A Comissão Nacional de Saúde da China anunciou neste domingo (25) que não divulgará mais dados diários de casos e mortes por Covid, como fazia desde o início de 2020.
O anúncio se dá em meio a uma onda sem precedentes de contágios no país asiático, consequência do relaxamento da estrita política para a contenção da pandemia conhecida como Covid zero.
A Comissão, que tem status de ministério, não deu nenhuma justificativa para a decisão. Dez dias antes, porém, havia declarado que o rastreamento de novos casos se tornara praticamente impossível desde a flexibilização das medidas de controle.
Isso porque, ao decretar o fim da obrigatoriedade dos testes PCR e a permissão para quarentena domiciliar, os chineses passaram a realizar exames em suas próprias casas, e a maior parte deles não comunica os resultados às autoridades.
O órgão acrescentou que o Centro para o Controle e a Prevenção de Doenças (CDC) chinês publicará informações sobre o surto, mas não especificou que dados serão divulgados e com que frequência.
Também o CDC tinha anunciado que não publicaria relatórios diários sobre o coronavírus no início do mês.
Segundo a agência de notícias AFP, a população, que vinha notando a discrepância dos números oficiais em relação à quantidade de conhecidos infectados, recebeu o anúncio com sarcasmo.
“Finalmente acordaram e perceberam que não podem enganar as pessoas com números subestimados”, escreveu um usuário da rede social Weibo, o Twitter chinês. Outro internauta comemorou a notícia ao afirmar que a comissão era “o maior escritório de fabricação de estatísticas falsas do país”.
Outra controvérsia que pôs os dados oficiais em xeque foi uma nova metodologia imposta pelo regime. Só as mortes decorridas de pneumonia ou insuficiência respiratória ocasionadas pelo novo coronavírus são contabilizadas como óbitos relacionados à doença.
Desde a suspensão da Covid zero, as autoridades só atribuíram seis mortes ao vírus, e a OMS (Organização Mundial da Saúde) afirma não ter recebido nenhum dado sobre novas hospitalizações a partir da data.
Relatos na mídia estatal indicam pressão sobre o sistema de saúde nacional, com funcionários trabalhando mesmo doentes e médicos de comunidades rurais aposentados sendo recontratados para ajudar com os esforços.
Funcionários de crematórios ainda relataram à AFP um aumento expressivo do número de cadáveres que estão recebendo. Guangzhou, cidade com 19 milhões de habitantes, havia anunciado que adiaria suas cerimônias fúnebres para depois de 10 de janeiro em razão de um “aumento significativo de demandas” –a justificativa depois foi retirada do comunicado.
Diante do apagão de dados centralizados, algumas províncias passaram a divulgar suas próprias estatísticas sobre a dimensão do vírus. É o caso da província de Zhejiang, a cerca de 200 quilômetros de Xangai, que conta com cerca de 65 milhões de habitantes.
Segundo as autoridades locais, o número de contágios diários hoje supera um milhão. Além disso, a quantidade de pacientes que visitaram clínicas especializadas aumentou 14 vezes desde a semana passada, e pedidos de internação no centro de emergência da capital, Hangzhou, mais do que triplicaram em relação à média do ano passado.
Em nota, as autoridades de Zhejiang alertaram para o fato de que a situação deve piorar até o Ano-Novo Lunar, em 22 de janeiro, quando o número de infecções diárias deve chegar a dois milhões –o feriado mais importante do calendário chinês marca o momento em que os cidadãos voltam para as suas cidades de origem para festejar.
Também as cidades de Qingdao, no leste, e Dongguan, no sul, estimam dezenas de milhares de casos diários de Covid, muito mais do que o registrado pelos órgãos nacionais. Enquanto isso, a capital, Pequim, afirmou no sábado (24) que abriga um grande número de pessoas infectadas e que está fazendo todo o possível para controlar o surto e reduzir taxas de mortalidade.
A mudança no curso da polêmica política de Covid zero, que incluía práticas como confinamentos em larga escala e internação sistemática de pessoas contaminadas e havia sido criticada inclusive por organismos internacionais, vem na esteira de uma incomum série de mobilizações populares realizadas nas principais cidades e universidades do país no final de novembro.
Os protestos foram o desafio público mais forte à liderança de Xi Jinping e vieram cerca de um mês após ele ser coroado com um inédito terceiro mandato à frente do regime. Também se inseriram na desaceleração da economia chinesa, com o país registrando a maior queda no fluxo do comércio em dois anos e meio.
Com informações da Folhapress