** Filipe Gonçalves
Taika Waititi é ator, diretor e roteirista.Um olhar para seus feitos no cinema é deveras interessante,seu novo filme “Jojo Rabbit-2020” tem um brilhante e perspicaz olhar para um assunto um tanto controverso. O nazismo como sabemos foi parte marcante de nossa história recente, Taika desenvolve um roteiro em que um garoto tem Hitler como amigo imaginário e tenta entrar no exército Alemão para fazer parte do conflito. A pergunta é como isso pode dar certo?
O roteiro, adaptado por Waititi tem ótimos diálogo se desenvolve e rende momentos marcantes que dão um toque sutil para uma história tão pesada.Quando um diretor também é o roteirista fica evidente como coloca sorrateiramente alguns pontos importantíssimos, como alguns planos em que a mãe (Scarlett Johansson) amarra os cadarços do menino, ou quando ele está em uma sessão de fisioterapia ela surge de um lance de escadas onde seu sapato dominical vermelho com branco tem destaque em meio ao verde pálido do lugar. Nada é por acaso e lá no terceiro ato entendemos o por quê da insistência pelos pés.
O elenco é fantástico, o estreante Roman Griffin Davis com seu melhor amigo Archie Yates desenvolvem uma amizade muito além do conflito, é espantoso como atores tão jovens tenham um domínio de certos aspectos de suas atuações, com um tom inocente em relação ao propósito da guerra, ou o cuidado para pronunciar algumas palavras com um sotaque Alemão. A digressão que o menino tem com o nazismo ao longo do filme é bem orgânico, uma ótima mão para direção de elenco do Taika que aliás também atua no filme, ele faz o papel de Hitler que é bem caricato como é proveniente da imaginação do menino tem ideias mirabolantes que nem o mesmo leva em consideração. Sam Rockwell como de costume vem entregando papéis bem consistentes e ambivalentes, como em “ três anúncios para um crime – 2018” que era um policial racista que em sua vida baldia encontra um sentido em meio ao caos — boa parte causado por ele mesmo — , papel que rendeu o Oscar de melhor ator coadjuvante.Scarlett tem um papel fundamental, além de ser responsável pelo abrigo da menina judia que naquela época causaria problemas para ela o filho, também é uma grande incentivadora do pensamento crítico de Jojo, mesmo que nem precise falar uma palavra sequer,sua atuação é muito sutil e precisa revelando a astúcia da personagem anti sistêmica e claro vendo o que os ideais nazistas levaram. Infelizmente atriz não levou o Oscar de melhor atriz coadjuvante, também concorreu como melhor atriz por “história de um casamento- 2020” mas quem levou foi Renée Zellweger por “Judy: Muito Além do Arco-Íris- 2019”.
O mérito de filmes como esse,se é que a obra por si só não é uma grande e espetacular forma de contar uma história mirando também algumas críticas. Mas tratar de um tema assim exige muito talento e também sensibilidade de tocar em partes de história que machucam até hoje aqueles que de alguma forma estão ligados às perdas, ou quem passou pelas mais duras provações por meio de ideias insanas alimentadas pelo medo. Taika na transposição de “ Caging Skies – 2004” de Christine Leunens livro no qual esse roteiro é adaptado. Faz de uma com que todos os elementos assumem vida própria na narrativa e andem juntos, a maneiro como objetos são importantes e como são inseridos, como personagens escondem suas ideias e como são capazes de enxergar o escopo e mudar mesmo que seja no fim. Tudo isso corrobora a existência desse filme, e também a fronteira final de onde os filmes sobre o nazismo podem ir, se Taika esgota várias possibilidades de como traçar uma história com esse background pra onde mais essas histórias vão caminhar? Um brilhante filme para você leitor se divertir acima de tudo refletir.
** O autor é cinéfilo e colaborador da TV O Estado