Miss Nikkey MS e 1ª Princesa Nikkey Brasil 2025, Mariáh Arakaki compartilha sua trajetória nos concursos, suas raízes e os desafios enfrentados diante do preconceito
O mundo da beleza e das passarelas é exigente e desafiador. Mas é o desafio que a jovem estudante Mariáh Silva Arakaki Mizuno Prado, de 20 anos, tomou para si ao decidir participar de concursos, ainda em 2023. Mesmo com dúvidas, ela seguiu firme e representou Mato Grosso do Sul na etapa nacional do Miss Nikkey 2025, trazendo a coroa de 1ª Princesa Nikkey para casa.
Com raízes de Okinawa, por parte da família da mãe, e diretamente do Japão, por parte da família do pai, Mariáh participou do seu primeiro concurso em 2023, mesmo sentindo que aquilo ainda não era para ela. Porém, as expectativas foram superadas e logo em sua estreia, Mariáh conquistou o título de 1ª Princesa Nikkey Mato Grosso do Sul 2024.
Com a faixa no corpo e a coroa na cabeça, a jovem relata que finalmente teve a sensação de pertencimento, confiança e conexão com suas origens.
“Participei pela primeira vez em 2023, quando conquistei o título de 1ª Princesa do MS. E quando acabou o concurso, falei: ‘nossa, gostei!’. Porque entrei sem expectativas, ‘se der, deu, e se não der, tudo bem’. Tive a sensação de pertencimento, de sentir onde é o meu lugar, quem eu sou”, revela. “O concurso de Miss Nikkey ajudou a me amar, de verdade”, complementa.

Foto: Nilson Figueiredo
‘Japa’ não é apelido!
Não se sentir pertencente e acolhido dentro do próprio país de origem faz parte da vida de Mariáh. Estudante de escola pública, ela e a família convivem desde a infância com situações de racismo e bullying. A situação se torna ainda mais absurda se considerarmos que Mato Grosso do Sul é a terceira maior colônia japonesa do Brasil, atrás apenas de São Paulo e Paraná.
“Por conta das coisas que ouvi, minha autoestima foi ficando muito comprometida. Mas, ao ver no concurso meninas que têm praticamente a mesma criação que a minha, a mesma descendência, foi a oportunidade de trocar ideias, conhecer, entender”.
Situações de racismo foram contabilizadas desde a infância, tanto de Mariáh quanto do irmão. “Nas escolas em que estudei sempre acabava sendo a única mestiça; sempre fui muito ruim em matemática, e as pessoas acreditam que os japoneses são ótimos. Já escutei muito ‘você não é o orgulho da sua família porque você não tira 10 em matemática’”, relembra. “Sempre é uma questão que você é muito brasileira para ser japonesa e muito japonesa para ser brasileira”.
Além de estereótipos ligados aos estudos, a jovem também precisou enfrentar os preconceitos ligados a aparência.
“Na época em que estava no fundamental 2, falavam que eu era muito magricela, ‘olhos puxados’, ‘japa’, ‘japinha’. Nós somos muito estereotipados. A japonesa tem que ser inteligente, tem que saber tudo de matemática; é muito magra, come de palitinhos. Em outra escola que estudei estávamos em uma prova de história, estudando justamente sobre a Segunda Guerra Mundial. E aí, no meio da prova, um menino fala para mim: ‘se eu jogar uma bomba em você, acontece igual o que aconteceu em Hiroshima e Nagasaki?’”, revela.
Preparação
Passarela, oratória e até discurso realizado em japonês. Essas são algumas preparações que Mariáh precisou fazer. Porém, ela conta que essa não foi sua prioridade no início.
“Eu não me preparei muito no quesito estético para o estadual. Inclusive, para o nacional me organizei um pouquinho mais, mas não tanto quanto outras meninas, porque sou muito ansiosa e nervosa”, confessa.
Foi ali, dentro da própria cabeça, que Mariáh concentrou suas forças, e no apego com a avó, que, mesmo sem estar presente fisicamente, estava ali pertinho do coração da jovem.
“Gosto muito de focar na minha cabeça mesmo, na minha mente. Trabalhei muito minha cabeça. Acabou que esse ano eu tinha uns contratempos, perdi um mês. Eu fiquei internada durante três semanas com uma infecção muito, muito grave. A minha avó também faleceu, então acabou que o luto durou. Inclusive, eu achei até que eu não ia conseguir ir para o nacional, exatamente por conta disso. Fiquei muito mais nervosa do que eu acho que eu teria ficado. Mas, entrei de novo na minha cabeça. No meu discurso falei sobre minha avó, ao mesmo tempo que foi uma tristeza enorme, também foi um incentivo”, relatou emocionada.
Na etapa nacional a jovem relata que percebeu como sua cultura é diferente, da melhor forma possível. “Tinham meninas super lindas, simpáticas. Cada um do seu jeito, cada descendente tem uma mistura, tem uma fisionomia diferente porque normalmente as pessoas falam que japoneses são todos iguais, né? Mas aí quando você está no meio de vários você percebe que não, cada um tem uma coisa que vai divergir e aí vai te deixar mais bonito, do seu jeito”.
Experiência
A etapa nacional foi realizada na última semana, em São Paulo. Mariáh contou que esperava um clima ameno, voltado para competição, mas se surpreendeu positivamente.
“A minha experiência foi muito legal, bem diferente, inclusive do que eu estava esperando, achava que teria um clima até mais tenso, pouca amizade, aquelas rivalidades que normalmente as pessoas falam que tem, mas o clima estava muito gostoso, trocar ideias com descendentes de outros estados, como é a cultura da colonia em cada estado”.
Família e futuro
Companhia da filha, Laís relembra que não pode acompanhá-la no seu primeiro concurso, mas que agora se desdobra para fazer parte dos principais momentos. “Quando a Mariáh falou que iria participar, em 2023, eu estava viajando, eu e meu marido. Mas, para família foi uma emoção muito grande, tanto que quando ela levou o título de Miss Estadual aqui, o meu filho desmaiou. Ele parou o evento, precisou chamar uma ambulância; todo mundo torceu bastante”.

Foto: Nilson Figueiredo
Mato Grosso do Sul já conseguiu garantir, em 2018, a coroa de Miss Nikkey Brasil, com Nathalia Monteiro de Carvalho Tanaka. Para Mariáh, isso mostra como o Estado tem a possibilidade de fazer o evento crescer.
“Precisamos ir para o interior angariar as nikkeis que tem no interior. Porque eu acredito que o nosso festival poderia ser mais divulgado. As pessoas poderiam conhecer mais porque é muito legal. Utilizar do Miss Nikkey como vitrine para o nosso Estado. A cultura japonesa aqui é muito forte”.