Professores temem perder conquistas com alterações

Menos de um mês após conquistarem a prorrogação da garantia de receberem 86% do piso nacional pela jornada de 20 horas até 2027, os professores de Mato Grosso do Sul temem sofrer derrotas significativas para a categoria após o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) planejar mudanças no Fundeb (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica).

Segundo o jornal ‘Folha de São Paulo’, o governo Bolsonaro quer vincular o reajuste do piso salarial dos professores da educação básica à inflação, o que elimina o ganho real garantido pela lei atual. A proposta do governo é alterar a Lei do Piso na regulamentação do Fundeb.

Para Jaime Teixeira, presidente da Fetems (Federação dos Trabalhadores em Educação de Mato Grosso do Sul), a decisão de Bolsonaro é péssima para os professores. “Ele encara como se nosso salário fosse um problema para o Brasil”, disse.

“Essa decisão do governo Bolsonaro pode nos influenciar muito negativamente no futuro, já que não teremos o ganho real. A gente tem essa garantia (do acordo ser mantido até 2027), mas leis podem ser modificadas. Tudo é muito incerto”, disse Teixeira.

“A nossa valorização fica prejudicada, perde o sentido, a partir do momento que só há uma correção da inflação. Todos os governantes assumem como prioridade a educação, pois bem, se é prioridade tem ue fazer a valorização diferenciada por aquilo que a educação representa para o país. Impacta diretamente a educação em MS e em todo mundo porque não é só uma questão salarial, mas interfere na formação, graduação, pois não tem atrativo diferenciado para atrair novos professores”, disse Lucílio Souza Nobre, presidente do ACP (Sindicato Campo-grandense dos Profissionais da Educação Pública).

Para ele, diante do que chama de “desmonte e precarização” colocados em prática, resta dialogar com o Congresso. “É lamentável o que vem acontecendo nas políticas de educação do Brasil. O Ministério da Educação não se manifesta, não se solidariza. E a gente espera que os deputados dialoguem antes de aprovarem o que foi proposto”, completou.

“O menosprezo do governo Bolsonaro em relação à educação dos brasileiros pode ser medido tanto pelas tentativas de retirada de verba do Fundeb para financiar escolas particulares de igrejas e para o programa Renda Brasil, que virou Renda Cidadã, em substituição ao Bolsa Família, quanto na escolha política dos ministros da Educação mais comprometidos com a pauta dos costumes do que com a Educação – em menos de dois anos de governo o país está no terceiro ministro”, completou Teixeira.

A lei, de 2008, vincula reajuste anual à variação do valor por aluno do Fundeb, o que se reflete em aumentos acima da inflação, mas pressiona as contas de estados e municípios. O governo quer que a atualização seja só pelo INPC (Índice Nacional de Preços ao Consumidor).

Caso a regra já valesse, o reajuste em 2019 teria sido de 4,6%. O último aumento pela Lei foi de 12,84%, quando o piso chegou a R$ 2.886,24.

Discutida durante cinco meses, a proposta da gestão Reinaldo Azambuja (PSDB) assegura que haverá o pagamento do piso salarial, em 20 horas aos professores, de forma escalonada até 2027, mantendo os percentuais previstos para 2020 e 2021. Também cita a mudança no sistema remuneratório e a politica de melhorias nas carreiras da Educação Básica.

O texto, ainda a ser votado na Assembleia Legislativa, também destaca a “progressão funcional” na carreira em relação ao tempo de serviço, mantendo aos atuais servidores a contagem (tempo) nos mesmos percentuais aplicados hoje.

Plano de Bolsonaro

A meta 17 do Plano Nacional de Educação, que tem de ser colocado integralmente em prática até 2024, prevê reajustes acima da inflação para os professores para que a sua média salarial seja equiparada à média salarial de outras categorias profissionais que exigem curso superior.

No ano em que o PNE foi aprovado (2014), a média salarial de um professor da educação básica era de R$ 3.844,27 (70% da média salarial de outras profissões). No ano passado caiu para R$ 3.807,65. Apesar da queda, a média em comparação às demais profissões subiu para 78%. Isto porque houve um rebaixamento na média salarial das profissões que precisam de curso superior. Em 2014, esses profissionais ganhavam uma média de R$ 5.464,51.

Após os governos Michel Temer (MDB) e Bolsonaro, os trabalhadores que cursaram uma faculdade, muitos com imensas dificuldades para pagar, estão ganhando menos. A média salarial caiu de R$ 5.464,51 para R$ 4.873,56 – uma perda de R$ 590,95 (-10,8%). Os dados são do relatório do Terceiro Ciclo de Monitoramento das metas do PNE feito pelo Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira).

A proposta de Bolsonaro consta de posicionamento do governo, obtido pela Folha, sobre o projeto de regulamentação do Fundeb da Câmara. O fundo direciona à educação básica recursos de uma cesta de impostos acrescidos de complementação da União.

O governo quer que o Congresso vote a regulamentação do Fundeb neste mês para ter tempo de operacionalizar as novas regras. O executivo, entretanto, já trabalha em uma MP (medida provisória) caso o tema não avance até novembro, o que pode corroborar seus entendimentos.

“É uma preocupação do FNDE [Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação]/MEC de forma a viabilizar a operacionalização da distribuição dos recursos do Fundeb”, diz o Ministério da Economia.

Principal mecanismo de financiamento da educação básica, o Fundeb foi ampliado neste ano pelo Congresso. A complementação da União vai saltar dos atuais 10% para 23% até 2026, de modo escalonado —em 2021, passa a 12,5%.

O governo sugere a inclusão de artigo no projeto de regulamentação. “Maior complementação da União e a nova distribuição de recursos elevarão significativamente o valor anual por aluno mínimo recebido, o que impactará o piso em cerca de 15,4% ao ano nos próximos seis anos”, diz justificativa.

O mesmo documento prevê que escolas privadas sem fins lucrativos recebam verbas do Fundeb em toda educação básica (hoje isso é limitado onde há falta de vagas, como na educação infantil e no campo). O governo propõe limite de 15% das matrículas para “vencer a resistência”.

“Como se tratam de etapas com demanda praticamente 100% atendida, e visando vencer a resistência a essa ampliação da destinação para a rede privada, sugere-se restringir a autorização a margens, o que evitaria uma migração das vagas da rede pública para a privada”, diz a justificativa do governo.

A proposta vai ao encontro da pressão de entidades religiosas e filantrópicas e conta com apoio de Bolsonaro e do ministro da Educação, Milton Ribeiro. Também tem forte aderência entre parlamentares. Acesse outras notícias relacionadas.

(Com informações: Rafael Ribeiro)

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