Jennifer Lawrence e Robert Pattinson se unem em thriller psicológico que expõe, com força e sensibilidade, a espiral emocional de uma mãe à beira do colapso
Quando as estrelas que deram vida a Katniss Everdeen e Edward Cullen se reencontram nas telas, agora em lados sombrios de um mesmo thriller psicológico, o resultado vira compromisso obrigatório para quem acompanha o cinema contemporâneo. Estreia hoje, 27 de novembro, nos cinemas brasileiros, “Morra, Amor” (Die, My Love), protagonizado por Jennifer Lawrence e Robert Pattinson, em uma imersão intensa nos limites da mente humana.
Dirigido por Lynne Ramsa ( Precisamos Falar Sobre Kevin), o filme adapta o romance de Ariana Harwicz e conduz o espectador a um mergulho perturbador na deterioração emocional de uma jovem mãe isolada no interior de Montana, um suspense que transforma paisagens bucólicas em um palco de sofrimento psicológico e tensão crescente.
Na trama, acompanhamos Grace, uma escritora em início de carreira que, após o nascimento do primeiro filho, troca Nova Iorque por uma vida rural na antiga casa de infância do marido. A mudança, porém, desencadeia nela um processo de isolamento e angústia que se intensifica a cada dia.
O pós-parto, marcado por um declínio silencioso de sua saúde mental, torna o ambiente doméstico um espaço de ameaça, onde a fronteira entre realidade e delírio se dissolve. Com a assinatura de Ramsay, reconhecida por suas narrativas emocionalmente densas, Morra, Amor transforma a jornada de uma mulher à beira da psicose em um estudo profundo sobre maternidade, solidão e violência emocional. Não recomendado para menores de 16 anos, o longa chega aos cinemas distribuído pela Paris Filmes, com 118 minutos de uma tensão que cresce cena após cena.

Foto: Reprodução
Produção
Após um hiato de mais de sete anos longe dos longas de ficção, Lynne Ramsay volta ao formato com Die, My Love. Seu último trabalho do tipo havia sido Você Nunca Esteve Realmente Aqui (2017), estrelado por Joaquin Phoenix; depois disso, a cineasta dedicou-se apenas ao curta documental Brigitte (2019). O novo filme reúne um time de peso na produção: Justine Ciarrocchi, Jennifer Lawrence, Martin Scorsese e Andrea Calderwood assinam o projeto.
As gravações ocorreram principalmente em Calgary, no Canadá, entre 19 de agosto e 16 de outubro de 2024, após serem adiadas por conta das greves em Hollywood, que haviam paralisado a agenda inicial prevista para 2023. A fotografia ficou a cargo de Seamus McGarvey, que escolheu trabalhar em película de 35 mm e no formato 1,33:1, inspirado pelo clima inquietante de clássicos como Repulsa ao Sexo (1965) e O Bebê de Rosemary (1968), ambos de Roman Polanski.
Em abril de 2025, veio o anúncio de que Die, My Love faria sua estreia mundial na competição oficial do Festival de Cannes, disputando a Palma de Ouro. No mesmo período, o recém-criado selo 193 assumiu as vendas internacionais do longa. O lançamento comercial nos Estados Unidos ocorreu em 7 de novembro, e, até agora, a produção acumula cerca de US$ 5,4 milhões na América do Norte e US$ 7,7 milhões no total mundial.
Em entrevista ao Letterboxd, Jennifer Lawrence descreveu o longa como “poesia”, creditando a Ramsay uma sensibilidade única, uma diretora que, segundo ela, “sabe criar ritmo, silêncios e metáforas sem recorrer ao óbvio”. A atriz comentou também que sua sintonia com Robert Pattinson se fortaleceu pelo fato de ambos serem pais de bebês, vivendo fases semelhantes na vida pessoal. “Acho que tivemos a chance de observar o que funciona em nossas próprias famílias e também tudo aquilo que poderia ser o oposto disso”, afirmou.
Para compor Grace, Lawrence contou que evitou buscar referências em outras intérpretes. Preferiu, segundo ela, construir a personagem a partir de suas próprias percepções sobre a experiência emocional da protagonista, deixando que esse entendimento guiasse “a maneira como ela se move, respira e se transforma” ao longo da história.
Crítica especializada
No agregador Rotten Tomatoes, Morra, Amor registra 73% de aprovação no Tomatômetro, considerando 230 críticas profissionais, o que indica uma recepção majoritariamente positiva entre especialistas. Já no índice voltado ao público, o Pipocâmetro, formado por mais de 500 avaliações verificadas, o longa aparece com 46%, mostrando uma divisão significativa entre a crítica e os espectadores.
Entre as primeiras análises publicadas, a crítica do AdoroCinema assinada pela cinéfila Katiúscia Vianna destacou o impacto emocional e a contundência de “Morra, Amor”. Em tom bem-humorado, ela comenta que a improvável união das figuras associadas a Katniss Everdeen e Edward Cullen poderia até render uma fanfic perdida na internet, mas, no cinema, o encontro entre Jennifer Lawrence e Robert Pattinson está longe de qualquer fantasia romântica.

Fotos: Reprodução
Para Vianna, o filme funciona justamente por sua dureza: uma narrativa que reforça a urgência de tratar saúde mental com a mesma seriedade com que lidamos com qualquer problema físico. A crítica reconhece que a experiência pode ser mais intensa do que o espectador imagina desejar, mas considera isso um mérito, lembrando que sensibilizar o público talvez seja exatamente o que o mundo precisa agora.
Por outro lado, para Maxwell Rabb, crítico do Chicago Reader, Die, My Love é conduzido quase inteiramente pela força bruta da performance de Jennifer Lawrence, com Robert Pattinson oferecendo um suporte sólido à dinâmica do casal. Rabb destaca que Lawrence se entrega de forma arrebatadora ao estado psicótico de Grace, acompanhando a narrativa caótica proposta por Lynne Ramsay.
O crítico aponta que essa entrega rende uma primeira metade vibrante e hipnótica; porém, segundo ele, Ramsay perde o compasso conforme o filme avança, deixando que a obra se desorganize junto da protagonista. Em sua leitura, o longa acaba soterrado por escolhas estéticas que serpenteiam até um desfecho arrastado, incompatível com interpretações tão afiadas.
Amanda Ferreira