Especialista ouvida pelo O Estado esclarece que Receita não rastreia transações e confirma manutenção das regras para 2026
Dúvidas sobre a relação entre pequenos prestadores de serviço e a Receita Federal voltaram a circular entre autônomos e microempreendedores após a disseminação de informações falsas que associam o uso do Pix a um suposto monitoramento fiscal a partir de 2026. Apesar da narrativa recorrente, não houve qualquer mudança normativa que altere a forma como as transações são tratadas pelo Fisco.
O Ministério da Fazenda, por meio da Receita Federal, desmentiu nesta segunda-feira (29), informações que circulam nas redes sociais e que afirmam que transações financeiras a partir de R$ 5 mil seriam taxadas.
“As fake news que estão circulando inventaram, desta vez, uma multa de 150% para quem não pagar o falso tributo”, destacou a Receita Federal em comunicado.A nota lembra que a Constituição Federal proíbe a tributação de movimentações financeiras. “Isso não existe e nunca irá existir nos termos da Constituição atual”, reforçou a Receita.
As informações falsas têm provocado efeitos práticos no cotidiano de trabalhadores informais. Em Campo Grande, parte dos prestadores passou a restringir o recebimento via Pix à modalidade vinculada a CNPJ, por acreditar que a pessoa física deixará de poder utilizar o sistema sem fiscalização direta. O comportamento, no entanto, não tem respaldo técnico nem jurídico.
Para esclarecer o tema, a reportagem do O Estado ouviu a especialista em BPO (Business Process Outsourcing) e terceirização de processos financeiros, Leise Bethencourt. Segundo ela, a Receita Federal não monitora transações individuais realizadas via Pix, tampouco acessa dados como valor, tipo de operação ou identificação do pagador e do recebedor. “Não existe rastreamento de Pix. As regras de compartilhamento de informações entre instituições financeiras e o Fisco permanecem exatamente as mesmas”, afirma.
A especialista explica que a Receita recebe dados consolidados apenas em situações específicas, como movimentações incompatíveis com a renda declarada, o que independe do meio de pagamento utilizado. “Não há distinção entre Pix, TED, DOC ou depósito. A Receita não acompanha operações individualizadas nem passa a fazer isso em 2026”, esclarece.
Apesar de o boato não ter fundamento, a recorrência da dúvida revela outra discussão relevante: quando a formalização da atividade passa a ser necessária ou vantajosa. Segundo Leise, o registro como MEI ou outra modalidade empresarial deve ser avaliado com base na habitualidade da atividade, no volume de receitas e nos objetivos do prestador. “A formalização oferece benefícios como emissão de notas fiscais, acesso a crédito, possibilidade de vender para empresas e ao poder público, além de maior segurança jurídica”, pontua.
Ela lembra que a Reforma Tributária trará mudanças operacionais, especialmente relacionadas à sistemática de créditos tributários e ao detalhamento das notas fiscais, o que exigirá maior organização contábil das empresas, inclusive as optantes pelo Simples Nacional. “São ajustes estruturais do sistema tributário, não mecanismos de vigilância sobre meios de pagamento”, observa.
Para quem atua de forma informal, a recomendação é cautela diante de informações não oficiais. “A decisão de migrar para CNPJ deve ser estratégica e planejada, nunca motivada por desinformação. A formalização precisa acompanhar o crescimento da atividade, não o medo”, destaca.
A Receita Federal em Mato Grosso do Sul informou à reportagem que as diretrizes sobre o sistema de informações financeiras são definidas em âmbito nacional e que não há alteração prevista nas regras relacionadas ao Pix ou ao monitoramento de transações para 2026.
Por Djeneffer Cordoba