“Temos de se reinventar”, segundo Renato Paniago, novo presidente da Associação Comercial de Campo Grande, é difícil prever o que vai acontecer, mas entidade tem planejamento para encontrar saídas
Aos 44 anos, Renato Paniago é o mais novo presidente da Associação Comercial e Industrial de Campo Grande. Proprietário da Catwork, empresa de desenvolvimento de softwares no segmento de agropecuária, ele fazia parte da diretoria nos cargos de Conselho de Jovens Empresários e do SCPC (Serviço Central de Proteção ao Crédito), além de ser representante no Codecon (Conselho Municipal de Desenvolvimento Econômico de Campo Grande) e na Junta Comercial de Mato Grosso do Sul, na gestão anterior. É com entusiasmo que assume o cargo de uma das maiores entidades representativas do Centro-Oeste, com mais de 8 mil associados, e para encarar um período desafiador em razão do impacto do coronavírus. “Nós do comércio nunca vivemos uma situação semelhante como a de hoje. É uma mudança de comportamento, que envolve a sociedade e o comerciante”, define. A Associação Comercial tem levado assistência aos microempresários e usado a sua representatividade perante os órgãos públicos na questão de manter a economia ativa. Paniago acredita que o cenário fará muitas empresas serem reinventadas e que as vendas on-line ou o uso de delivery (entrega em domicílio) serão caminhos naturais a serem percorridos. Ele lamentou a dificuldade do acesso a linhas de crédito do governo federal, na ajuda para manter os empregos, e faz projeção de mais empresas sendo fechadas até o mês de agosto.
O Estado: Você assume a missão de comandar a ACICG em momento conturbado da economia e terá pouco tempo para se habituar ao cargo. Como é “pegar esse bonde andando”?
Paniago: Nós do comércio nunca vivemos uma situação semelhante como a de hoje. É uma mudança de comportamento, que envolve a sociedade e o comerciante. E não caberia a ninguém se preparar para isso. Até o momento é difícil prever o que vai acontecer daqui para diante, o que temos é uma ideia de planejamento; na Associação Comercial vamos continuar o trabalho. Eu já fazia parte da diretoria e estive presente nas principais ações dos últimos anos. Temos hoje 8 mil empresas filiadas, se não é a maior, é uma das maiores entidades que representam o comércio na Região Centro-Oeste. O desafio é grande. Chegou a minha vez de ser o gestor da casa durante os próximos três anos. Meu objetivo é dar continuidade ao trabalho e fazer as mudanças necessárias principalmente neste período tão difícil de pandemia. Dando apoio às empresas principalmente no antes e depois. Porque, neste período de retomada, muitas empresas vão sentir. O impacto econômico será medido ainda nos próximos meses, vai até agosto. Lá na frente é que teremos a noção do tamanho da crise. Há muitas empresas fechando, já existiam diversos comerciantes enfrentando situação financeira difícil e, para piorar, não estão tendo apoio das instituições públicas e privadas (os bancos). Há relatos de semanas e semanas de espera para liberação de linhas de crédito, e o empresário que está na ponta é que vem sofrendo.
O Estado: Existe um balanço de quantas empresas fechadas…
Paniago: Não. Porque se encontra tudo parado. Estamos sem poder consultar a Junta Comercial, por exemplo, pois ninguém está comunicando o fechamento de empresas. O que a gente sabe é em cima de uma amostra da atual situação. Ela foi feita por meio de levantamento da associação. Ocorre periodicamente, ouvindo o associado quase 24 horas. Temos canais de comunicação da entidade, e estamos ligando a todos os associados, para levantar informações das empresas. Há também questionários sendo enviados por telefone para preenchimento. Todo o trabalho que está sendo feito é de oferecer apoio. A associação estar ali para ajudar, usar toda a sua representatividade. Na Prefeitura de Campo Grande fazemos parte do Comitê de Crise e estamos em contato com o governo. A maioria é formada por pequenos empresários, que juntos são responsáveis por 60% da geração de empregos.
O Estado: Nessa amostragem, o que vem sendo revelado?
Paniago: O que tem ocorrido é muitas empresas parando de funcionar. Os pequenos empreendedores ficando sem renda. Um exemplo é o salão de beleza, os primeiros 15 dias são usados para pagar as despesas (água, luz e aluguel). Porém, com a pandemia não houve trabalho. Mas essa amostragem também levantou situações de oportunidades. Há empresários que entenderam a mudança de comportamento e conseguiram crescimento em receita, com as vendas on-line ou o uso de delivery (entrega em domicílio). Chegando ao ponto de quando retornar da pandemia levantar a dúvida sobre se vai manter o ponto comercial. Nesta altura está todo mundo se reinventando. Mas isso varia de empreendedor a empreendedor. Mas, se falarmos de saldo total, o maior é de fechamento de empresas. Quando uma empresa fecha a porta não é o empresário falindo, é uma série de colaboradores e famílias que deixam de ter receita. Quando uma empresa demite, uma série de postos de trabalho que são desfeitos. É complicado. O empresário carrega uma responsabilidade muito grande perante a sociedade. Os órgãos públicos e a própria população precisam olhar com mais atenção aos empresários e tentar ajudá-los. A Associação Comercial vem buscando dar este apoio; todas as empresas que reabriram são orientadas a seguir um protocolo de biossegurança. Hoje, quando se entra em um restaurante não se pode mais servi-lo, há limitação de pessoas em estabelecimentos, há necessidade do uso de máscaras, luvas e álcool gel para atendimento. Temos de se reinventar. Muitos questionam se, quando a pandemia passar, vão acabar as medidas? Eu vejo ao contrário, irá apenas diminuir. Este aumento de vendas on-line ou delivery vai ter uma queda, mas não vai voltar ao patamar do que era antes da pandemia. Porque mudou o comportamento das pessoas.
