“Claramente o eleitor demonstrou que quer algo novo comandando o MS”

Ben-Hur Ferreira
Imagem: Reprodução/Nilson Figueiredo
Comentarista político aponta um certo esgotamento contra as lideranças políticas, ao analisar o resultado a governo na eleição de 2022

Professor universitário e comentarista político, o ex-deputado federal Ben-Hur Ferreira, avaliou que houve esgotamento por parte dos eleitores com as lideranças políticas em razão do resultado da eleição a governo de Mato Grosso do Sul, entre Capitão Contar (PRTB) e Eduardo Riedel (PSDB). Praticamente nenhum instituto de pesquisa acertou o resultado de 26,71% para o Contar contra 25,16% de Riedel. Ben-Hur defende que ficou claro que a população optou pelos novos candidatos, deixando de fora da corrida o ex-governador André Puccinelli (MDB), a ex-vice-governadora Rose Modesto (União) e o ex-prefeito de Campo Grande Marquinhos Trad (PSD). “O fato de um candidato que nunca disputou uma eleição ter chegado ao segundo turno, e o outro candidato que é deputado no primeiro mandato e nunca disputou uma eleição majoritária, claramente mostra que há um sentimento de renovação em Mato Grosso do Sul”, acredita.

Convidado pelo jornal O Estado para analisar o cenário político sul-mato-grossense, Ben-Hur pontua o fato de dois candidatos sendo apoiadores do presidente Jair Bolsonaro (PL) vai se submeter ao cenário desafiador em relação aos eleitores de Lula em MS. “Quem vai ser capaz de atrair a esquerda? E a centro-esquerda? Porque de certa forma, no primeiro turno, os dois candidatos são bolsonaristas, um com bolsonarismo mais raiz e o outro também é bolsonarista. Então, quem vai ter a capacidade de falar, além da sua bolha, atrair outros eleitores, porque para ganhar o segundo turno você tem de ter voto que não teve no primeiro”, garante Ben-Hur.

Sobre quem pode sair vencedor desse embate, Ben-Hur argumenta que é preciso saber quem saberá dialogar e atrair mais apoio. Entretanto, ele reitera que é o eleitor quem decide e que o novo pelo novo traz prejuízos. “O caso do Bernal em Campo Grande foi um novo que acabou dando um grande desastre. Então, acho que agora as pessoas querem um novo, mas querem saber se esse novo tem conteúdo”, acena.

Em contrapartida, na corrida presidencial, a disputa entre Lula (PT) e Bolsonaro será mais. “Lula colocou seis milhões de votos na frente do Bolsonaro, mas o Bolsonaro está na máquina. Bolsonaro está anunciando mais gente no Auxílio Brasil e Auxílio Caminhoneiro, é uma coisa que um dia a democracia vai ter de ver, porque inegavelmente quem está na máquina consegue criar um clima. Acredito que Lula continua como favorito, mas eu não me surpreenderia se Bolsonaro conseguir reverter, acho que é uma eleição disputadíssima e não pode errar”, destaca.

O Estado: Quais diagnósticos se fazem dos resultados da eleição em MS?

Ben-Hur: O fato de um candidato que nunca disputou uma eleição ter chegado ao segundo turno, e o outro candidato que é deputado (estadual) no primeiro mandato e nunca disputou uma eleição majoritária, claramente mostra que há um sentimento de renovação em Mato Grosso do Sul, tanto é que o Eduardo Riedel (PSDB) se apresenta como um novo e preparado, e o Contar (PRTB) com o discurso de mudança, ou seja, por meio de pesquisas qualitativas e as urnas demonstraram que há um certo esgotamento de algumas lideranças no Estado. Cumpriram um papel importante, mas há um esgotamento de pessoas que disputaram várias vezes eleições e claramente o eleitor demonstrou que quer algo novo comandando MS.

O Estado: Por que muitos institutos de pesquisa não acertaram os candidatos que decidirão o governo?

Ben-Hur: Tem diversas coisas a serem colocadas. Primeiro, nós temos o problema de identificar o brasileiro, nós estamos há 12 anos sem o censo. Nós temos tido abstenção muito alta, acima dos 20%, é uma tendência porque o voto é obrigatório, mas muita gente não vai votar.

