Exclusiva! O Estado Online entrevista coordenadora da Subsecretaria de Estado de Políticas Públicas para as Mulheres

O caso Mariana Ferrer voltou a tona na última terça-feira (3). Ela acusou de estupro André de Camargo Aranha e, durante o julgamento, a influenciadora digital foi humilhada pelo advogado de defesa do réu. Ele mostrou fotos da jovem, feitas para trabalhos como modelo profissional, com o objetivo de atacá-la. Cláudio Gastão da Rosa Filho definiu as imagens como “ginecológicas” e disse que “jamais teria uma filha” do “nível” de Mariana.

O modo como a jovem foi tratada durante a audiência causou revolta. Muitos grupos fizeram protestos e manifestações. O jornal O Estado Online conversou com a Coordenadora de Ações Temáticas da Subsecretaria de Estado e Políticas Públicas para Mulheres, Rhaissa Siviero, sobre o tema que gerou grande comoção.

O Estado Online: O caso da influenciadora Mariana Ferrer reflete o que algumas mulheres sofrem quando buscam por ajuda?

Rhaissa Siviero: Infelizmente reflete, mas o nosso trabalho aqui é justamente para desconstruir esse mau atendimento e “revitimização” da mulher que sofre a violência. O papel da Subsecretaria é a formação e capacitação de servidores públicos pro atendimento de mulheres vítimas de violência. Isso é um trabalho que é feito constantemente através de cursos e capacitações. Mesmo durante a pandemia, nós continuamos fazendo esse trabalho de forma online. O caso da Mariana aconteceu em um Fórum, no judiciário, onde nós não temos tanto poder para intervir, mas reflete um pouco o que a mulheres têm passado quando buscam denunciar uma violação de direito ou violação sexual, como aconteceu com a Mariana. 

O Estado Online: Durante o julgamento do caso, o advogado de defesa exibiu fotos de Mariana para alegar que a relação foi consensual. Na sua concepção, por que ainda buscam culpar a vítima?

Rhaissa Siviero: Porque estamos em uma sociedade machista e temos que reconhecer isso. Até nós mulheres precisamos nos policiar com muitas atitudes, pois viemos de uma criação machista. Naquela cena [julgamento do caso de Mariana] fica muito claro isso. Eles estavam em um ambiente gravado, em uma audiência que é para ter todo respeito e guardar os direitos humanos da vítima, mas os quatro homens, principalmente, o advogado estavam muito à vontade, expondo, execrando a imagem dela. Isso reflete o pensamento de muito homens e da sociedade que é de julgar a vítima. O nosso trabalho aqui é justamente para desconstruir esse machismo e as pessoas terem um olhar mais empático e humano com a vítima. 

O Estado Online: Essa situação pode impedir outras mulheres de fazerem denúncias? 

Rhaissa Siviero: Infelizmente, pode! Eu acredito que com todo esse movimento que está acontecendo dos órgãos de segurança e justiça, entidades públicas e da sociedade, nós vamos ter respostas mais efetivas a partir de agora. A mídia tem um papel muito importante de pressionar para que tenha uma resposta e que esse caso não fique impune. É claro que se nós nos calarmos e não cobrarmos uma resposta que seja efetiva, algumas mulheres vão se sentir desencorajadas a buscar os órgãos de denúncia e não é o que queremos. Estamos aqui para marcar posição, lutar para que os direitos das mulheres sejam garantidos. 

O Estado Online: Fala-se muito sobre cultura do estupro. O que quer dizer esse termo e por que ainda está tão presente na sociedade?

Rhaissa Siviero: Vemos a cultura do estupro ainda muito arraigado na nossa sociedade através de musicas, expressões, julgamento das mulheres por conta da vestimenta que elas usam, como foi o caso da Mariana. Temos que desconstruir, porque são atitudes e ritos que são passados de geração em geração e as pessoas não contestam isso. Infelizmente aconteceu esse caso da Mariana, mas felizmente veio a tona para fazer com que possamos refletir como sociedade onde nós queremos chegar. Acredito que 2020 seja o ano para isso, para o ser humano colocar a mão na consciência e cada um de nós ser agente transformador e de se policiar. Vamos começar por aí a desconstruir essa cultura. 

O Estado Online: Após o absolvição do acusado de estuprar Mariana, foram realizados protestos na internet e até manifestações em várias partes do Brasil. Qual a importância da união das mulheres em casos como esse?

Rhaissa Siviero: É primordial e essencial, porque ouvimos muito que mulher não gosta de mulher, que mulher não consegue trabalhar com muitas mulheres, porque são muito competitivas. Vemos situações em que as mulheres são colocadas como inimigas e isso só faz com que percamos forças. Eu fico muito feliz em ver a união das mulheres, independente de ideologias ou religião. Qualquer uma de nós está sujeita a sofrer violência, é algo que não depende de raça, credo, posição social, ela está muito presente. Então, quando vemos a união das mulheres, percebemos que estamos no caminhão certo. A união das mulheres para mim é o primeiro passo. 

O Estado Online: Quais as ações que a Subsecretaria de Estado e Políticas Públicas para Mulheres realiza para o combate da violência e apoio desse vítimas?

Rhaissa Siviero: O enfrentamento à violência aqui na Subsecretaria é um eixo de trabalho que dedicamos mais de 90% do nosso tempo. Nesse período de pandemia, nós criamos um site (www.naosecale.ms.gov.br)  que é um canal de denúncia e com muita informação sobre todos os tipo de violência. Além disso, o Estado criou as “Salas Lilás” em municípios que não têm a Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher. São espaços dentro das delegacias comuns para atender mulheres e meninas vítimas de violência. O atendimento é humanizado e feito por mulheres. Nós temos essas salas em cidades, como Sidrolândia, Maracaju, Amambai e vamos inaugurar em Bonito. Em Campo Grande tem a Deam que é uma delegacia especializada inteira para atender mulheres e meninas. A polícia militar tem o programa “Mulher Segura” que é uma equipe dentro da PM responsável por fazer o acompanhamento e fiscalização do cumprimento das medidas protetivas. Na Capital temos, também, o Centro Especializado de Atendimento à Mulher (Ceam), órgão que faz atendimento psicossocial e outros acompanhamentos às mulheres vítimas de violência. Mato Grosso do Sul tem uma casa abrigo que fica em um local sigiloso e atende mulheres de todo Estado que estão em risco de vida decorrente da violência que sofreram. Também foi disponibilizado um aplicativo que chama “MS Digital”, lá tem uma aba onde a mulher é direcionada para denúncias e informações sobre o que é violência. Além disso, a polícia civil lançou  a denúncia online no site da delegacia virtual. 

O Estado Online: Qual a orientação para a mulher que se torna vítima de violência?

Rhaissa Siviero: No caso de estupro, a gente aconselha que ela busque o sistema de saúde, porque dessa violência pode decorrer outras coisas, como infecções sexualmente transmissíveis (IST) ou uma gravide Caso essa moça não busque o sistema de saúde e acabe desenvolvendo uma gravidez indesejada decorrente do estupro, o hospital de referencia em Mato Grosso do Sul é o Hospital Universitário. A partir disso, ela deve buscar a delegacia para fazer a denúncia. Já no caso de violência doméstica, que também existe a violência sexual, a delegacia é o primeiro local que a mulher deve procurar. 

Serviço

Centro Especializado de Atendimento à Mulher – Rua Pedro Celestino, 437 – Telefone: 0800 067 1236 / (067) 3361-7519 / (067) 99160-5166

Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher – Avenida Brasília, s/n – Jardim Imá – Telefone: (067) 2020-1300 / (067) 2020-1319

Telefones para denúncias 

180 – Central de Atendimento à Mulher do Governo Federal (para casos que não são de emergência)

190 – Polícia Militar

(Texto: Mariana Ostemberg)

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