O Estado: A pandemia pode não ser passageira…
Paniago: O que eu vejo é que muitas coisas vão ficar… Uma seria esta preocupação de evitar aglomerações, e as medidas de higiene pessoal serão certamente mantidas.
O Estado: Está havendo adesão do empresário à Medida Provisória nº 936 do governo federal, que tenta preservar os empregos com redução de jornada de trabalho?
Paniago: Empresas tentando ter acesso e bancos nem sabendo operar. Empresas que conseguiram o benefício à folha, mas com muita dificuldade de ter o crédito. Ao crédito há uma dificuldade muito grande… Muitos esbarram na burocracia. O critério do banco não é ajudar o empresário que está bem. No Brasil, os empresários que estão bem são poucos. A grande maioria está em uma situação ruim, não é que o negócio não dá dinheiro, mas sim pelo momento. É uma fase, é um período de transição, se trata às vezes de um investimento a longo prazo. E os bancos não estão atendendo. Recentemente foi publicada uma nova Medida Provisória 958, que trata de isenção de certidões. Uma série de exigências que deixaram de valer. A gente acredita que pode facilitar a vida do empresário.
O Estado: Que medidas o município e o governo podem destacar em socorro às empresas?
Paniago: O município esteve aberto ao diálogo. Com a nossa participação no Comitê de Crise, apoiamos a prefeitura no protocolo de biossegurança a encontrar caminhos. Que não seja nem liberar geral e muito menos fechar tudo, que leva ao caos na economia. Iniciamos uma campanha de entrega de cestas básicas porque estamos tendo microempresários acionando associados porque estão na linha de fome. Dificuldade muito grande de comprar alimento. São pessoas que não possuem uma reserva. Trabalham para sobreviver. E o município passou a liberar os setores exigindo que cumpram os protocolos de segurança e o governo federal está apresentando medidas rápidas. O problema é até chegar à ponta, onde precisa da ajuda dos estados e municípios.
O Estado: João Carlos Polidoro esteve à frente da ACICG por dois mandatos e hoje é seu vice-presidente. Não houve chapa de oposição no pleito. Quão harmoniosa é a direção da entidade atualmente e em que isso contribui?
Paniago: Fazemos parte do mesmo grupo. Estou na associação desde 2009. Resolvi entrar na entidade para que ela seja sustentável, represente de fato o associado. Na qual objetivo o que nela existe. Quero passar por este período na presidência. Tenho o desafio do meu negócio, há fases a serem construídas, mas, ao mesmo tempo, meu nome foi aprovado pela chapa. Topei porque somos um grupo. Trabalhamos em conjunto. A entidade antes era conduzida pelo Polidoro, mas por trás existe uns 40 diretores atuando. Tudo bem distribuído e compartilhado. E quando é feito o trabalho em diversas mãos e tendo o mesmo objetivo, a associação cresce. Hoje, nós somos uma das maiores do país. São 8 mil associados. Repito, o meu grande desafio é dar continuidade ao trabalho, manter este grupo de trabalho.
O Estado: Que características de seu perfil como empresário pretende levar à gestão da ACICG? Você é o mais novo entre os presidentes.
Paniago: Muito do meu trabalho já está na Associação Comercial, pelo tempo em que já faço parte da diretoria. Muita tecnologia, informação, processos, serviços e ferramentas. Tentar entender esta mudança de comportamento. Trazer novas soluções. Antes a associação não tinha consultoria on-line, hoje já prestamos vários serviços. Teremos de reinventar alguns projetos como Atendimento Itinerante, para evitar aglomeração. Haverá de existir um período de transição depois da pandemia. Eu sou da área de tecnologia, possuo uma empresa de software. Tenho mais de dez anos de mercado. Chegou a hora de assumir a associação. Defendo a alternância no poder. Polidoro já ficou duas gestões, o estatuto também não permite mais um mandato. Mudamos para evitar esta situação e não repetir os erros do passado.
O Estado: Estar à frente de uma entidade de classe é diferente de comandar uma empresa. O lado político do cargo, com diálogos e negociações junto ao Poder Público, exige bastante. Como pretende lidar com isso?
Paniago: Eu não sou muito de fazer lobby. Me vejo como uma pessoa mais técnica. A entidade é política. E a política é importante no reordenamento da sociedade, então vou optar pelo certo. Buscar resultados; a associação sempre foi uma entidade que depende do próprio recurso. E há uma imagem a zelar. Quando a Associação Comercial se posiciona, a sociedade sempre dá ouvidos. São anos de trabalho e transparência.
(Texto: Jones Mário e Bruno Arce)