O presente inacessível: O desafio do Zolgensma e o direito à saúde

Foto: Divulgação
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O Natal, época de celebração e alegria, pode ser marcado por desafios desproporcionais para algumas famílias brasileiras. A pergunta: “E se o presente de Natal do seu filho custasse 7 milhões de reais?” reflete a dura realidade enfrentada por pais cujos filhos têm atrofia muscular espinhal (AME). Diante dessa situação, a busca pelo Zolgensma, considerado o medicamento mais caro do mundo, destaca as profundas discrepâncias no acesso à saúde no Brasil.

Para uma família com renda média de dois salários-mínimos, por exemplo, a perspectiva de adquirir o Zolgensma para um filho com AME é avassaladora. O custo exorbitante desse medicamento coloca em xeque a capacidade de as famílias proporcionarem o tratamento necessário para a garantia do direito à vida plena e com saúde, um princípio consagrado na Constituição de 1988.

A atrofia muscular espinhal é uma condição que afeta a qualidade de vida de crianças, comprometendo sua mobilidade e habilidades motoras. Além do impacto direto na saúde, a AME coloca um peso emocional significativo sobre as famílias, que enfrentam o desafio de proporcionar cuidados adequados a seus entes queridos.

A Constituição Federal estabelece, em seu artigo 196, que a saúde é direito de todos e dever do Estado. Entretanto, a disparidade no acesso a medicamentos como o Zolgensma questiona a efetivação desse direito fundamental. A judicialização da saúde, muitas vezes, se torna a única saída para garantir tratamentos de alto custo.

A busca por tratamentos por meio da judicialização reflete não apenas a necessidade imperativa de cuidados médicos, mas também a vulnerabilidade do sistema de saúde brasileiro. A decisão sobre quem terá acesso a determinados tratamentos muitas vezes fica nas mãos do Poder Judiciário, evidenciando a urgência de reformas estruturais.

As desigualdades sociais têm um papel crucial no acesso à saúde. Enquanto algumas famílias podem contar com recursos para manter tratamentos de alto custo, outras se veem confrontadas com barreiras financeiras intransponíveis. A equidade na saúde deve ser um princípio norteador na busca por soluções. (Eu mesma só conheci uma família no mundo que conseguiu comprar o Zolgensma sem judicialização).

A questão do acesso ao Zolgensma destaca a urgência de políticas públicas eficazes que garantam tratamentos de ponta para todos os cidadãos, independentemente de sua condição socioeconômica. O Estado, como defensor do direito à saúde, deve agir para superar as barreiras que impedem o acesso universal a tratamentos essenciais.

O elevado custo do Zolgensma levanta questões éticas sobre a comercialização de tratamentos que podem determinar a vida e a morte. A busca pelo lucro não pode sobrepor-se ao compromisso ético de garantir a vida e a saúde de todos os cidadãos, conforme estabelecido pela Constituição.

Diante do desafio do acesso ao Zolgensma e de outros tratamentos, o Natal deve ser um momento de reflexão para a sociedade brasileira sobre os valores que norteiam nosso sistema de saúde. O direito à saúde é universal e não pode ser condicionado por questões financeiras. A busca por soluções requer uma ação coletiva, envolvendo o Estado, a sociedade civil e o setor privado, para garantir que nenhum presente de Natal, destinado a salvar uma vida, seja inacessível para qualquer família brasileira.

Feliz Natal e que o menino Jesus possa nascer e crescer em amor, todos os dias, no seio da sua família.

Por Anaísa Banhara, Advogada especialista em acesso à saúde.

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