Evento acontece hoje, na Estação Cultural Teatro do Mundo, em homenagem ao legado crítico e criativo do diretor e fundador do Teatro Oficina
José Celso Martínez Correa, mais conhecido como Zé Celso, foi, em 1958, um dos fundadores do Teatro Oficina. Com uma proposta transgressora, o artista revolucionou o meio artístico brasileiro, em especial o teatral, com técnicas provocativas e diretas com o público, além de assumir uma postura crítica diante de uma realidade absurda que atravessa o país.
O diretor faleceu no dia 6 de julho, aos 86 anos, e abalou o meio artístico nacional e regional, levando seus admiradores da tristeza à exaltação. Quem explica melhor a respeito dessa comoção, relevância e homenagem a Zé Celso é o ator Fernando Lopes. Ele é diretor de teatro, formado pela Unirio e um dos proprietários da sede Estação Cultural Teatro do Mundo, local onde o tributo vai acontecer hoje, às 19h com entrada gratuita.
Em entrevista ao jornal O Estado, ele explica que a ideia do evento surgiu de maneira espontânea, por uma iniciativa da deputada Camila Jara, ao perceber o seu abalo e da classe artística em geral, de Campo Grande, por meio das redes sociais. “Eu me coloco no mundo por meio das redes sociais e me insiro na classe artística brasileira, também por meio das redes sociais. Eu sou do Rio, morei em São Paulo, Belo Horizonte, e tenho amigos espalhados pelo mundo todo. As redes sociais são um meio que eu uso para me comunicar com o mundo, e com a morte do Zé Celso eu me fiz presente, porque ele é um homem muito importante na carreira de todos nós, artistas de teatro do Brasil e na minha, em particular, por conta do meu interesse no trabalho que ele desenvolvia. Eu fiquei muito abalado (não só eu) e a Camila, notando essa movimentação, me procurou por meio de sua assessora e planejamos o tributo ao Zé Celso”.
Sobre a importância do artista, Fernando ressalta as ações que o transformaram em uma referência para as artes cênicas e pontua a respeito da vida dedicada ao teatro e as fortes influências que Zé Celso causou nas outras ramificações das artes, formando, intelectualmente, cenógrafos, compositores, assim como o próprio Fernando. “Há muitos anos, desde o início de sua carreira, ele se torna um sacerdote do fazer teatral e coloca a sua vida à disposição disso. Não só como exemplo, mas, com as suas ações, o Zé Celso abriu campos de possibilidade para a Arte Moderna Brasileira. O Tropicalismo é representado pela arte do Zé Celso, o teatro dionisíaco, que ele representa, é importante para o mundo todo, não só para as artes cênicas, mas para todas as outras ramificações de artes. De alguma forma, ele formou compositores, cenógrafos, artistas de teatro e iluminadores técnicos e, quando eu digo que formou, não é só no sentido da formação técnica, mas na formação intelectual. Eu, por exemplo, fui formado pelas ações José Celso.”
A relação sacerdotal do diretor com o teatro é outro ponto destacado por Fernando, que afirma ser, entre tantas, um ponto marcante em seu trabalho. “A principal influência do encenador na minha carreira é essa lógica sacerdotal, pois eu me considero também um sacerdote do teatro das artes. Eu me coloco no mundo como um artista que necessita da arte, não o contrário. A arte não precisa de mim, mas eu preciso dela. E isso faz com que eu me movimente. Quer dizer, acho que quem faz o mundo girar somos nós e o Zé Celso tem isso muito claramente e me inspira muito, nesse sentido também. Somos nós que fazemos a história e é essa é mais uma grande influência do José Celso na minha carreira.”
O tributo
Para o tributo está previsto, como programação, a apresentação documentário “Evoé! – Retrato de um Antropófago”, que narra a vida do diretor em diversos aspectos, desde sua infância até suas montagens teatrais marcantes. Em seguida, está previsto um bate-papo com convidados do cenário artístico campo-grandense, o papo permeia entre o trabalho desempenhado por Zé Celso e, em conjunto, visa refletir sobre as necessidades locais, no âmbito cultural. Por fim, está previsto um cortejo, em que os convidados, em partilha com o público, cantarão uma música do artista.
“A morte do Zé Celso, trágica como foi, aqueceu o coração de todos os seus admiradores. Em um sentido ruim, num primeiro momento, mas depois virou uma festa. E tornou possível que o Brasil, de alguma forma, por meio das redes sociais, conhecesse mais o Zé Celso já que, inclusive, algumas nem tinham ideia ou sabiam mais ou menos quem era o diretor. Acho que esses eventos de homenagem, que vão acontecer aqui e em outros lugares, surgem com a necessidade de fazer as pessoas entenderem a importância da arte e, por meio dele, conhecer um pouco essa força de vida e o desejo pela vida, a que se reconstrói o tempo todo e a possibilidade de uma vida mais livre para todos”, explica o diretor.
Fernando ainda ressalta que o evento é aberto ao público em geral, aos interessados em cultura e aos necessitados de arte, que este é um momento de confraternização do Centro-Oeste, diante de algo que causa tristeza, porém, seguido de uma celebração. “O Zé é um cara que diz, com força, que fez tudo o que ele quis fazer e pagou um preço caro por isso. Ele nunca fez nada que não quisesse e essa potência marcou muitas gerações. Foi 60 anos no Brasil, falando para nós como deveríamos ser, enquanto brasileiros. A sua luta política artística é também um dos pontos altos do Zé Celso, e é a potência mais original do artista, para mim. Ele não se rendeu ao capital, é um homem que criou a própria história. Começou em São Paulo, no interior, depois vai para a capital e a partir daí roda o mundo com o seu trabalho. Sem o Zé Celso, nosso teatro seria bem mais pobre, por isso, que bom que ele existiu e vai continuar existindo, nos dando a legitimidade do fazer artístico”, afirma Fernando.
O Espaço Cultural Teatro do Mundo é localizado na rua Barão de Melgaço, 177, Centro, Campo Grande -MS. Para mais informações, a sede disponibiliza o perfil no Instagram: @estacaoculturalteatrodomundo.
Por – Ana Cavalcante
Confira mais notícias na edição impressa do Jornal O Estado do MS.
Confira as redes sociais do O Estado Online no Facebook e Instagram.