Nós temos uma confusão sobre os dados, muita gente decidiu no dia em que votaria, com a velocidade da informação as pessoas formavam opinião muito baseada na televisão, hoje, com as redes sociais e com a velocidade associada ao conhecimento em tempo real, tudo indica, não só no plano local, mas nacional, que muita gente decidiu no dia em quem votaria e os institutos não conseguiram captar. Para ser justo, só a boca de urna, do programa que eu faço parte, “Tribuna Livre” (Rádio Capital FM), que teve a boca de urna do Instituto Ranking, foi capaz de dizer, depois que o eleitor já tinha votado, os prováveis candidatos do segundo turno: colocou o Contar em primeiro e Eduardo Riedel e André Puccinelli (MDB) empatados; acabou o Riedel superando o André. Acredito que precisa ser revista a metodologia, mas não acredito em teoria conspiratória, até porque as pesquisas são um indicador e não prognóstico, elas indicam a tendência do eleitorado.

O Estado: Haverá caça às bruxas nas pesquisas eleitorais?

Ben-Hur: Acredito que não. Pesquisas eleitorais vão continuar sendo assim, as pessoas costumam falar o seguinte: quando o candidato deles está na frente, acreditam, quando está atrás, detonam. Agora, eu acho que tem de ter liberdade da pesquisa mesmo, cada um formar sua convicção, tem gente que vota em quem vai ganhar, tem gente que vota independente, mas olha, inclusive, as pesquisas influenciam, mas nem tanto assim. O candidato que liderava todas as pesquisas era o Puccinelli, nem por isso ele ganhou, ficando fora até do segundo turno; não dá pra gente tutelar o eleitor. Obviamente, se cobra seriedade das pesquisas, é importante averiguar institutos que se tornam cabo eleitoral de candidato, mas não perder a perspectiva de que, no limite, quem decide é o eleitor.

O Estado: Podemos concluir que houve uma onda de Bolsonaro em MS. Três deputados federais aumentando a bancada, mais uma senadora e dois candidatos ao governo?

Ben-Hur: O Bolsonaro mais uma vez mostrou força em Mato Grosso do Sul, acho que pode ser tratado como uma onda, como ocorreu em 2018. Agora, quando a gente analisa 2018, uma coisa é ganhar, outra coisa é governar. A onda bolsonarista se dissipou muito rápido no Estado, lembra: o PSL elegeu e sem assumir o mandato a senadora Soraya já tinha brigado com o suplente, ou seja, uma coisa é o discurso para ganhar, outra é para governar. Eu confesso que eu tenho curiosidade de saber no que se emenda essa direita sul-mato-grossense, porque eu a acho muito reativa, muito contra esquerda, mas ela trabalha muito seguindo as palavras de ordem, por exemplo, sou a favor da família, da propriedade, das armas, enfim isso é muito pouco para se constituir um programa que una o país.

Então, o desafio da direita em Mato Grosso do Sul é ter projeto de poder para o Estado? Quem vai ser a liderança? Qual vai ser o programa da direita sul-mato-grossense? Porque ela surfa muito na onda Bolsonaro e, insisto, isso dá voto, mas você tem de dizer a que veio, vejo muito pouco conteúdo programático.

O Estado: O presidente será fiel da balança para decidir o próximo governador?

Ben-Hur: Tem uma questão: existe a situação de um presidente que na última hora surpreendentemente declara apoio a um dos candidatos e é curioso, porque o partido do Bolsonaro integra a coligação do Riedel, que elegeu dois deputados do PL, ajudou a eleger uma senadora. O Riedel rapidamente se reposicionou e disse: “Por mim tudo bem, continuo apoiando o Bolsonaro”. Então, traz um desafio para o Capitão Contar, porque, se os dois apoiam o Bolsonaro, qual o diferencial entre eles? Então, o segundo turno é a capacidade de se falar fora da bolha, capacidade de atrair o centro, é bom lembrar que o Lula teve 39% dos votos no Estado. Quem vai ser capaz de atrair a esquerda? E a centro-esquerda? Porque, de certa forma no primeiro turno, os dois candidatos são bolsonaristas, um com bolsonarismo mais raiz e o outro também é bolsonarista. Então, quem vai ter a capacidade de falar, além da sua bolha, atrair outros eleitores, porque, para ganhar o segundo turno, você tem de ter voto que não teve no primeiro.

