Escolher uma profissão para seguir ao longo da vida é uma das questões que costuma ocupar a mente dos adolescentes durante o ensino médio. Porém, esse nunca foi um problema para a jovem sul-mato-grossense e atriz Karine Araújo, de 24 anos, que encontrou seu lugar na arte. Após passar por diversos processos seletivos, foi aprovada na Escola de Arte Dramática da USP (Universidade de São Paulo), uma das instituições acadêmicas mais renomadas do Brasil.
Com duração de quatro anos, o curso técnico em Teatro — Eixo Tecnológico: Produção Artística e Cultural e Design da Escola de Arte Dramática da Universidade de São Paulo (EAD/ECA/USP) é considerado uma das melhores formações de atores da América Latina. O curso é predominantemente prático: embora os primeiros semestres contem com um maior enfoque em disciplinas teóricas e técnicas, os alunos já têm a oportunidade de realizar exercícios cênicos e de interpretação desde o início. O corpo docente é composto, na maioria, por professores-artistas, que conseguem integrar a prática com a teoria, oferecendo uma formação completa.
O processo seletivo para a EAD (Escola de Arte Dramática) aconteceu de dezembro de 2024 a fevereiro de 2025 e foi dividido em três etapas. Na primeira, Karine apresentou uma cena de três minutos, de livre escolha, para uma banca com dois professores e um convidado. A segunda etapa consistiu em uma cena de três minutos, com um texto de uma lista selecionada pela instituição, e foi aberta ao público, com a banca composta por todos os professores. A última etapa incluiu quatro dias de aulas intensivas, debates sobre o livro “Corpo Encanto das Ruas” e uma montagem em grupo de cenas curtas.
Karine se viu em uma competição por 20 vagas, entre 400 candidatos, o que significava que apenas um em cada 20 teria a chance de ser aprovado. A seleção, extremamente competitiva, ocorreu em três fases. Na primeira, apenas 120 candidatos foram escolhidos. Na segunda, a disputa se intensificou, com os concorrentes lutando pelas 50 vagas que os levariam à fase final. Por fim, os selecionados enfrentaram a última etapa, onde apenas 20 pessoas conquistaram o tão almejado lugar no curso.
Sonho em Realidade
A conexão de Karine com a EAD é longa, e o desejo de ingressar na instituição surgiu pelo reconhecimento da sólida base teórica que ela oferece, seguida pela aplicação prática com montagens de peças. Karine valoriza imensamente esse processo, ao acreditar que o embasamento teórico é fundamental para aprimorar a técnica e potencializar seu trabalho artístico.
“Ao longo dos anos tive o prazer de conhecer muita gente incrível que me ensinou muito. Em 2023 comecei meus trabalhos com a Cia Ofit e esse foi um marco para mim, mudou minha forma de ver e fazer teatro. Me fez acreditar que é possível trabalhar bem e com dignidade e respeito por todos da equipe, mas também aprendi muito com diretores como o Newton Moreno e o Fernando Yamamoto”, destacou.
Durante o processo seletivo para a EAD, Karine teve que se preparar com textos específicos, e a escolha dessas obras foi marcada por grandes significados pessoais e artísticos. Para a segunda etapa, Karine optou por “Santa Joana dos Matadouros”, de Bertolt Brecht, inspirada pela abordagem do diretor Sérgio de Carvalho, da Cia do Latão, em uma live durante a pandemia.
O diretor discutia o contexto histórico e social da obra, o que despertou em Karine uma conexão com temas fortes e atuais, motivando-a a explorar o teatro brechtiano. Já na primeira etapa, em que o texto era livre, Karine escolheu “Mata Teu Pai”, de Grace Passô, não apenas por sua identificação com a obra, mas também por ser a atriz negra que mais a inspirou no teatro.
“A presença de Passô foi crucial para mim e para que eu acreditasse ser possível viver da arte, e o texto serviu de ponto de partida para a criação de meu próprio solo, ‘Groselha’ a qual performei”.
MS para o Teatro Nacional
Com 11 anos dedicados ao teatro, o repertório artístico que tem acumulado entre ensaios e estudos foi outro aliado da jovem atriz. “Sempre gostei muito do trabalho da Grace Passô, seja como atriz e dramaturga, na verdade, gosto muito do teatro belo-horizontino como o grupo Galpão e o Grupo Quatro Los Cinco. Também, tenho conhecido outros grupos que somam na minha referência de teatro como a Companhia do Latão de São Paulo”, argumenta.
Já o desejo de fazer da arte o seu ofício vem de mais tempo, quando ela assistiu ao filme “Central do Brasil”, no ano de 2014, e se encantou pela atuação de Fernanda Montenegro. Desde então a jovem tem buscado correr atrás dos seus sonhos, participando de aulas e oficinas para atores, apesar das adversidades e desafios típicos do cenário artístico de MS.
“A morosidade nas políticas públicas acaba por ser uma barreira. Muitas vezes, dependemos de editais para nos manter, mas a troca e o aprendizado em grupo têm sido minha maior motivação”, ressalta.
O trabalho de Karine está intimamente conectado com a Companhia de Teatro OFIT. As duas áreas estão muito presentes em sua vida, e tudo o que ela aprende em um lugar leva para o outro. A companhia tem diversos projetos a serem realizados, inclusive neste ano. Para Karine, os estudos potencializam seus trabalhos, e ela pretende continuar, tanto em Campo Grande quanto em São Paulo. As possibilidades são inúmeras, e sua intenção é aproveitar ao máximo todas as oportunidades, tanto nos palcos quanto no audiovisual.
“Minhas expectativas são de me aprimorar como artista e pessoa, além de aumentar as possibilidades de trabalho, espero aprender novas técnicas e aprender também com as habilidades dos meus colegas de turma que são muito diversas”, explica Karine.
Para Karine, representar Mato Grosso do Sul no cenário teatral de São Paulo é uma honra e uma oportunidade de levar a arte sul-mato-grossense aos palcos nacionais.
“É uma chance de mostrar nosso teatro para o resto do país”, afirma. Ela finaliza lamentando a falta de reconhecimento de MS em outras regiões, mas acredita que é fundamental trabalhar para estreitar laços e garantir que a cultura local tenha seu devido espaço no cenário nacional.
Amanda Ferreira
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