Presidente da ACICG (Associação Comercial e Industrial de Campo Grande), disseca os reflexos e as perspectivas para o segmento diante da crise econômica provocada pela pandemia do novo coronavírus
O comércio de Campo Grande passou duas semanas de portas fechadas após determinação da prefeitura. No período, medidas de socorro – municipais, estaduais e federais – foram anunciadas, mas o clamor do empresariado foi pelo retorno às atividades. As restrições foram flexibilizadas, desde que adotadas medidas de biossegurança para evitar um desenfreado contágio pelo novo coronavírus.
Em entrevista exclusiva ao jornal O Estado, o presidente da ACICG (Associação Comercial e Industrial de Campo Grande), João Carlos Polidoro, avaliou o período de fechamento, explanou sobre a volta ao funcionamento e enumerou as demandas do ramo.
O Estado: Como o setor do comércio vem reagindo à pandemia?
João Carlos Polidoro: Os empresários estão trabalhando para que as empresas permaneçam abertas ou, pelo menos, com o funcionamento interno operando. Todos estamos buscando manter nossas empresas vivas, e tudo que se faz hoje é pensando no bem-estar dos consumidores, dos colaboradores e dos empresários para que, quando essa pandemia passar, nós possamos continuar contribuindo com a sociedade.
O Estado: Os comerciantes estão preparados para lidar com a série de restrições? Por que é preciso abrir o comércio?
João Carlos Polidoro: As empresas estão preparadas para receber seus clientes com segurança. Desde o início das discussões sobre o combate ao Covid-19 no Brasil, recomendamos que todas as empresas sigam as orientações da Organização Mundial da Saúde (OMS) e do Ministério da Saúde, como por exemplo, evitar aglomeração, fornecer Equipamentos de Proteção Individual (EPIs) aos colaboradores, disponibilizar e orientar sobre o uso de álcool 70 e, quando possível, lavatórios com água e sabão, manter o distanciamento recomendado entre as pessoas, redobrar a atenção com a higienização do ambiente, bem como, estar atento às determinações dos decretos da Prefeitura que regram os diversos setores que estão autorizados a abrir. O combate dessa doença é uma responsabilidade de todos nós, e cada um tem que fazer sua parte para evitar o contágio.
As empresas não querem estar abertas, mas elas precisam abrir para ter uma expectativa de sobreviver após a crise, para honrar seus compromissos, para manter seus funcionários e fazer a economia continuar girando.
O Estado: O consumidor terá que papel em uma possível virada da crise econômica?
João Carlos Polidoro: O consumidor é imprescindível para fazer a roda da economia girar. Não é somente o comércio que está se adaptando, mas o consumidor, também, está ajustando sua realidade ao cenário que estamos vivendo. Muitos estão segurando o dinheiro para pagar contas, e estão comprando apenas itens básicos, de primeira necessidade, porque não sabem como será o dia de amanhã, se estarão empregados. Um dos melhores indicadores de saudabilidade da economia é ter o consumidor comprando. Não sabemos quando a economia reagirá, mas temos convicção de que o consumidor continuará sendo peça fundamental nesse cenário.
O Estado: Que avaliação faz das medidas do governo federal, como liberação de linhas de crédito bancário e auxílio emergencial de R$ 600 aos autônomos e MEIs? São suficientes?
João Carlos Polidoro: Estamos vendo o Governo Federal fazendo sua parte, desonerando, e, principalmente, facilitando a vida do empresário, mantendo o dinheiro no caixa da empresa, e isso vai ser fundamental para que as empresas passem por esse período de crise. Nós precisamos também de uma resposta do Governo do Estado, nessa questão do ICMS, principalmente, e do município em relação ao ISS e IPTU. Precisamos de definições nesse horizonte para que mantenha o dinheiro circulando na economia, e deixe os caixas das empresas preparados para poderem continuar pagando as contas. Nesse momento, precisamos continuar pagando as contas, principalmente, a folha de pagamentos e os fornecedores, pois, sem eles, não teremos produtos para poder atender a população.
Sobre o auxílio aos autônomos, esse dinheiro vai colaborar, sim, porque esse setor é parte integrante da roda da economia, e se eles não tiverem recurso para consumir no comércio farão muita falta. O valor anunciado pelo governo é um recurso de ajuda, e não um valor para manter todos os gastos, mas é fundamental na nossa economia, principalmente, num momento em que as empresas não conseguem empregar, e o autônomo segue empreendendo. Assim, esse empreendedor precisa desse auxílio e é isso o que a gente espera que aconteça, que ele consiga receber o recurso, ir ao comércio e fazer frente às suas despesas.
