Pele Preta: marca autoral transforma a moda em instrumento de memória, ancestralidade e homenagem à líder histórica Tia Eva

Foto: Erick Shinoya
Foto: Erick Shinoya

A moda autoral Sul-mato-grossense ganha novos contornos de memória, identidade e pertencimento com a trajetória da Pele Preta, marca criada há oito anos por Mariana Moraes, em Campo Grande. Nascida do desejo de transformar a moda em um espaço mais inclusivo para pessoas pretas, a marca se consolidou como um projeto coletivo que vai além do vestuário, atuando como plataforma de representatividade, protagonismo e transformação social no cenário cultural da cidade.

Foto: Erick Shinoya

Desde o início, a Pele Preta se construiu como um espaço de troca e reconhecimento, especialmente a partir do projeto Afroestima, idealizado ainda na época em que Mariana mantinha um brechó. A iniciativa oferece a pessoas pretas a oportunidade de produzir portfólios fotográficos semi profissionais enquanto atuavam como modelos da marca, criando uma rede de apoio mútuo que fortalecia tanto as participantes quanto a proposta estética e política da Pele Preta. Mais do que uma estratégia de visibilidade, o projeto ajudou a construir autoestima e acesso a oportunidades em um mercado historicamente excludente.

As estampas da marca carregam esse mesmo compromisso com a memória e a ancestralidade. Inspiradas nos símbolos africanos adinkra, como o Sankofa, que representa a importância de olhar para o passado para construir o futuro, as artes dialogam com valores filosóficos, espirituais e culturais da diáspora africana. Em sua fase mais recente, a Pele Preta amplia esse olhar ao regionalizar suas narrativas, incorporando histórias de mulheres pretas, quilombolas, indígenas e assentadas do Mato Grosso do Sul, revelando identidades que raramente ocupam espaço na moda tradicional.

Foto: Erick Shinoya

Esse movimento se materializa na coleção Tia Eva, que presta homenagem à líder negra considerada uma das fundadoras de Campo Grande. Curandeira, parteira e referência espiritual, Tia Eva simboliza resistência, autonomia e construção coletiva.

As peças da coleção resgatam sua trajetória por meio de cores, símbolos e composições que evocam ancestralidade, território e fé, convidando o público a reconhecer o papel central das mulheres negras na formação do estado. Ao vestir Tia Eva, a Pele Preta propõe um gesto político e cultural: transformar a moda em instrumento de memória histórica e afirmar que celebrar essas histórias é também construir o futuro.

Criação

Criada a partir de uma experiência pessoal marcada pela falta de representatividade, a Pele Preta surgiu em Campo Grande como uma marca autoral que articula moda, identidade e posicionamento político.Para o Jornal O Estado, Mariana Moraes, conta que a iniciativa nasce em diálogo direto com as ausências e os desafios enfrentados por mulheres pretas no mercado da moda, especialmente fora dos grandes centros.

“A Pele Preta nasce da minha vivência como mulher preta e da ausência de referências que me representassem. Desde o início, a marca foi atravessada pela minha história, pelo meu corpo e pela minha estética. Foi um ato político ocupar um espaço que não foi pensado para nós e mostrar que pessoas pretas também produzem moda e cultura”.

Foto: Erick Shinoya

Ao longo de oito anos de trajetória, a Pele Preta se consolidou na Capital como um espaço que articula moda, identidade e ação política, enfrentando os limites de um mercado ainda marcado por desigualdades raciais e econômicas.

A construção da marca exigiu estratégias de resistência para garantir não apenas visibilidade, mas também permanência, ao mesmo tempo em que ampliou seu papel como plataforma de representatividade, acessibilidade e fortalecimento do protagonismo preto.

“O maior desafio sempre foi existir e permanecer. Ver pessoas pretas se reconhecendo na marca, usando a Pele Preta como afirmação de identidade, autoestima e pertencimento mostra que hoje o protagonismo preto aqui não é exceção, é regra”, afirma a criadora.

Símbolos e Afroestima

As estampas da Pele Preta se destacam por estabelecer um diálogo direto com símbolos africanos e referências da ancestralidade, transformando a moda em um campo de pesquisa cultural e narrativa visual. Mais do que elementos estéticos, essas escolhas orientam o processo criativo da marca e reforçam seu compromisso em comunicar identidade, memória e pertencimento por meio das roupas.

“Cada estampa é fruto de uma pesquisa que respeita e valoriza a ancestralidade. Os símbolos não são usados como estética vazia, mas como narrativa. Essas imagens carregam memória, espiritualidade, resistência e identidade, fazendo da moda uma linguagem capaz de contar histórias e reafirmar que a cultura preta segue viva”, explica Mariana.

Foto: Erick Shinoya

O projeto Afroestima teve papel central na consolidação da Pele Preta como uma iniciativa que ultrapassa os limites do mercado da moda e se afirma como espaço de cuidado e articulação comunitária.
Criado a partir da necessidade de fortalecer vínculos e promover representatividade, o projeto contribuiu para a formação de redes de apoio, ampliando o impacto social da marca e reforçando sua atuação junto à população preta em Campo Grande.

“O Afroestima foi fundamental para transformar a Pele Preta em algo que vai além do produto. O projeto nasceu da urgência de criar espaços de acolhimento, troca e fortalecimento emocional: Construímos redes, promovemos encontros, escutas e ações que impactaram diretamente a autoestima de pessoas pretas, reafirmando que moda também é cuidado, política e afeto”.

Nova coleção

Na nova fase da Pele Preta, a coleção Tia Eva surge como um gesto de valorização da memória histórica e de reconhecimento das mulheres pretas que participaram da construção do Mato Grosso do Sul. Ao transformar trajetórias apagadas em narrativa estética, a marca amplia seu papel cultural, utilizando a moda como ferramenta de preservação, educação e afirmação identitária no contexto sul-mato-grossense.

“A coleção Tia Eva marca um momento de maturidade da Pele Preta. É um tributo à memória, à ancestralidade e às mulheres pretas que sustentaram este território”, afirma Mariana.

Para ela, trazer essa história para a moda é um compromisso político: “Tia Eva é fundadora de Campo Grande, mas muitas vezes não aparece nos registros oficiais. A coleção reafirma o protagonismo das mulheres pretas na construção do Mato Grosso do Sul”, finaliza.

Serviço: Para conferir as peças da marca, acesse o Instagram @pelepretabr, o site ou entre em contato pelo WhatsApp (67) 98128-8120.

Por Amanda Ferreira

 

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