Por Rayani Santa Cruz [Jornal O Estado]
Pré-candidata diz do orgulho de substituir o ex-governador na campanha deste ano; ressalta em ser mulher e a mais jovem no quadro petista
Giselle Marques assumiu a candidatura do PT após a maior liderança do partido em Mato Grosso do Sul, Zeca do PT, desistir de concorrer ao governo. A advogada tem percorrido o interior e participado de reuniões partidárias para consolidar o nome entre os militantes. A petista diz se sentir à vontade para disputar a eleição de 2022, pois outros pré-candidatos querem contar com apoio do presidente Jair Bolsonaro e sua proposta é inversa.
“A maneira como foi gerenciada a pandemia no Brasil, com a negação da ciência, com dúvidas sobre a vacina, o número de pessoas que se contaminaram e que morreram após a vacina, fala por si própria. E defendendo o projeto da vida, da sustentabilidade, e o projeto de acreditar na ciência tem só o meu palanque. Por isso estou muito à vontade e tenho a convicção de que os eleitores farão essa leitura”, diz Giselle ao podcast Entrevistando do Estado Play.
Para a pré-candidata, o PT chega às eleições em melhor momento onde a população reconhece as políticas públicas do partido por ter já governado Mato Grosso do Sul e com força que traz a candidatura de Lula à Presidência.
“E se você for pensar, na eleição de 2018, que foi no pior momento que o PT enfrentava, no auge da Lava Jato, o Humberto Amaducci teve quase 11% dos votos. Agora, nesse quadro pulverizado que temos, quem tiver perto dos 20% vai estar no segundo turno. As pesquisas aqui apontam o Lula com mais de 30%. se nós conseguirmos capitalizar esses votos do Lula para nossa chapa, vamos eleger o Lula e caminhar para o segundo turno. Estou muito confiante porque, do ponto de vista numérico, estamos confortáveis e do ponto de vista político, temos o melhor projeto”, defende.
Giselle é advogada e concorreu às eleições para a presidência da OAB/MS (Ordem dos Advogados do Brasil, Seccional MS) ano passado, terminando na terceira colocação, com 397 votos.
O Estado: Sendo o nome lançado pelo PT para disputar o governo de MS, como vê dentro do partido os grupos que defendem aliança com o PSDB?
Giselle: Eu não vejo nenhum grupo do partido defendendo aliança com o PSDB. Vejo pessoas avaliando possibilidades de caminhar com o PSD, com o PSB e com o MDB. Mas com o PSDB, desconheço e não vejo nenhuma tendência, corrente ou grupo partidário defendendo isso. Até porque existe um veto nacional e a direção nacional já definiu que com o PSDB nós não caminharemos.
Acredito muito na aliança que estamos construindo neste momento que é a federação com o PC do B e PV e parcerias com o PSOL, e a Rede. Estamos bem adiantados com esses partidos e devemos caminhar juntos aqui em Mato Grosso do Sul.
Além disso, temos no PDT muitas pessoas que militavam conosco junto ao Partido dos Trabalhadores, e teve essa questão da intervenção deles. Então, estamos buscando também essas pessoas e acredito que teremos muitas dessas pessoas caminhando conosco.
O Estado: O que diz sobre possível aliança com o PSD?
Giselle: Sobre o Alckimin e o PSD, a gente avalia que o Brasil está numa encruzilhada civilizatória. De um lado, nós temos aqueles que defendem a democracia e a civilização, e de outros aqueles que defendem a barbárie. E para que a gente possa vencer o projeto da barbárie, da morte, da defesa dos agrotóxicos, esse projeto de “desinvestimento” em setores como a saúde e educação, e recursos humanos; e para que a gente possa enfrentar isso tudo, precisamos de apoios.
O PT tem esta missão, e neste sentido vejo que a parceria com o Alckmin é benéfica. Ele traz o empresariado da região de São Paulo e entendo que foi necessário. Estamos vivendo um momento em que são necessárias alianças em favor da defesa do Estado Democrático de Direito.
Nós temos uma tendência dentro do PT, que não vê com bons olhos essa aliança com o Alckmin, mas o Lula tem dito que, se for para a gente se aliar só com quem não patrocinou o golpe contra a Dilma [Roussef], nós não vamos ganhar as eleições. Por isso temos de ampliar.
O Estado: O PT conseguiu ser o terceiro mais votado para a Prefeitura de Campo Grande, nas eleições de 2020, quando o deputado Pedro Kemp foi candidato. Não seria ideal compor a chapa majoritária com políticos como os deputados Vander Loubet, o próprio Kemp e Amarildo Cruz?
