Coletivo reúne idealizadores, DJs e pesquisadores para noite especial com lançamento de EP e livro
O coletivo Pantanal Underground celebra uma década de atuação na contracultura campo-grandense com uma festa especial no dia 13 de dezembro, às 23h, no Kafofo. O encontro reúne os DJs André Garde, Jay-C e Nik Ros, nomes fundamentais da trajetória do espaço cultural, e recebe ainda o jornalista, DJ e pesquisador Camilo Rocha, que apresenta em Campo Grande o lançamento do livro “Bate Estaca – Como DJs, Drag Queens e Clubbers Salvaram a Noite de São Paulo”.
A comemoração marca o retorno de artistas que moldaram a cena eletrônica underground da cidade e traz novidades: o lançamento do EP “You And Me”, parceria entre André Garde, Jay-C e Groenendal, pelo selo Cabana Records, acompanhado da faixa “Goma” e de um remix assinado por Nik Ros. Ingressos antecipados têm valor promocional e dão acesso ao sorteio de um exemplar autografado do livro de Camilo Rocha.
Criado em 2015, o Pantanal Underground nasceu da proposta de transformar uma casa no centro de Campo Grande em um espaço multifuncional dedicado à música eletrônica. Em um único endereço conviviam uma escola de produção musical, um estúdio compartilhado, uma agência de DJs e um clube independente com programação constante.
O projeto rapidamente se tornou referência para a cultura clubber da capital, fomentando talentos, expandindo o público e oferecendo um ambiente de experimentação e liberdade que marcou toda uma geração. O início dessa trajetória foi quase acidental, mas acabou consolidando um ponto de encontro decisivo para quem buscava novas sonoridades e possibilidades artísticas.
Passados 10 anos
Convidado para ministrar um curso de produção musical em Campo Grande, o artista espanhol Greencross se deparou, no primeiro dia de aula, com apenas um aluno pagante. Em vez de encerrar a iniciativa, propôs um desfecho inusitado que mudaria o rumo da cena local.
Dessa decisão espontânea nasceu a primeira noite do Pantanal Underground, batizada de Techno Master Class, que rapidamente se tornou um pequeno movimento. Vieram depois as noites fixas, House Lessons, New School, Techno Master Class e o lendário Back to the After, nas manhãs de domingo, todas marcadas pela ausência de fotos e vídeos, preservando momentos intensos e autênticos na memória de quem viveu aquela fase.
“Eu percebi que só havia um aluno e pensei: não faz sentido terminar assim. Então soltei: ‘Vamos fazer uma festa no último dia do curso.’ Nunca imaginei que esse gesto simples se tornaria a primeira noite do Pantanal Underground. A energia era tão verdadeira que não precisávamos de registros, tudo acontecia ali, no corpo, no som, na troca. Era uma cena pequena, mas carregada de honestidade e de uma vontade real de estar junto”, afirma Greencross.
Para o Jornal O Estado, o DJ André Garde relembra que o início do Pantanal Underground, foi marcado por espontaneidade e pertencimento. A primeira Techno Master Class, improvisada e sem grandes expectativas, acabou revelando uma cena latente e uma comunidade que desejava reencontrar-se através da música eletrônica. Para ele, aquele momento deixou evidente que o movimento não era apenas sobre festas, mas sobre reconstruir laços e reconhecer uma demanda afetiva e cultural que já estava ali, esperando para emergir.
“O que mais me marcou foi a empatia e a conexão que se criaram ali. A sensação de família da cultura techno apareceu de forma muito natural. Nada foi planejado. Eu nem esperava que o Greencross sugerisse fazer uma festa no encerramento. Quando chegou a primeira noite, fiquei surpreso. Muita gente que eu não via há anos apareceu. Ficou claro que existia uma vontade coletiva de se reencontrar em torno da música. Ali eu entendi que não era só sobre uma festa, mas sobre reconectar pessoas e criar pertencimento”, afirma André.
Ainda em 2015, a casa foi interditada, encerrando de forma abrupta uma experiência que havia se tornado referência. Apesar do fim precoce, o legado se manteve vivo, tanto na trajetória dos DJs quanto na formação de novos artistas e na memória afetiva de quem viveu aquele período.
Atualmente
Dez anos depois, os três idealizadores se reencontram para celebrar essa história e projetar novos caminhos. Para marcar o momento, recebem Camilo Rocha, um dos mais importantes pesquisadores da cultura clubber no Brasil, cuja obra recupera a história da música eletrônica e a relevância das comunidades que a constroem.
Camilo Rocha já esteve em Campo Grande por mais de uma vez, especialmente nos anos 2000 – auge do club D-Edge, que teve sua origem na Capital sul-mato-grossense, espaço que é citado pelo escritor em sua obra.
“É um livro que traz a história do nascimento do movimento clubber em São Paulo, com foco nos anos 90 e 2000. Fala da revolução musical, comportamental e estética que essa cena trouxe e que reverberou por todo o país. Eu cito Campo Grande como cidade de origem da D-Edge, que depois foi para São Paulo e se tornou uma peça fundamental no desenvolvimento da música eletrônica na cidade e depois uma referência global”, informa.
O reencontro de André Garde com Jay-C e Nik Ros marca um momento de forte nostalgia e celebração na cena eletrônica brasileira. Para ele, a reunião simboliza tanto o fechamento de um ciclo quanto a abertura de outro, valorizando os alicerces da cultura clubber.
“É uma nostalgia muito forte. Dez anos se passaram, mas parece que foi muito menos. A gente sabia que não podia deixar essa data passar em branco celebrar era necessário. O nome do Camilo Rocha surgiu quase naturalmente. Ele é um dos pilares da memória da cultura clubber no Brasil, especialmente pelo trabalho no Rraurl”, completa André.
Novo ciclo
O Pantanal Underground é apontado por André como um marco para a cena underground de Campo Grande, funcionando como verdadeiro estopim para o surgimento de novos projetos, como o Cabana Social Club e o Drama Bar. Segundo o DJ, o espaço foi muito além de festas: ajudou a formar artistas e crews que permanecem ativos até hoje, como a SixNine.
“Muitos DJs tiveram ali o primeiro contato real com o que chamamos de ‘feeling de pista’, entender o público, o tempo da música, a energia do espaço. A turma que era completamente novata naquela época hoje carrega dez anos de bagagem. Isso é legado”.
O lançamento do EP You And Me marca um novo ciclo para André Garde e destaca a cena eletrônica de Campo Grande. A parceria com Groenendal, segundo Garde, surgiu de forma orgânica, com encontros semanais de produção que resultaram em uma faixa por semana. “Este EP representa a conexão que conseguimos manter ao longo do tempo, mesmo com caminhos diferentes. É a nossa música voltando a tocar fora do país e mostrando que a cena local segue viva, criativa e relevante”, finaliza o DJ.
Serviço: O evento será hoje, 13 de dezembro, a partir das 23h, no Kafofo (Rua Dr. Temístocles, 112, Centro, Campo Grande). Os ingressos antecipados têm preço promocional e ainda garantem a participação no sorteio de um exemplar autografado do livro Bate Estaca – Como DJs, Drag Queens e Clubbers Salvaram a Noite de São Paulo. Para mais informações sobre compra de ingressos, siga @kafofocg e @pantanalunderground no Instagram.
Por Amanda Ferreira
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