Exército compartilha orientações sobre vícios em apostas esportivas onlines

Foto: ArteAbraão TorresRios de Notícias)
Foto: ArteAbraão TorresRios de Notícias)

Grupo de Jogadores Anônimos se reúnem em 13 estados para tratar ludopatia

O vício em jogos é uma realidade que afeta milhões de pessoas em todo o mundo, sendo uma preocupação crescente de saúde pública. A ludopatia, que é a compulsão por jogos, pode se manifestar de diversas formas, desde apostas esportivas até jogos de cassino online, e pode ter impactos devastadores na vida dos indivíduos e de seus familiares. Pensando nisso, o Exército publicou um caderno de orientações para a “sensibilizar a família militar” sobre o vício em apostas esportivas online.

A cartilha foi publicada em julho do ano passado, mas foi recentemente atualizada pela Diretoria de Assistência ao Pessoal da Força. Com base em diretrizes criadas pela Organização Mundial da Saúde (OMS), o documento compara o vício em apostas online a comportamentos típicos de adicção, como o alcoolismo e a dependência química. Sem expor dados que demonstram impacto desses transtornos no funcionamento do Exército, o texto destaca que o vício em jogos é mais comum entre homens com alta impulsividade e competitividade. A ludopatia pode prejudicar a atuação de oficiais.

Para alertar sobre os riscos associados ao jogo patológico, a cartilha cita o caso hipotético de um militar da ativa, denominado João. De acordo com o documento, o personagem teria começado no mundo das bets por diversão, mas teria contraído dívidas para apostar com valores cada vez mais altos.

“O vício de João em apostas começou a afetar todas as áreas de sua vida. Ele passou a gastar menos tempo com a família e os amigos, concentrando-se apenas nas apostas. Sua saúde mental também foi prejudicada, pois ele se tornou cada vez mais estressado e ansioso com suas perdas”, o material descreve.

O texto também descreve os principais sintomas do transtorno. “Passar tempo demais usando telas; Pensar sobre jogos por muito tempo; Sentir-se ansioso ou tenso quando não está jogando; Gastar quantias descontroladas em jogos; Aumento na irritabilidade ou impaciência; Necessidade de estar conectado o tempo todo; Mentir sobre jogar; Sentimento constante de culpa; Indisponibilidade; Distanciamento ou isolamento; Problemas de organização; Procrastinação e Dificuldade de se inserir em situações sociais”. Ao final, o material recomenda o uso de medicamentos, a psicoterapia e a participação em grupos de apoio mútuo para o tratamento do transtorno.

Uma Fundação que tem como intuito ajudar pessoas viciadas em jogos, denominada de J.A. (Jogadores Anônimos), atua em 13 estados do Brasil, incluindo Mato Grosso do Sul. O vício costuma ser classificado em três estágios: leve, a psicoterapia pode ser uma opção de tratamento, ajudando a pessoa a buscar outras alternativas para lidar com as frustrações; moderado, necessário o acompanhamento de um médico psiquiatra para o uso de medicação, visando estabilizar o humor da pessoa e tratar sintomas de ansiedade e depressão, pode ser necessária a internação para que a pessoa interrompa imediatamente os comportamentos de risco que possam afetar sua própria vida ou a de outros.

A médica psiquiatra e professora da Faculdade de Medicina e Supervisora da Residência Médica em Psiquiatria da UFMS (Universidade Federal de Mato Grosso do Sul), Danusa Céspedes Guizzo, explica que existem várias características que podem influenciar uma pessoa a se tornar viciada em jogo, a psicóloga explica que os idosos têm uma tendência natural a se distrair dessa forma, podendo assim, não escaparem dessa realidade.

“Os idosos têm mais tempo livre e podem estar sofrendo com a diminuição do seu círculo de amizades e contatos sociais, com o distanciamento da família ou mesmo com a morte de entes queridos. Alguns podem apresentar Depressão, Abuso de Álcool ou outras patologias psiquiátricas. Isso tudo faz com que eles estejam mais vulneráveis a desenvolver o Transtorno de jogo patológico”.

