A final da Copa do Brasil, marcada para este domingo (21), no Maracanã, no Rio de Janeiro, entre Corinthians e Vasco, vai ser vivida longe do
estádio por milhares de torcedores espalhados pelo país. O jogo de volta será disputado às 17h (de MS), no Maracanã, com ingressos esgotados apenas três horas após a abertura das vendas. A primeira partida, realizada na quarta–feira (17), na Neo Química Arena, terminou empatada em 0 a 0, resultado que mantém a disputa aberta e transfere a definição do título para o confronto no Rio de Janeiro.
O duelo evidencia uma realidade comum a torcedores que vivem fora do eixo Rio São Paulo: amar um clube distante geograficamente, mas
presente no cotidiano, nas conversas, na rotina familiar e na construção da identidade.
Em Campo Grande, corintianos e vascaínos se organizam para viver a decisão coletivamente. A Pavilhão 9 – Subsede CG, do Corinthians,
prepara uma estrutura para receber torcedores, assim como a Força Jovem Vasco, que também promove transmissão coletiva. A mobilização
se repete em finais, clássicos e jogos decisivos e ajuda a explicar por que clubes nacionais mantêm presença forte em regiões onde o futebol local ainda enfrenta dificuldades para se consolidar.
Coisa de família Para o professor de Educação Física José Guilherme, 23 anos, torcer para o Vasco nunca foi uma escolha racional. Carioca de nascimento, ele chegou a Mato Grosso do Sul ainda criança, após o pai, militar, ser transferido para o Estado, mas carrega o clube como herança desde o berço.
“O Vasco entrou na minha vida no dia em que eu nasci. Toda a minha família é vascaína. É um amor que não se explica. Independentemente da fase, a gente está ali, torcendo e apoiando”, afirma.
Antes da mudança, José Guilherme viveu o ambiente dos estádios no Rio de Janeiro e já acompanhou partidas em São Januário, no Maracanã, no Engenhão e até no Morenão.
Mesmo morando em Campo Grande, manteve por anos a rotina de acompanhar o clube presencialmente em viagens ocasionais ao Rio, pelo menos duas ou três vezes por ano, até o fim da pandemia.
Um dos momentos mais marcantes foi a semifinal do Campeonato Carioca de 2018, quando o Vasco venceu o Fluminense com gol nos acréscimos. “Foi um daqueles jogos que ficam para sempre na memória”, relembra. Hoje, a distância impõe limites, mas não diminui o envolvimento. “A única coisa que mudou foi não poder ir a São Januário. Continuo acompanhando todos os jogos pela televisão, sofrendo,
comemorando e me emocionando.”
Segundo ele, mesmo longe, o torcedor encontra outras formas de participar. “A gente ajuda como pode, compra produtos oficiais, participa de
campanhas, tenta estar presente de algum jeito”.
Do lado corintiano, a relação com o clube também nasce dentro de casa. Davi Candido, 29 anos, presidente da Pavilhão 9, cresceu em uma
família inteira de corintianos e aponta o título brasileiro de 2005 como o momento em que percebeu que a paixão seria definitiva. “Eu tinha nove anos. Estava com meus pais em um bar, todo mundo comemorando. Ali caiu a ficha”, relembra.
Para Davi, o Corinthians ultrapassa o futebol. “É basica mente a minha vida. Eu durmo e acordo com notícias do clube. Viver com o Corinthians todos os dias já é natural”, diz. Mesmo longe de São Paulo, ele afirma que a distância não diminui o vínculo. “A distância cria dificuldades, mas não muda o sentimento. O Corinthians é um clube que você torce, não importa onde esteja.”
Fundada há 20 anos em Campo Grande, a torcida organiza caravanas, encontros e transmissões coletivas. Segundo Davi, o coletivo tem papel central no vínculo torcedor-clube. “A torcida ajuda a manter essa ligação. A gente cria uma rotina, se encontra, conversa, sofre e comemora
junto. Isso faz o torcedor se sentir próximo do time, mesmo fora de São Paulo”.
‘A gente cresce vendo, ouvindo’
A opção por torcer para clubes de fora do estado onde se vive também aparece de forma natural nos relatos dos torcedores. Para José Guilherme, a ligação com o Vasco nunca esteve condicionada ao local de moradia. “Acho que o amor pelo clube independe de onde você
está. A distância não faz a pessoa ser menos torcedora”, afirma. Já Davi avalia que, em muitos casos, não se trata de escolha, mas de identificação construída desde cedo.
“A gente cresce vendo, ouvindo, vivendo aquele clube dentro de casa. Não é algo que você simplesmente decide de pois”, diz.
Para este domingo, José Guilherme, a esperança vascaína passa pela postura do time. “Espero que o Vasco se comporte como Vasco, que vá para cima e acredite até o último segundo. Esses jogadores estão a 90 minutos de entrar para a história do clube.”
Do lado corintiano, Davi cobra entrega total. “Os jogadores tem que dar a vida dentro de campo, honrar a nossa camisa e a nossa história. A torcida vai estar apoiando em todo lugar, seja no Maracanã, nas sedes ou dentro de casa.”
Torcedora do Operário defende pertencimento
Integrante da Garra Operariana, torcida organizada do Operário FC, Tainara Calonga avalia que torcer para um clube do próprio estado está ligado à identidade regional, mas precisa ser analisado dentro da realidade do futebol local. “Torcer para um clube daqui dá sensação de pertencimento, de representar o lugar onde a gente vive. O futebol também é uma forma de identidade regional”, afirma.
Ela pondera, no entanto, que não é justo cobrar exclusividade do torcedor. “Os clubes de São Paulo e do Rio sempre tiveram mais espaço na mídia, mais títulos e mais visibilidade. Eles acabam fazendo parte da vida das pessoas desde cedo.”
Segundo Tainara, a falta de calendário, investimento, estrutura e continuidade dificulta a criação de vínculos duradouros.
“Se o time quase não joga e não aparece, fica difícil o torcedor criar ligação.
Por Mellissa Ramos
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