Análise de mamíferos com dados de MS ganha destaque internacional

Foto: Divulgação
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Pesquisa com mais de 170 pesquisadores foi publicada na ‘Science’

A prestigiada revista americana “Science” publicou ontem (9), o estudo “Behavioral responses of terrestrial mammals to COVID-19 lockdowns”, que envolveu a participação de mais de 170 pesquisadores do mundo, além da colaboração do Icas (Instituto de Conservação de Animais Silvestres). A pesquisa contou com dados de Mato Grosso do Sul para avaliar respostas comportamentais de mamíferos terrestres ao período de lockdown da covid-19.

As medidas de isolamento impostas pela OMS (Organização Mundial da Saúde) para contenção da covid e implementadas em 2020, reduziram a mobilidade humana no mundo inteiro, possibilitando que os pesquisadores pudessem avaliar e compreender o efeito do movimento das pessoas no comportamento de 43 espécies de mamíferos terrestres, independente do contexto da paisagem local ou do grau de alteração do ambiente onde estes animais estão inseridos.

Ao jornal O Estado, a bióloga e coordenadora científica do Icas e uma das autoras da pesquisa, Nina Attias, explicou que, utilizando dados de monitoramento via GPS (Sistema de Posicionamento Global, sigla em inglês), o estudo avaliou as taxas de movimentação nas estradas de 2.300 animais distribuídos pelo mundo, incluindo dados de tamanduás-bandeira, que são monitorados pelo Projeto Bandeiras e Rodovias, desde 2017, em áreas sul-mato-grossenses. “Os pesquisadores envolvidos, já monitoravam animais em seus países para realização de vários estudos independentes, os quais se juntaram para responder a essa grande pergunta sobre como a presença e movimentação humana

afetam o comportamento dos animais. Estamos trabalhando juntos desde 2020. Foi um processo longo de desenvolvimento do estudo, pois reunimos uma quantidade muito grande de dados. Com isso, foi preciso bastante tempo para padronizar tudo, depois analisar, muitas trocas de mensagens entre todos. Até chegarmos ao resultado final. Colocamos coletes de GPS nos tamanduás e, com isso, sabemos exatamente por onde eles passam, pois esses coletes marcam um ponto de GPS a cada 20 minutos e é desta forma que podemos tentar entender o quanto os animais estão cruzando ou evitando a estrada”, iniciou ela.

De acordo com Nina, foram comparados como os animais se comportaram durante o período de isolamento imposto em 2020, em relação ao mesmo período de 2019 – antes da pandemia. “Os resultados mostram que, a partir dos dados do MS, bem como dos dados de animais de outras partes do mundo também, quando há uma redução no fluxo de carros os animais evitam menos a estrada. Isso mostra que o fluxo diário das estradas cria uma barreira para a movimentação desses animais. Em contrapartida, a boa notícia é que eles conseguem adaptar o comportamento deles a novas condições. Isto é, a partir do momento que esses animais percebem que as estradas estão menos movimentadas e são menos perigosas, eles tendem a diminuir o comportamento de evitar a estrada e passam a se aproximar mais, minguando esse efeito barreira”, explicou.

Conforme aponta o estudo, em lugares onde as condições de isolamento e restrição de circulação foram mais severas durante a pandemia, ou seja, período em que as pessoas estavam saindo menos de casa, as taxas de movimentação dos animais a cada 10 dias aumentou 73%. Esse dado sugere que, sem a circulação de pessoas, os ambientes ficam mais permeáveis para os animais se locomoverem, tendo em vista que ficam mais à vontade.

Ainda de acordo com o estudo, nas áreas com altos índices de modificação e urbanização, que possuem uma presença e uma interferência humana maior, os animais ficaram 36% mais próximos das estradas durante o período de confinamento. “Isso mostra que, com a diminuição do fluxo humano, os animais evitam menos as estradas. Em várias partes do mundo, o volume do tráfego atenuou muito durante esse período, reduzindo o impacto das estradas nos animais e, consequentemente, diminuindo o efeito de barreira que as estradas causam e o número de animais atropelados, como constatado por outros estudos”, destacou Nina.

Conforme a pesquisadora, esse tipo de informação é útil quando se fala em “medidas de mitigação” para as colisões entre veículos e animais silvestres, que são um ameaça tanto para as pessoas quanto para os animais. “Por exemplo, se identificarmos uma área que seja importante para a movimentação de animais, que esteja próxima ou cruze estradas, podemos pensar em medidas de mitigação envolvendo ajustes nos horários, frequência e volume do tráfego de automóveis, pois agora sabemos que os animais são capazes de perceber essas mudanças, no uso das estradas. Esse tipo de estratégia poderia criar estradas mais seguras para todos, facilitando a coexistência entre pessoas e animais. Num Estado tão rico em biodiversidade como o nosso, isso é extremamente importante”, destacou, à reportagem.

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O presidente do Icas, Arnaud Desbiez, enfatizou que a movimentação humana ainda é um fator chave que afeta direta e indiretamente o comportamento dos animais silvestres, causando um efeito quase tão grande nos animais quanto na alteração do hábitat natural das espécies. “Ao avaliar os impactos humanos no comportamento animal, ou quando pensamos em medidas de mitigação, é preciso levar em consideração não só a estrutura física da paisagem, mas também a presença e circulação humana naquela área”, afirmou Arnaud.

É certo que os mamíferos convivem com perturbações antrópicas há muito tempo. A publicação deste novo estudo demonstra que, mesmo assim, os animais ainda não estão habituados à presença humana, mas seguem com capacidade de responder a mudanças de comportamento do homem.

Estes dados são fundamentais para o desenvolvimento de novas estratégias de mitigação, que possam manter a movimentação dos animais e todos os benefícios associados a essa questão, que afeta a vida de todos.

 

Por Brenda Leitte– Jornal O Estado do MS.

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