Dois estudos internacionais recentes levantam a hipótese de que a imunidade de rebanho possa ser alcançada no caso da covid-19 com um índice menor de infectados do que o inicialmente estimado, se considerados os diferentes níveis de interação social dentro de uma mesma população.
Na prática, as pesquisas sugerem que o porcentual de indivíduos infectados que faria o vírus ter dificuldades de continuar se propagando seria bem inferior aos 60% a 70% antes projetados por cientistas – um dos estudos aponta o índice de 43% e o outro, de 20%.
Segundo especialistas em saúde, mesmo que, na teoria, tais modelos matemáticos façam sentido e a imunidade de rebanho possa ser alcançada com menos infectados, as lacunas que ainda existem sobre a doença nos impedem de saber se as cidades brasileiras já estão próximas desse cenário.
E mais: mesmo que elas estejam, essa imunidade coletiva, além de ser alcançada ao custo de mais mortes, não é homogênea entre municípios, bairros e comunidades, o que impossibilita que possamos apostar nela para ficar livres da covid. As medidas de distanciamento social, portanto, continuam sendo fundamentais para frear o avanço do vírus até que tenhamos uma vacina – essa, sim, capaz de conferir imunidade coletiva confiável.
“Na imunidade de rebanho pela vacina, a gente tem certeza que a pessoa está protegida. Já a imunidade coletiva natural depende de vários outros fatores que não temos controle no caso da covid. Não sabemos se uma pessoa que teve a doença uma vez fica imune para o resto da vida, não temos certeza quais anticorpos conferem essa imunidade”, destaca Natalia Pasternak, microbiologista, pesquisadora do Instituto de Ciências Biomédicas da USP e presidente do Instituto Questão de Ciência.
“Mesmo que estejamos com um índice maior de infectados imunes, não temos como medir isso com segurança, e o máximo que vamos conseguir é manter a doença mais controlada, mas sempre haverão surtos pontuais. Se a gente for usar isso para embasar políticas públicas, vai dar errado”, completa a especialista.
Lacunas
Diretor da Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm), Renato Kfouri reforça que as lacunas sobre a resposta imune do organismo à covid ainda são grandes e acrescenta que a imunidade coletiva natural depende de muitos outros fatores além do porcentual de infectados.
“Definir um porcentual (de contaminados para a imunidade de rebanho) é temerário porque não depende apenas do número de infectados, mas das dinâmicas de interação, dos adensamentos, tipos de moradia. Em alguns locais, é muito mais difícil esgotar a cadeia de transmissão”, afirma o especialista.
(Texto:Ana Beatriz rodrigues com informações do Noticias ao Minuto)