Durante a audiência pública sobre o caso Sophia, realizada na manhã desta quarta-feira (15), na Câmara de Vereadores de Campo Grande, com o objetivo discutir a rede de proteção das crianças e adolescentes em situação de risco, o microfone de uma das palestrantes foi cortado.
Neila Mendes, falou pelo Conselho Estadual de Defesa da Pessoa Humana e outros órgãos. No momento em que estava lendo sobre detalhes do caso seu microfone foi cortado e sua fala foi interrompida. “O Conselho Estadual de Direitos da Pessoa Humana, o Fórum Permanente pela vida de Mulheres e Meninas de Mato Grosso do Sul com apoio da Associação Brasileira de Apoio a Mulheres de Carreira Jurídica de MS, depois de diversas reuniões, inclusive com o pai da criança, usando a cronologia dos fatos, vem estabelecer, as chances perdidas de manter viva e saudável a criança Sophia”.
Em seu discurso, ela ainda enfatizou que “Não é nossa pretensão criminalizar nenhum órgão ou pessoa, porém é necessário que os órgãos que falharam, estabeleçam protocolos internos para que tais situações deixem de ocorrer”, mas mesmo assim não conseguiu concluir a fala, o que provocou indignação nos presentes da audiênica.
O estudante Paulo Phelipe Brandão de Oliveira, 16 anos, se manifestou ativamente após a interrupção, e foi retirado de dentro do plenário. Há três anos militando a favor da cauda da criança e do adolescente, ele culpa os poderes Executivo, Legislativo e Judiciário pela falta de ações no caso.
“Isso daqui se um dia for audiência pública eu não sou humano, sou um animal. Eles não estão usando isso aqui como audiência pública nunca, isso é uma audiência para a prefeitura, estão tentando burlar [a lei] e não punir, porque eu afirmo: o que deve ser feito os poderes executivo, legislativo e judiciário é uma punição. Não é um simples caso, é uma criança morta e estuprada. Tem que pegar o advogado e o juiz e perguntar porque arquivou o caso Sophia, porque a UPA não levou essa criança, sendo que está no Estatuto da Criança e do Adolescente?”, disse.
O jovem ainda expôs diversos casos semelhantes ao de Sophia, que ocorreram no ano de 2023. “No dia 21 de janeiro de 2023, uma jovem de 14 foi estuprada pelo ex-namorado; 10 de fevereiro de 2023 uma criança de dois anos entra na UPA (Unidade de Pronto Atendimento) com dores nas partes íntimas e a enfermeira descobre o estupro”, relatou muito emotivo.
Para ele, o caso de Sophia traz luz a falta de políticas públicas da Capital voltadas para o cuidado e bem-estar das crianças e adolescentes.
“Eles mataram a criança por um preconceito deles, eles mataram essa criança. As crianças em Campo Grande não tem escola, não tem Ceinf, nove mil crianças esperando vaga. Teoricamente esse microfone vai ser usado para falar o que todos já sabem, e o que era para ter sido falado eles não vão dizer, não vão culpar o poder executivo, legislativo e judiciário. Isso vai passar de uma audiência balela, quinta-feira tem outra audiência e eles vão discutir Lei de Diretrizes Orçamentárias, vão votar e você que teve uma filha estuprada que se lasque”
“Eu tenho aqui comigo provas de quantos Conselhos Tutelares deveriam ter em Campo Grande. Deveriam ser nove mas só existem três. Eles estão usando a audiência pública como instrumento, porque ano que vem tem eleição novamente”.
Paulo finaliza dizendo que o momento é de luta. “Agora é a hora da gente bater e falar, e se eles não querem escutar que larguem o cargo, se não querem trabalhar por uma causa verdadeira que deixem o cargo”.
Caso Sophia
No dia 26 de janeiro, Sophia de Jesus Ocampo, foi agredida até a morte pelo padrasto, Christian Campoçano Leitheim, com o conhecimento da genitora Stephanie de Jesus da Silva. Ela morreu após sofrer um traumatismo raquimedular na coluna cervical e só foi levada a UPA (Unidade de Pronto Atendimento) do bairro Coronel Antonino oito horas após o óbito. No laudo necroscópico também foi constatado que houve “violência sexual não recente”.
Christian e Stephanie foram presos em flagrante e tiveram a prisão convertida em preventiva após passar por audiência de custódia em 28 de janeiro, mesmo dia em que foram encaminhados para os presídios.
A criança já teria mais de 30 passagens por unidades de saúde da Capital. O pai da menina já havia inclusive registrado dois boletins de ocorrência, após notar marcas, hematomas pelo corpo da menina e em determinada situação com uma fratura na perna. Ele indicou como testemunha a avó materna da criança.
O primeiro foi arquivado por falta de provas. Conforme nota do MPMS, foi registrado, em janeiro de 2022, um TCO (Termo Circunstanciado de Ocorrência) por maus-tratos, na 10ª Vara do Juizado Especial Central e, na época, foram ouvidas pela Polícia Civil: a avó e a mãe da criança, que relataram não ter havido maus-tratos e que não havia interesse no procedimento criminal.
O casal são pais de um bebê, o qual será investigado se ele também sofre agressões, e o homem tem ainda um filho de 5 anos de outro relacionamento, mas que vivia com o casal. Ele deverá ser ouvido em depoimento especial para constatar se também sofria abusos e agressões.
Serviço:
Disque 180
O Disque-Denúncia, criado pela Secretaria de Políticas para Mulheres (SPM), permite denunciar de forma anônima e gratuita, disponível 24 horas, em todo o país. Os casos recebidos pela central chegam ao Ministério Público.
Disque 100
Para casos de violações de direitos humanos, o Disque 100 é um dos meios mais conhecidos. Aliás, as denúncias podem ser feitas de forma anônima para casos de violações de direitos humanos.
O canal envia o assunto aos órgãos competentes no município de origem da criança ou do adolescente.
Com informações das repórteres Lethycia Anjos, Mylena Fraiha e Carlos Eduardo Ribeiro.
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