Desde criança que admiro trem. Eu ficava muito contente quando ouvia os mais velhos contarem as fantásticas histórias da Noroeste do Brasil que chegou a Campo Grande em 1914. Como morava no bairro Vila Carvalho, na Cidade Morena, via todos os dias a velha Maria Fumaça cortar nossa cidade levando e trazendo gente, sonhos, tecnologias, mercadoria e muito progresso para o Sul de Mato Grosso.
Quando tive que sair de Campo Grande para estudar e trabalhar em outros estados da federação tive o prazer de me deslocar por meio de trem. Era uma viagem muito divertida. Tenho boas lembranças dessa época. Aliás, nunca entendi porque a malha ferroviária que liga Santos a Corumbá foi praticamente abandonada por muitos anos.
Os países que conseguiram altos índices de desenvolvimento e qualidade de vida continuam apostando no trem como forma de integrar pessoas, mercados e nações. China, EUA, Canada, Índia, Rússia, Alemanha e outras nações prosperas possuem imensas malhas ferroviárias com mais de um século de história.
Fiz essas considerações porque estou participando do esforço do governo Federal, do estadual e da iniciativa privada para reconstruir, inicialmente, o trecho ferroviário que liga Santos, Bauru, Três Lagoas, Campo Grande e Corumbá aproveitando a infraestrutura da antiga NOB.
As tratativas estão bem adiantadas. A empresa Rumo, detentora da concessão da Malha Oeste, antiga NOB, tem projeto pronto para fazer trafegar por esse trecho trens modernos, velozes e com ampla capacidade de carga. Numa primeira etapa – o projeto que leva o sugestivo nome de Ferrovia Transaméricana – ligará Santos em São Paulo a cidade de Santa Cruz na Bolívia.
Numa segunda etapa as composições devem chegar ao Peru e ao Chile encurtando em 20 dias o trajeto até os países asiáticos.
A parte da ferrovia que fica em solo Boliviano está pronta. Pode se integrar sem problema aos trilhos da empresa Transaméricana porque todo trajeto usa bitola de um metro. Existe a possibilidade, conforme informações da direção da Transamericana, numa etapa posterior, de se estender o ramal ferroviário que liga Campo Grande a Ponta Porá até o Chile. O referido deve cruzar o Paraguai e a Argentina.
Se as obras da Malha Oeste forem concretizadas as cidades de Campo Grande, Corumbá e Três Lagoas se tornarão importantes centros de distribuição de mercadorias da América Latina. Deverão passar por essas cidades algo como 30 milhões de toneladas de mercadoria por ano.
Estamos falando apenas de um projeto que liga o Brasil a Bolívia, entretanto, como se sabe, está em estagio bem avançado a construção da Rota Bioceânica que passa por Porto Murtinho. Essa iniciativa, sem dúvida, também impactará positivamente toda economia de Mato Grosso do Sul.
Existem alguns gargalos que precisam ser solucionados para que a Ferrovia Transamericana vire realidade. A direção da empresa está solicitando ao governo Federal a renovação da concessão que só tem mais 7 anos para vencer.
Como se trata de investimentos da ordem de R$ 6 bilhões só na primeira etapa me parece justa a reivindicação. O governo de Mato Grosso do Sul está empenhado para que a União e a empresa encontrem um caminho que permita o retorno, em novo patamar tecnológico, dos trens que conheci na minha infância. (Pedro Chaves)
Pedro Chaves: É economista, educador e Secretário de estado do Governo de Mato Grosso do Sul.