Giselle: Interessante. O Partido dos Trabalhadores é muito aberto a novas lideranças. Prova disso é que, depois de oito anos do Governo Lula, em que ele estava com 84% de aprovação quando deixou o governo, ele poderia ter deixado essa vaga para alguém que tinha experiência política, ou ocupado o Senado e a Câmara, no entanto ele convidou a Dilma. Ela nunca havia sido eleita para vereadora, deputada, prefeita ou governadora.
Então, é uma característica do PT apostar em novas lideranças e que não estão na política de forma tradicional, como é o meu caso. Eu venho em uma atitude ousada do PT de convidar uma mulher, e uma pessoa que não tem amarras com grupos políticos e uma trajetória dentro dessa política tradicional.
Então, eu tenho muita alegria de ter o apoio de todos eles: do Pedro Kemp, do Amarildo, do Vander. E eles têm sido parceiros atuantes no sentido de levar as nossas propostas e o nosso projeto. Eu acredito que, assim como o PT teve a ousadia de eleger a primeira presidente mulher de toda a história do Brasil, teremos também a oportunidade de fazer a primeira mulher governadora de Mato Grosso do Sul.
O Estado: Qual o tamanho do impacto da desistência de Zeca do PT na disputa do cargo?
Giselle: Nós gostaríamos muito de ter o Zeca como candidato ao governo de Mato Grosso do Sul. Inclusive, eu falei para ele que, se resolver as questões legais e jurídicas que o impedem de disputar, eu recorro para ele ser o candidato. Mas ele disse que a questão da candidatura a governador é irreversível e irrevogável. Ainda que ele resolva essa questão jurídica, ele não vem candidato a governador.
Eu tenho muita honra de ter caminhado com o Zeca, onde fui gestora pública dentro do governo após convidada. Fui chefe de licenciamento ambiental do antigo Imape que agora é o Imasul; eu era responsável pela aprovação das licenças ambientais no Estado e também fui superintendente da Procon-MS.
Tenho muito orgulho dessa caminhada com ele. Tenho sentido uma espécie de aprovação das pessoas em dizer que a “a Giselle é a sucessora do Zeca… a Giselle tem o espólio político do Zeca”. Vejo que esse impacto tem sido minimizado pelo fato de nós termos uma mulher, uma pessoa mais jovem para conduzir os destinos do nosso Estado.
O Estado: A senhora tem cumprido agendas pelo interior do Estado. O objetivo é tornar seu nome mais conhecido?
Giselle: Sim. Sou bastante conhecida na Capital, onde participo de bastante movimentos sociais. Fui presidente de defesa dos direitos humanos Marçal de Souza, participei de várias comissões da OAB/MS (Ordem dos Advogados do Brasil, Seccional MS), por último da de meio ambiente. Fui conselheira estadual da Ordem, fui secretária e na última eleição fui candidata a presidente. Acredito que no interior é necessário fazer uma caminhada mais ombro a ombro, embora eu me considere uma menina do interior, já que cresci em Corumbá.
Nasci em Campo Grande, e passei a maior parte da minha infância e adolescência em Corumbá. E, sim, essa caminhada que estamos fazendo é fundamental para ter resultado eleitoral quando a campanha começar, de fato. Agora, é tudo pré-campanha.
O Estado: Como vai se comportar em relação às críticas ao presidente Jair Bolsonaro sabendo que MS é considerado um estado bolsonarista?
Giselle: Estou muito à vontade, porque os outros cinco pré-candidatos apoiam esse projeto, que para mim é o projeto da morte. A maneira como foi gerenciada a pandemia no Brasil, com a negação da ciência, com dúvidas sobre a vacina, o número de pessoas que se contaminaram e que morreram após a vacina, fala por si própria. E defendendo o projeto da vida, da sustentabilidade, e o projeto de acreditar na ciência tem só o meu palanque.
Por isso estou muito à vontade e tenho a convicção de que os eleitores vão fazer essa leitura. Eu não vou fazer o eleitorado de MS como conservador, até porque o eleitorado elegeu um governador do PT antes de os brasileiros elegerem um presidente do Partido dos Trabalhadores.
O Zeca foi governador antes do Lula ser presidente. Eu participei da elaboração das políticas públicas no governo do PT aqui no Estado e depois foram abraçadas em nível federal pelo Lula. Nós é quem criamos o Bolsa Família, Bolsa Escola, Cursinho Popular e tenho encontrado muitas pessoas que me dizem que conseguiram entrar na faculdade graças ao cursinho que fizram na época em que o PT governou MS. Estou muito tranquila porque sou a única pré-candidata que defende o melhor projeto, e que atualmente em nível federal é capitaneado pelo Lula.