O Estado: Os bancos poderiam ter uma parcela maior de contribuição?
João Carlos Polidoro: Os bancos podem contribuir mais, especialmente no que diz respeito à redução de juros para os empréstimos e a facilitação para que o crédito liberado pelo Governo Federal para as empresas cheguem até elas.
O Estado: Neste momento de prorrogação de prazos de vencimentos, porque manter as contas em dia se torna importante?
João Carlos Polidoro: Manter as contas em dia é importante para a roda da economia continuar girando, e para isso é fundamental que a empresa esteja funcionando para que ela possa honrar seus compromissos e comprar de seus fornecedores para continuar atendendo seu consumidor, para que não haja desabastecimento de suprimentos, ou seja, além de manter as contas em dia é preciso ter capital de giro, e é justamente esse capital de giro que está complicado de o micro e pequeno empreendedor ter acesso.
O Estado: Como manter os empregos no comércio e indústria?
João Carlos Polidoro: A desoneração das empresas é um passo fundamental para a manutenção dos empregos. A Reforma Tributária no Brasil nunca se fez tão necessária e urgente. A partir dessa desoneração as empresas ganharão um fôlego não somente para manter os empregos, mas para se reinventar, o que se tornou essencial no cenário atual.
O Estado: É possível pensar planejamentos de curto a médio prazo?
João Carlos Polidoro: É fundamental. Não adianta o empresário pensar que voltaremos ao cenário de dezembro de 2019, porque não vamos, esse é o “novo normal”. Os negócios não serão mais os mesmos, infelizmente, por tudo que estamos vivendo no mundo. Os cenários terão que ser reinventados. É necessário que o empresário use a racionalidade que sempre teve na operação seu negócio para manter a calma, fazer um planejamento de curto, médio e longo prazos, e atuar no curto prazo, porque isso vai fazer toda a diferença. Ainda assim, é necessário tomar muito cuidado com as ações a curto prazo porque elas podem mudar na semana seguinte, no dia seguinte, e aí a decisão já terá sido tomada. Então, reforço que é necessário ter muito cuidado e olhar para a frente, porque as decisões são determinantes a partir de agora, e precisam ser tomadas.
O Estado: Acredita que o comércio pode ser culpado por eventual aumento no número de casos de novo coronavírus em função da flexibilização das medidas restritivas em Campo Grande?
João Carlos Polidoro: O comércio está preparado para receber o consumidor com segurança, mas o combate da doença não depende apenas das empresas. O consumidor está orientado a sair o mínimo possível de casa, e o comércio está mobilizado para que, quando as pessoas precisarem comprar algo, se sintam em segurança, e repito, todos são responsáveis pelo combate do coronavírus, então o consumidor também precisa estar atento às recomendações da OMS e fazer sua parte.
O Estado: Como fica a questão tributária (ISS e ICMS) durante a crise?
João Carlos Polidoro: Esperamos ações dos governos Estadual e Municipal, e desejamos que sigam os passos do governo Federal, agindo com prudência e celeridade. O governo federal está trabalhando para desonerar as empresas, e esperamos que em Mato Grosso do Sul nossos governantes estejam alinhados com essas diretrizes.
O Estado: Qual a previsão mais otimista para saída da crise e volta da estabilidade?
João Carlos Polidoro: Uma pesquisa da Organização Mundial do Comércio afirmou na última quarta-feira (8) que o comércio global deve cair entre 13% e 32% por conta da COVID-19, e que a recuperação deve ocorrer em 2021. Mesmo na crise iniciada em 2014, Campo Grande caminhou acima das projeções nacionais, com inadimplência abaixo da média e consumo acima dos índices. Porém, não sabemos como será o comportamento da pandemia na nossa região. Caso Campo Grande siga a previsão do Ministério da Saúde para o Brasil, a partir de setembro as pessoas devem voltar a consumir, mas sabemos que as relações de consumo não serão mais como antes, essa é a nova realidade. Assim, dentro do atual contexto do “novo normal”, os cenários terão que ser reinventados. Orientamos que o empresário se prepare, que aproveite esse tempo em que ele está sendo forçado a pensar no seu negócio e repense. Existem oportunidades, o ambiente é difícil, mas o empresário não está sozinho. A Associação Comercial tem atuado diuturnamente para que as informações cheguem até os empresários, com tudo o que é preciso saber para manter seus negócios funcionando. É necessário buscar ajuda. Fale com a Associação Comercial, fale com entidades que podem ajudar, porque esse é o momento de nos unirmos para sair dessa crise. Não vai ser tão fácil, mas a gente vai sair dela.
(Texto: Jones Mário e Bruno Arce)