O Fraternidade Sem Fronteiras é um projeto que sensibiliza as pessoas para a prática de se doar ao próximo em razão de um bem maior. Uma história escrita por muitas mãos, que começou em Moçambique, na África, e desde então já acolheu 15 mil pessoas em seis países diferentes, com 45 polos de trabalho, mais de 700 jovens matriculados nas escolas e ofereceu 428 mil refeições. Ao contrário do que as pessoas pensam, o voluntariado acontece também em solo brasileiro. Em novembro, a Fraternidade completa dez anos de um trabalho social lindo e que acolhe pessoas de todo o mundo.
Em Mato Grosso do Sul, por exemplo, a instituição tem uma orquestra que atende jovens da periferia, onde eles ensinam música e desenvolvem um trabalho pedagógico. Além disso, a Fraternidade apoia a Clínica da Alma que atende cerca de trezentas pessoas, entre homens e mulheres, uma ação que cuida da reabilitação de dependentes químicos e alcoólicos. O projeto “MS Acolhe” trabalha com as famílias refugiadas que são interiorizadas para o Brasil.
A bancária Elaine Oshiro está há dois anos no projeto e é uma das voluntárias que acolhe as famílias de venezuelanos na Capital. “Eu resolvi acolher uma família venezuelana que é um os projetos da Fraternidade. Aí, começamos a montar um grupo de voluntários para apoiar o projeto, acolhendo essas famílias aqui em Campo Grande, nós ajudamos para conseguir emprego, e hoje todos eles estão em suas casas aqui. O que é motivo de mais orgulho para nós, é que grande parte deles é voluntário no grupo junto para acolher outros”, explica.
A corrente do bem só cresce e a maior alegria da bancária é poder fazer diferença na vida de quem passa fome. “Foi um encontro de mim mesma. Todo aquele vazio que eu sentia, aquela falta de alguma coisa, hoje eu sinto que preencheu, eu não preciso buscar mais nada. Quando você coloca amor e se envolve, aí você vê que isso transforma o seu mundo. Isso te aproxima de Deus”, comenta.
Giselle Saddi Tannous é advogada e voluntária há 4 anos. Ela já viajou duas vezes nas caravanas de Madagascar. Sempre envolvida com projetos sociais, entrar para o projeto foi uma maneira que ela encontrou de entender o mundo de quem passa fome e sede. “Eu precisava enfrentar coisas dentro de mim que eram difíceis, por exemplo, a questão da fome e da sede. Eu nunca tinha vivenciado a experiência que eu vivenciei na África. Um país que não tem água, que é o mínimo necessário para a sobrevivência das pessoas, e isso de alguma forma era para mim impensável, eu não conseguia imaginar essa realidade com os projetos que eu vivi aqui no Brasil. Nós acabamos compreendendo novos valores, percebendo que a nossa realidade é imensamente privilegiada. Coisas que as vezes eram grandes problemas na minha vida, deixaram de ser”, revela.
O empresário Paulo Melo foi o primeiro voluntário a apadrinhar uma criança, há dez anos, quando tudo começou. Atualmente, ele é diretor financeiro da instituição. Viajou uma vez para Moçambique, mas já foi o suficiente para viver experiências emocionantes. Em seu coração sempre existiu o desejo de ajudar o próximo. “Eu sempre tive um chamado e uma vontade interior de ser voluntário e quando a Fraternidade Sem Fronteiras apareceu na minha vida, parece que foi meio que atendendo um pedido meu de ser mais útil. Uma vez começando a trabalhar é apaixonante e você vai deixando um pouco mais dos seus negócios e vai se dedicando mais no projeto, nas ações e é uma coisa que só quem participa entende”, pontua.
