Hoje (22) é comemorado o Dia Mundial Sem Carro. A data é usada por entidades envolvidas com o debate sobre mobilidade urbana para chamar a atenção para alternativas a veículos individuais motorizados, como a bicicleta.
Este é o meio de transporte de Marcelo Santos. Aposentado, ele se desloca pedalando e tem um projeto com alunos de jornalismo da Universidade Federal Fluminense sobre o tema. Até se aposentar, ia da casa para o trabalho em um trajeto de 14 quilômetros diários de pedalada.
“Eu usava transporte público, mas encontrava dificuldade. Andei muito de bicicleta até meus 26 anos e voltei a andar há quatro anos. A opção foi por achar mais fácil me movimentar entre meu trabalho e minha casa sem transtorno de engarrafamento e outros obstáculos”, conta.
Não há dados muito consolidados sobre a realidade de pessoas como Marcelo no Brasil. De acordo com o relatório mais atual sobre os ciclistas, denominada Perfil do Ciclista 2018, da Parceria Nacional pela Mobilidade por Bicicleta, 75,8% utilizavam o meio de transporte para ir ao trabalho, 61,9% para o lazer, 55,7% para fazer compras e 25,4% para ir à faculdade.
Dos ouvidos, 82,5% pedalavam mais de cinco vezes por semana, 59% usavam há mais de cinco anos, 55% levavam entre 10 minutos e 30 minutos em suas viagens, 40,3% têm renda entre 1 e 2 salários e 25.7% têm entre 25 e 34 anos de idade.
As principais motivações para pedalar são rapidez e praticidade (34,8%), saúde (25,8%) e custo (22%). Os principais problemas enfrentados são segurança no trânsito (40,8%), a infraestrutura (37,9%), segurança pública (7,9%) e sinalização (6,9%).
A diretora-presidente da União de Ciclistas do Brasil, Ana Carboni, destaca que apesar da presença quantitativa das bicicletas no país, ela ainda é pouco valorizada como meio de transporte tanto entre as pessoas quanto no planejamento das cidades e das estruturas de mobilidade.
“A frota de bicicleta é maior do que a de automóveis. Contudo, o Brasil continua priorizando os veículos individuais motorizados. 80% da infraestrutura viária nas cidades é dedicada ao carro e à moto, que transporta menos de 30% da população. Existe um desequilíbrio muito grande. A maioria das pessoas se locomove a pé, de bicicleta ou de transporte público”, pondera.
Ana Carboni defende que é preciso repensar as cidades considerando novos modelos de mobilidade. A dificuldade posta nas distâncias de grandes centros urbanos está diretamente relacionada às desigualdades e como elas se colocam nos territórios. Mas ela acredita que as duas rodas podem ser uma alternativa real, não somente sozinhas como em combinação com outros modais, como metrô.
“A bicicleta tem potencial de intermodalidade, mas o transporte público precisa melhorar. Precisa haver investimento em infraestrutura, em bicicletários, bicicletas compartilhadas, e a bicicleta pode ser usada como primeira ou última perna”, defende. Ela cita como exemplo a cidade de Fortaleza, onde é possível usar o bilhete de ônibus para pegar bicicletas compartilhadas e fazer parte do trajeto.
Ciclismo e pandemia
A União dos Ciclistas do Brasil lançou um documento com sugestões de adaptação das vias e estruturas de mobilidade no contexto da pandemia. Como o transporte público se tornou um vetor de transmissão do vírus e parte expressiva da população não conta com a possibilidade do transporte por carro, as bicicletas se tornaram uma alternativa de mobilidade.
As bicicletas também passam a ser empregadas crescentemente na logística. Os entregadores de aplicativo são um exemplo dessa tendência e forma de deslocamento.
“O transporte por bicicleta não polui o ar, evita contato físico direto e promove saúde e bem-estar. Além dos benefícios ambientais, há também benefícios socioeconômicos: trata-se de um veículo de baixo custo e acessível, sendo a ciclomobilidade a aposta de muitos países para recuperar a economia”, defendem os autores.
Uma série de cidades em todo o mundo, como Berlim (Alemanha), Bogotá (Colômbia) e Vancouver (Canadá) adotaram medidas emergenciais, como a construção de ciclovias temporárias (com sinalização ou com reserva de faixas com cones, por exemplo).
A construção dessas ciclofaixas pode ser feita a baixo custo, com sinalização. O documento sugere cores como amarelo e vermelho para remeter ao sinal de alerta e trazer maior contraste com o pavimento. São sugeridas também barreiras móveis para reforçar a demarcação e evitar acidentes causados por motoristas.
Outra alternativa é a ampliação de espaços para pessoas. Em Brasília, isso foi feito na pandemia em algumas vias. Mas, de acordo com os autores, ainda de forma limitada por ocorrer em alguns dias. Eles advogam pelo uso deste recurso de forma mais perene, com o objetivo de incentivar o deslocamento ativo.
Marcelo Santos destaca que várias cidades estão vendo o novo normal com a necessidade de incentivar a mobilidade ativa. “Sabe-se que no Brasil 70% das viagens são de no máximo 8 km, é uma distância viável para qualquer um pedalar. O desafio maior é da sociedade entender que esse é um momento de retornar diferentes”, opina.
(Agência Brasil)