No primeiro final de semana, farmácias passam sem denúncias mas a curiosidade da população é grande
A campanha Sinal Vermelho contra a Violência Doméstica em vigor desde o dia 10 deste mês, transformou as farmácias e drogarias do Estado em um canal seguro para a vítima relatar a agressão sofrida. A ideia é que a pessoa ao conseguir sair de casa, vá até uma farmácia e mostre a mão com uma marca de ‘X’ vermelho ao atendente, balconista ou farmacêutico, que, na sequência, acionará a polícia. O Estado apurou como foi o primeiro final de semana com a vigência da estratégia nas drogarias. Por hora, nenhuma vítima recorreu aos estabelecimentos em busca de ajuda, mas autoridades acreditam na eficiência da campanha, que dá as mulheres mais um canal de denúncia.
Para a delegada titular Deam (Delegacia Especializada da Mulher), Fernanda Felix, é uma questão de tempo para que os pedidos de ajuda cheguem até os estabelecimentos, já que até o momento não houve denúncias. “É uma questão de tempo. Irão aparecer sim mulheres para pedirem ajuda nas farmácias”, afirmou. Na visão dela, permitir denúncias nestes estabelecimentos facilita que as vítimas possam acionar a polícia. “É mais um canal de denúncias, um meio que a mulher tem para denunciar”, disse.
Mesmo sem denúncias, a farmacêutica responsável pela Drogaria Freire da Rui Barbosa com a Afonso Pena, Sefany Alves, explicou que a equipe está instruída e preparada para oferecer ajuda para as vítimas de agressão. “Toda a equipe está ciente de como será a abordagem e estamos orientados a seguir todo o protocolo conforme o CRF [Conselho Regional de Farmácia de Mato Grosso do Sul] e o CFF [Conselho Federal de Farmácia] informaram. Se chegar alguém e, por ventura, mostrar o sinal vermelho, não haverá pânico, não terá euforia, se a pessoa chegar e falar alguma coisa, nós vamos ouvir, se não, nós vamos diretamente ligar para o 190 da Polícia Militar”, ressaltou.
A farmacêutica ressaltou que os clientes estão cientes da campanha e que usam o estabelecimento para tirar dúvidas. “As pessoas estão sabendo da iniciativa, eles chegam, perguntam sobre e querem ser informadas [sobre o protocolo]. Por enquanto eles estão curiosos e estamos também passando para os nossos clientes que se eles sabem ou presenciaram alguma violência doméstica, para denunciarem”, frisou. Alves reiterou que a drogaria dispõe de cartazes informativos expostos acima da balança, local estrategicamente escolhido. “Todo mundo que entra na farmácia se pesa, então é um local que todo mundo poderá se informar”, pontuou.
A campanha é idealizada pelo CNJ (Conselho Nacional de Justiça e Associação dos Magistrados Brasileiros) e conta com o apoio do CRF/MS e CFF. A campanha conta com a participação de quase 10 mil farmácias em todo o país. Mato Grosso do Sul conta com 1.561 farmácias e drogarias (públicas e privadas), 443 são de Campo Grande, e todos os estabelecimentos de saúde estão aptos a participarem da iniciativa.
Índices de violência doméstica
Neste período de pandemia, os índices de violência contra a mulher aumentaram no Brasil. De acordo com um levantamento feito em 12 estados pelo FBSP (Fórum Brasileiro de Segurança Pública), entre março e abril deste ano, os casos de feminicídio no país cresceram 22,2% em relação ao mesmo período do ano passado. Em Mato Grosso do Sul, nos cinco primeiros meses deste ano, 15 mulheres foram vítimas de feminicídio.
No mesmo levantamento, o FBSP apontou queda na abertura de boletins de ocorrência ligados à violência doméstica. Já as chamadas para o número 180 tiveram aumento de 34% em comparação ao mesmo período do ano passado, segundo balanço do governo federal. Para a entidade, os dados do levantamento demonstram que, ao mesmo tempo em que estão mais vulneráveis durante a crise sanitária, as mulheres têm tido mais dificuldade para formalizar queixa contra os agressores
De acordo com o Mapa do Feminicídio de MS lançado pelo governo do Estado por meio da SPPM (Subsecretaria de Políticas Públicas para Mulheres) em parceria com a Delegacia Geral da Polícia Civil, no ano de 2019 em Mato Grosso do Sul, 30 mulheres foram vítimas de feminicídio, 98 sobreviveram para contar suas histórias. Os dados mostram que a cada mês, 130 mulheres registraram BO (Boletim de Ocorrência) por estupro; a cada semana, 150 mulheres sofreram agressões físicas tipificadas como lesão corporal dolosa; e a cada dia, 51 mulheres denunciaram terem sofrido algum tipo de violência doméstica; a cada hora, 2 mulheres foram vítimas de ameaça.
O Mapa do Feminicídio constatou que 77% das mortes ocorreram no local onde as mulheres deveriam estar mais seguras, em suas residências; em cerca de 37% dos casos os autores utilizaram de arma branca (faca, canivete ou machadinha); 56,66% das mulheres foram mortas por homens com quem conviviam e tinham relacionamento afetivo; em 40% dos casos o motivo foi a não aceitação do término do relacionamento e em 33,33%, o motivo alegado foi ciúmes, o que denota sentimento de posse sobre a vítima.
Como denunciar
A conselheira do CRF/MS (Conselho Regional de Farmácia de Mato Grosso de Sul), Angela Lopes frisou a importância de denunciar o agressor. “Se você está hoje, passando por um momento desse em sua residência, vá até uma farmácia mais próxima com um X vermelho em sua mão, o farmacêutico ou o atendente irá encaminhá-la para uma sala mais tranquila e desta forma ligar para o número 190 da polícia militar”, reiterou. A denúncia de violência doméstica pode ser feita em qualquer delegacia, com o registro de um boletim de ocorrência, ou pela Central de Atendimento à Mulher no telefone 180, ou pelo 190 da Polícia Militar. A denúncia é anônima e gratuita, disponível 24 horas, em todo o país.
(Texto: Mariana Moreira)