O Estado: Qual seria o maior desafio do eleito ao governo nos próximos quatro anos?

Ben-Hur: O maior desafio do futuro governador é que não vai poder reclamar de uma herança maldita. É curioso, porque o último ano do Reinaldo Azambuja é o melhor ano da gestão, inclusive, quando é mais bem avaliado, porque ele passou por recessão, Governo Dilma anos 2015 e 2016, pandemia, mas o fato é que ele fez um caixa muito grande, tem muitas obras, investimentos, salário estará em dia, falou que vai deixar recursos para obras iniciadas e não finalizadas, enfim. Quando você pega um governo, por exemplo, o Marquinhos Trad, sem tirar os méritos, mas o fato de que ele governou depois do Alcides Bernal, a cidade estava bem comprometida, então aparece mais o trabalho quando o antigo governante teve uma gestão fraca, não é o caso do Reinaldo, então o primeiro desafio é lidar com a herança bendita, como tudo indica. Outro desafio, desafios macros, então você ter um bom diálogo com a bancada federal, governador tem de ser pragmático, quem faz oposição são os partidos, ao governador, ganhe Lula ou Bolsonaro, ele tem de dialogar porque MS precisa de investimento federal, apressar a questão da Rota Bioceânica, sobre o desafio energético, mais recurso para capacitação de mão de obra.

O Estado: O PT também foi bem votado. Giselle Marques ao governo ficou à frente do Trad. Botelho no Senado em terceiro e dois deputados federais. São novas lideranças surgindo?

Ben-Hur: A esquerda em MS tem duas lideranças bem emergentes, Camila Jara, vereadora, única mulher eleita, agora deputada federal, então inegavelmente renova a esquerda. Porque, quando você for pensar na bancada do PT na Assembleia, ela fica mais forte com a presença do ex- -governador Zeca do PT, mas é uma bancada com uma certa caminhada já, são atores políticos que atuam muito tempo em Mato Grosso do Sul, Pedro Kemp e Amarildo Cruz.

A novidade é a votação da Giselle na casa dos 10%, uma boa votação, a votação da Camila e do Thiago, que sai muito forte, ele derrotou o Juiz Odilon e terminou próximo do Mandetta, se bem aproveitados eles podem renovar o pensamento de esquerda em MS.

O Estado: O Lula conseguirá manter a vantagem conquistada em nível nacional?

Ben-Hur: A eleição do segundo turno é muito polarizada, o Lula colocou seis milhões de votos na frente do Bolsonaro, mas o Bolsonaro está na máquina. Bolsonaro está anunciando mais gente no Auxílio Brasil e Auxílio Caminhoneiro, é uma coisa que um dia a democracia vai ter de ver, porque inegavelmente quem está na máquina consegue criar um clima. Eu não arriscaria um palpite, será muito disputada, o Lula tem um eleitor muito fiel, quase ganhou no primeiro turno, mas quase não ganhou, então está em aberto. Acredito que Lula continua como favorito, mas eu não me surpreenderia se Bolsonaro conseguir reverter, acho que é uma eleição disputadíssima e não pode errar. O debate agora será tête-à-tête.

O Estado: Espera-se eleição tanto a governo e como presidente decidida por uma margem pequena de votos?

Ben-Hur: A eleição presidencial acredito que sim. A estadual precisamos saber como vai ficar Rose, Marquinhos, André, a esquerda, quem tem capacidade de procurar os adversários, quem tem capacidade de falar: te ataquei, você me atacou, agora vamos zerar o jogo. Então, quem vai conseguir fazer mais política? E o eleitor vai decidir, porque o novo pelo novo pode trazer prejuízos. Então, acho que agora as pessoas querem um novo, mas querem saber se esse novo tem conteúdo.

Por Rafaela Alves – Jornal O Estado do MS.

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