E se você for pensar, na eleição de 2018, que foi no pior momento que o PT enfrentava, no auge da Lava Jato, o Humberto Amaducci teve quase 11% dos votos. Agora, nesse quadro pulverizado que temos, quem tiver perto dos 20% vai estar no segundo turno.
As pesquisas aqui apontam o Lula com mais de 30%. Se nós conseguirmos capitalizar esses votos do Lula para nossa chapa, vamos eleger o Lula e caminhar para o segundo turno. Estou muito confiante porque do ponto de vista numérico estamos confortáveis e do ponto de vista político temos o melhor projeto e que atende a população e a democracia.
O Estado: Já conversou com o Lula? Ele virá a Mato Grosso do Sul para lançar sua pré-candidatura?
Giselle: Sim, nós já conversamos e Lula deve vir a MS. Quero destacar que a nossa presidenta, a Gleise Hoffmann, também virá. O nosso partido não se fala apenas em movimentação das mulheres. O nosso partido dá esse espaço para que elas realmente exerçam o poder.
O Lula já veio algumas vezes a MS, e acredito que virá novamente em momento muito importante e histórico para Mato Grosso do Sul. Já conversamos com ele, e colocamos nossa pré-candidatura. Na verdade, o projeto do PT em nível nacional não é fazer governadores, e sim eleger senadores e deputados federais para que se tenha uma bancada de sustentação ao Lula no Congresso.
Então, a direção do nosso partido realizou uma série de conversas antes de construir a candidatura própria e, num primeiro momento, a orientação da direção nacional era para que fossem construídos palanques abrangentes. Mas, no nosso Estado, não foi possível, já que todas as outras pré-candidaturas foram colocadas e a maioria defendendo abertamente o Bolsonaro.
Nessa situação não nos restou outra alternativa a não ser articular a chapa própria. Estamos buscando pessoas com familiaridade ao projeto e acredito que o diretório nacional vá confirmar nossa candidatura. O que temos de concreto é esta aliança com a Rede, com o PC do B e com o PSOL.
O Estado: O que acha que terá em comum nessa pré-candidatura a governo do Estado, com a disputa que teve ano passado pela presidência da OAB/MS?
Giselle: Nossa disputa na OAB/MS ano passado quebrou paradigmas porque os grupos que se revezam no poder da Ordem em Mato Grosso do Sul estão há mais de 20 anos. E foi a primeira vez que se formou uma chapa com candidatos que não estavam ligados ao Quinto Constitucional, que não estava ligada a partidos políticos, e tivemos muito cuidado em fazer uma chapa plural. Inclusive, formamos com muitas pessoas que não têm vinculação partidária. A eleição da OAB é sempre muito cara, e nós levávamos o que cada um ia consumir, um potinho de salgado e tinha alunos meus que falavam que iam votar na nossa chapa, mas que iam numa festa gratuita promovida pela chapa Y.
Então, a força que nós tivemos trouxemos com advogados de sindicatos, movimentos sociais, indígenas como o Eloy Terena, que é do PSOL e está sendo um interlocutor muito ativo na constituição de uma Frente [na OAB]. Acredito que a eleição da OAB é muito específica para os advogados, mas ela acaba tendo relação com essas eleições mais amplas, porque ali estavam sendo disputadas concepções que envolvem o Estado.
O Estado: A candidatura da OAB/MS já visava concorrer às eleições deste ano?
Giselle: Não. Eu me formei em 1989 com 20 anos. Participo da OAB desde os anos de 1990. Fui secretária-geral em 1999. então, eu já poderia ter me candidatado em outro momento, mas não aconteceu. O contexto da pandemia me trouxe a mola propulsora para realizar alguns sonhos, e um deles era de ser a presidente da OAB/MS. Não me candidatei antes justamente por não ser uma advogada rica. Eu mato um leão por dia para sobreviver da advocacia.
Leciono por amor porque o salário é baixo. Perdi muitos amigos na pandemia, e cheguei à conclusão de que os sonhos não deveriam mais ser adiados. Tivemos quase 400 votos e não é pouco num Estado em que sempre as campanhas da Ordem envolvem eventos com buffet de luxo. Eu não tinha essa ideia de depois da eleição ocupar espaço político. É questão de maturidade mesmo, de chegar um momento em que eu me sinto preparada para ser governadora de MS.