ataques de nacionalistas hindus. Grande parte do ódio é promovido por grupos ou indivíduos próximos ao governo do primeiro-ministro Narendra Modi.

As populações muçulmanas mais vulneráveis estão em estados governados pelo PBJ, que presenciaram ataques de nacionalistas de direita hindus sem uma intervenção efetiva da polícia.

Partidos políticos de oposição estão buscando ação contra os culpados, alguns dos quais foram identificados pelas vítimas e estão em liberdade.

Em 27 de julho, o líder do Congresso, Md Jawaid, juntamente com 56 membros do Parlamento, escreveu ao governo Modi pedindo um inquérito contra os criminosos envolvidos no complô e sua prisão. “Os perpetradores desses crimes de assédio sexual e de ódio encontram coragem para fazer isso porque não se toma nenhuma medida contra eles”, disse.

Três dias depois, a deputada Priyanka Chaturvedi, do partido Shiv Sena, escreveu ao Ministério da Eletrônica e Tecnologia da Informação dizendo: “Me dói ver que quase nenhuma ação com relação a esse caso foi tomada até agora, apesar de sua seriedade”.

“O objetivo do aplicativo era degradar e humilhar mulheres pertencentes a uma determinada comunidade”, afirmou ela.

Enquanto a indignação se dilui na consciência coletiva da sociedade indiana, o crime de ódio do Sulli Deals continua assombrando Ghazal, uma consultora de marketing em Déli que costumava escrever sobre as atrocidades contra indianos muçulmanos.

Em 1º de agosto, por exemplo, um certo Kuldeep Chauhan, que diz ser um tutor em sua bio no Snapchat, enviou a ela a seguinte mensagem: “Eu vi você em algum lugar, acho que seu nome e a foto saíram no Sulli Deals… era um bom app”.

“Continuo achando que, se eles estão me perseguindo e me encontrando online, eles podem estar me seguindo na vida real. Estou vivendo com esse medo”, disse Ghazal.

Ghazal prestou queixa na polícia em 11 de julho, mas não foi informada se algum boletim foi registrado. “Perdi a fé na polícia. Na verdade, quando falei com uma autoridade da polícia de Déli, ele compreendeu nosso problema e prometeu nos ajudar. Mas nada aconteceu depois”, disse ela.

Ghazal disse que foi visada por pessoas apoiadas pelo governo do PBJ por suas opiniões e sua religião. “Não me sinto segura como minoria na Índia. Não é mais o país pelo qual meus ancestrais lutaram contra os britânicos e estabeleceram uma nação secular”, disse.

O Relatório da Situação das Minorias no Sul da Ásia de 2020 diz que a Índia se tornou “um espaço perigoso e violento para as minorias muçulmanas” desde que o governo Modi aprovou emendas no Ato da Cidadania em 2019.

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