Sueli Rebello é psicóloga e funcionaria pública. No mês que vem ela viaja para Madagascar pela oitava vez. Há dois anos como voluntária do projeto, hoje ela é coordenadora de logística da carava que vai para o país, um presente que recebeu após sua primeira ida a África, como tradutora.“Eu não largo a Fraternidade nunca mais. Eu passei a fazer uma reflexão, onde está a minha arrogância, a minha prepotência, a minha intolerância, a minha impaciência, a minha vaidade. É uma luta diária, eu tenho como referência agora, o que é de verdade ter dificuldade na vida?”.
Nathalia Rebello é bióloga e filha da Sueli, ela conheceu o Fraternidade através da mãe. A jovem está há um ano e um mês no projeto e fez sua primeira viagem para Madagascar no ano passado. Ver a alegria no rosto de sua mãe, fez com que ela sentisse vontade de fazer o bem. Como nos centros de acolhimentos ainda não existem funções destinadas para biólogos, Nathalia trabalhou auxiliando a dentista da caravana. “Quando minha mãe foi, ela me mandou um vídeo, de uma menininha cantando e eu me apaixonei por ela. Quando eu fui eu cheguei lá e abaixei perto dela, ela me pediu colo e não saiu do meu colo o dia todo”, completa.
Histórias que emocionam
“Nessa última caravana me marcou muito o encontro com um menininho que quando eu olhei, eu achava que ele tinha seis meses de vida. Depois eu fui saber que ele tinha mais de dois anos e ele estava tão faminto só tinha os ossos e os olhinhos. Nós pegamos uma luva de dentista, colocamos um pouquinho de leite dentro dela com água, eu fiz um furinho para dar para ele dentro da luva o leite, ele agarrou a luva, quase comendo a luva para tentar sugar aquilo. Em uma luta de vida muito grande. O que nós observamos nele era uma busca de sobrevivência e ao mesmo tempo uma entrega de afeto”. Giselle Saddi Tannous.
“Eu trouxe uma enfermeira que deixou os dois filhos e a mãe na Venezuela e veio sozinha para cá, passou fome em Boa Vista, dormiu na rua, mas ela saiu quando não tinha mais condições de ficar. O filho dela quase morreu porque não tinha medicamento no hospital. Ela veio para Campo Grande e eu e os meus filhos acompanhamos todo o processo, nós arrumamos uma casa e conseguimos trazer a família. Quando fomos receber eles no aeroporto, ver aquele encontro daquela mãe que ficou nove meses longe dos filhos, parecia que eu estava recebendo a minha família, parecia que eram os meus filhos. Aquela cena eu nunca mais vou esquecer”. Elaine Oshiro
“Eu sempre fui muito durona e aconteceu em uma das caravanas no ano passado, que nós fomos atender uma senhora que tinha acolhido uma criancinha que a mãe foi embora. A mãe teve gêmeos, foi embora com o menino e deixou a menina com a vizinha. Era umas seis da tarde e nós fomos chamados para atender elas. Chegamos na casinha, não tinha nada, tinha um pedaço de papelão e um pano velho jogado no canto e a criança estava ali e a vizinha estava na casa ao lado. Essa criança chorava muito e a administradora da época falou que na unidade tinha algumas coisas e que era para nós irmos buscar. A criança continuou chorando e veio no meu colo, e aquela coisa embala daqui, embala dali e a criança dormiu no meu colo. Pegaram banana, leite, pão e voltaram, aí quando chegaram a criança estava dormindo no meu colo, e eu precisava ir embora, a vizinha falou: pode por ela ai no chão, no canto! Aí eu não aguentei, como é que eu vou por um bebê dormindo no meu colo aconchegado no chão frio, sem nada? Foi a primeira vez que eu deixei os meus sentimentos tomar conta, eu chorei muito, eu pedia desculpa para o bebê, pedia perdão, eu não podia deixar aquele bebê, eu ia para por no chão, eu não conseguia colocar, aquilo me angustiou demais, eu pensei que podia ser minha filha, meu filho. Eu não sabia o que fazer, a menina acordou, isso me deu um alívio tão grande. De lá para cá eu virei chorona”. Sueli Rebello. (Bruna Marques)