Jogos tradicionais torna seus usuários tão dependentes quanto o jogo virtual, contudo, há algumas diferenças em como esses afetam a mente e, até mesmo, o físico do jogador. A professora pontua ainda que o jogo do Tigrinho, um jogo virtual que tem virado uma febre entre o público de redes sociais, é “o novo homicida de nossa sociedade: várias pessoas estão perdendo tudo com esse jogo, o que tem desencadeado muitas tentativas de suicídio e suicídios consumados”.

“Os dois tipos de jogo patológico tem inúmeras consequências emocionais e financeiras. Mas o jogo online tem mais fácil disponibilidade e tem como consequência um maior isolamento do jogador; pode causar ainda falta de concentração, obesidade, síndrome do olho seco, problemas de audição e postura inadequada. Os pacientes podem apresentar dores nas articulações e na cabeça, má postura, alterações no sono, estresse, sintomas depressivos e ansiosos”.

A pessoa que se torna viciada começa apresentar alguns sinais, como restringir e prejudicar sua vida familiar, social e profissional, direcionando a maior parte de seu tempo para o jogo; tenta diminuir ou parar de jogar, sem sucesso; vai gradativamente aumentando as apostas; fica inquieto ou irritado quando não está jogando; quando tem algum problema, busca alívio somente com o jogo; pode mentir ou omitir fatos para esconder o seu envolvimento com o jogo ou perdas financeiras.

“Quando o familiar/amigo observar que a pessoa está apresentando alguns destes sinais, conversar com ela e levá-la a atendimento psiquiátrico e psicológico. Existem muitos materiais elucidativos na Internet que podem ser utilizados para explicar à pessoa que seu comportamento é patológico e oferece muitos riscos”.

O jogo patológico é uma dependência semelhante à dependência química. Alguns estudos verificaram que os jogadores patológicos têm níveis cerebrais mais baixos de Noradrenalina e Dopamina, substâncias produzidas em resposta a eventos estressantes e excitantes, causando sensação de alívio e prazer diante de sucessos. Jogadores patológicos precisam jogar cada vez mais, e com cada vez mais riscos, para obter o mesmo prazer que jogadores ocasionais.

Lei
Lei que regulamenta as apostas esportivas online, conhecidas como “bets” foi sancionada no ano passado, pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva. No texto, os deputados incluíram as apostas pela internet, também conhecidas como cassinos online.

As mudanças têm a expectativa de aumentar a arrecadação em 2024, uma vez que empresas e apostadores terão que pagar impostos. Conforme a lei, as empresas poderão ficar com 88% do faturamento bruto para o custeio da atividade. Sobre o produto da arrecadação, 2% serão destinados à contribuição para a Seguridade Social. Além disso, os 10% restantes serão divididos entre áreas como educação, saúde, turismo, segurança pública e esporte.

A Dra. Danusa Céspedes Guizzo acredita que as regras do marco dos jogos virtuais não são suficientes para prevenir a ludopatia e pontua que o país necessita urgentemente de mais serviços especializados neste tratamento.

“Meu colega Hermano Tavares, coordenador do Programa Ambulatorial do Jogo Patológico do Instituto de Psiquiatria da USP, acredita que a Lei 14.790/23 tem falhas e precisa ser melhorada. Segundo ele, a regulamentação precisa estabelecer que apostas online só podem ser feitas mediante cadastro do CPF dos apostadores, para permitir a identificação de padrões de apostas compulsivas, por exemplo. Apostadores problemáticos deveriam receber alertas, juntamente com ofertas de avaliação e tratamento. O SUS precisa ser capacitado para lidar com o aumento expressivo de pacientes com esta doença que certamente irá ocorrer”.

Em Campo Grande, o J.A. acontece no Centro, na rua Maracaju, nº249, às terças e quintas-feiras, às 19h, disponível para aqueles que desejam se recuperar e compartilhar suas experiências.

Por Inez Nazira e Kamila Alcântara  

Confira mais notícias na edição impressa do Jornal O Estado do MS.

Acesse as redes sociais do O Estado Online no Facebook Instagram.

 

 

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *