Mato Grosso do Sul vive cenário de pária no esporte nacional

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No dia da criação de Mato Grosso do Sul, o Cuiabá recebe o São Paulo, em Mato Grosso, pelo Brasileiro

Primeiro de março de 1978, quase cinco meses após a divisão de Mato Grosso que resultou na criação de Mato Grosso… do Sul, ainda sob a ditadura militar do Governo Geisel, poderia ser um bom ponto de partida para o novo estado também ser destaque no esporte brasileiro.

Naquela data, o Operário ganhou de 1 a 0 do São Paulo, diante de 20 mil pagantes, no estádio Morenão. O resultado não foi suficiente para o Galo de Campo Grande, comandado por Carlos Castilho, ir à final, pois o Alvinegro foi derrotado no jogo da ida, no Morumbi, por 3 a 0, com gols de Serginho Chulapa e Neca. Mesmo assim, o sentimento de orgulho aos recém sul-mato-grossenses era visível.

Naquele duelo, em Campo Grande, os mais antigos saberão a escalação operariana: Manga; Paulinho, Silva, Biluca e Da Silva; Edison, Marinho e Roberto César (Cuca); Tadeu (autor do gol) , Everaldo e Peri.

Porém, o futebol, assim como o esporte sul-mato-grossense em geral, parou no tempo, e hoje está à margem do que acontece na elite do futebol e do desporto de alto rendimento.

Sinal dos tempos, o São Paulo joga nesta segunda-feira, 11 de outubro – não é feriado em Mato Grosso, por motivos óbvios –, pelo Campeonato Brasileiro da Série A. Na Arena Pantanal, os mato-grossenses verão o Cuiabá receber o Tricolor Paulista, às 19h. Enquanto isso, desde o fim da década de 1980, quando houve uma reformulação que enxugou a primeira divisão do futebol nacional, Mato Grosso do Sul jamais conseguiu lugar permanente na elite.

Pior, os representantes do Estado sequer passaram uma vez da Série D, a quarta e última divisão do Brasileiro. Só para lembrar, antes do Cuiabá, os vizinhos tiveram a Luverdense na Série B, entre 2014 e 2016. E, neste ano, pela Série D, em que Aquidauanense e Águia Negra apenas foram figurantes e sequer passaram da primeira fase, o União Rondonópolis chegou até as oitavas de final, e ficou a uma fase do acesso para a Série C.

Em entrevistas concedidas neste ano, dirigentes do Águia Negra e do Aquidauanense culparam a falta de investimento privado e público pelo mau desempenho. Desde o começo do anos 2000, o governo estadual praticamente banca o campeonato sul-mato-grossense. Com repasse que sempre gira na casa de R$ 1 milhão, ajuda os times “profissionais” com despesas de viagem, hospedagem, além de auxiliar a federação de futebol, administrada por pelo menos 24 anos pelo presidente Francisco Cezário. O dirigente não atendeu aos contatos da reportagem.

Com disparidade, rivalidade passou

À reportagem, o vice-presidente do Cuiabá falou brevemente sobre a situação do futebol de Mato Grosso do Sul. “Eu não posso falar muito até porque não conheço a realidade de vocês a fundo. Conheço os times, os clubes, mas não sei o porquê do futebol [em Mato Grosso do Sul]não evoluir também. A questão de rivalidade, talvez, é uma coisa que ficou no passado. Há muitos anos acho que já não existe mais isso”, disse Cristiano Dresch, em fevereiro deste ano a O Estado.

Em abril, o jornalista dos canais Globo Paulo Vinicius Coelho sugeriu o óbvio, mas que aos cartolas locais parece um desafio: trabalho duro.

“A única saída é trabalho, as pessoas no Brasil não acreditam nisso, mas é a realidade. Até 86 os estados indicavam seus representantes de acordo com o ranking, então Mato Grosso do Sul tinha o campeão estadual, igual todos os estados que iam para o Nacional. A partir de 88 você precisava ter um fortalecimento de todos os campeonatos estaduais ou um fortalecimento do Campeonato Brasileiro. O campeonato nacional se fortaleceu e os regionais perderam a força”, falou PVC, em abril deste ano a O Estado. Este trecho fez parte de uma série de reportagens feitas por O Estado sobre a situação do futebol sul-mato-grossense.

Modalidades vivem de sucessos pontuais

Nas demais modalidades, a realidade é ainda pior. Dependentes da verba pública, tanto do governo como dos municípios, principalmente no caso do interior, os esportes coletivos praticamente inexistem no cenário nacional.

O sucesso, quando acontece, é pontual. Exemplos como o voleibol, com a Copagaz na década de 80, e depois com a AVP, que jogou a Superliga B em 2017. No futsal, a SEI (Sociedade Esportiva Independente) jogou a Liga Nacional no começo dos anos 2000, porém o projeto não vingou. Mesma situação do basquete, que em 2002, com o Dom Bosco, terminou o Brasileiro Feminino em quinto lugar, a uma posição das semifinais, dominadas por clubes paulistas.

A necessidade de alto investimento parece afastar os investidores. No vôlei de alto nível, a estimativa é a de que para manter uma equipe competitiva o valor gire em torno de R$ 1 milhão, entre elenco, comissão técnica e outros fatores.

Restou nos últimos anos a prioridade em tentar trazer grandes eventos. Para isso, reformas na pista de atletismo do Parque Ayrton Senna, e do ginásio Guanandizão, foram feitas de olho em competições nacionais que possam fomentar a economia local de maneira mais imediata. Talvez espelho do que acontece na maioria dos estados, planejamento a longo prazo parece estar fora de questão para gestores esportivos, iniciativa privada e poderes públicos.

Entretanto, em Mato Grosso do Sul, a situação parece ser mais grave. Sem um time para chamar de seu, os clubes de fora seguem dominantes em seu poder de atração. Assim, resta nos orgulhar dos que fazem sucesso fora do Estado, como o goleiro João Paulo, no Santos, Ferreirinha, no Grêmio, Lucas Leiva, no futebol europeu, Arthur, Victoria, Saymon no vôlei de praia, Patrícia Sochor e Bruna Benites, no futebol feminino. A lista é extensa e promete seguir extensa por anos e anos.

(Texto: Luciano Shakihama)

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