Com olhar sensível para experiências humanas, Delegado de Polícia de MS lança livro sobre o universo investigativo
“Eu quis lançar um olhar, uma luz sobre o profissional policial”, diz Carlos Delano, Delegado da Polícia Civil de Mato Grosso do Sul há quase 20 anos, que lançou na última semana o livro ‘Mariza Queria Ser Livre, uma narrativa que une a adrenalina das investigações criminais com a profundidade das experiências humanas. A obra ainda apresenta bastidores reais, detalha crimes marcantes e revela os efeitos da transgressão de vidas impactadas pela criminalidade.
Em 150 páginas, o Delegado leva o leitor ao universo das dificuldades da apuração policial e traz a história de Mariza, envolvida em uma relação amorosa tóxica. “É uma história que ajuda a gente a compreender o ciclo da violência sem fazer julgamento da conduta da vítima, sem revitimizá-la, mas buscando compreender os vários fatores que levam a pessoa a ficar presa em uma dinâmica como essa”, detalha o autor. Assim como na história de Mariza, Delano usa nomes fictícios e informações modificadas para preservar a identidade das vítimas.

Noite de autógrafos Carlos Delano com o presidente da Adepol-MS e a secretária administrativa Dr. Andre Matsushita e Dra. Francielle Candotti – Foto: Marcos Volkoff/Divulgação
Olhar profundo
A obra vai muito além de detalhar operações da polícia, como uma alusão vazia a um filme de ação. “O livro nasceu da vontade de compartilhar um pouco da realidade que vivemos nas investigações policiais. São histórias que expõem o que nos desafia enquanto profissionais, mas que, sobretudo, nos tocam enquanto seres humanos”, afirma o autor.
“É necessário evitar fazer julgamento sobre as pessoas, sobre suas condutas. Eu me propus a narrar o que ocorreu apresentando fatos sob uma perspectiva diferente, mais humana, para propiciar reflexão sobre o quão complexas são as causas e as consequências dos crimes e como deixam marcas em todos os seus envolvidos”, complementa.
Segundo o Delegado, o livro joga luz a situações cotidianas passadas pelos trabalhadores da segurança pública. “Queria que as pessoas encontrassem um retrato de humanidade dos policiais que trabalham no serviço de investigação, para quem não conhece o cotidiano de uma equipe de investigação policial – algo que a maioria das pessoas não conhece mesmo – entenda como esses que trabalham nessa atividade encontram situações emocionalmente muito complexas, trabalham no limite do cansaço muitas vezes e têm que lidar com situações de risco pessoal, e que a família também padece pela ausência”, compartilha.
São 15 contos inspirados em situações reais, onde o público poderá mergulhar na mente de um policial que atuou em investigações complexas, comandadas por unidades especializadas e na Corregedoria Geral da Polícia Civil de Mato Grosso do Sul.
A cada relato o leitor tentará desvendar, linha após linha, desaparecimentos misteriosos, assassinatos impensáveis e crimes motivados por emoções destrutivas, vingança e desespero.

Lançamento Carlos Delano e o Delegado-Geral da Polícia Civil Dr. Lupersio Delgerone Lucio – Foto: Marcos Volkoff/Divulgação
Dessa forma, “Mariza Queria Ser Livre” também apresenta diversos detalhes sobre como os operários dessa atividade exigente enfrentam as adversidades diárias no combate ao crime.
“O trabalho é ininterrupto, vai noite adentro, e isso é feito por um senso de dever muito, muito forte das pessoas que estão comprometidas com esse serviço. Então, além da adrenalina, das lições, das informações – tudo isso é muito importante – eu quis lançar um olhar, uma luz sobre o profissional policial”, define Delano.
“Quando um crime grave ocorre, é natural que toda a sociedade esteja interessada em saber de sua solução. Em outras ocasiões, como essa, contudo, devemos analisar os efeitos disso para os profissionais que lidam com essa situação e que, muitas vezes, são vistos como peças descartáveis. São humanos. O peso que vem com a responsabilidade da função policial gera consequências na saúde, na vida familiar e em outros campos da vida pessoal. Levar um pouco dessa realidade ao conhecimento das pessoas de fora propicia melhor compreensão de tudo isso”.
E para além do esforço pela concretização da justiça, os agentes de segurança pública ainda têm diante de si os duros desafios de sua própria natureza.
“O policial é um sujeito que tem que lidar com tudo isso e é um ser humano, e tem problemas normais, tem dramas pessoais também. Mas, a despeito disso, trabalha com profissionalismo para lidar com essas questões humanas tão profundas e complexas”.
Com os anos trilhados no combate ao crime, Delano reflete que a maturidade adquirida por meio da vivência no trabalho, abriu seus olhos para a complexidade das relações humanas e sociais, que podem resultar em crimes graves.
“Isso dissolve o desejo de vingança e justiça imediata, que é algo que entorpece a atuação policial e fomenta excessos. Ainda, entender o limite do trabalho investigativo e deixar que os outros órgãos do sistema de justiça façam os deles, como acusar e julgar, esforçando-se para propiciar que façam com maior qualidade com base em uma investigação rica em detalhes. Também passei a perceber que os pequenos detalhes colhidos durante a investigação são tão importantes para o processo judicial quanto os elementos principais do crime investigados, e a caracterização deles demanda esforço extra no trabalho de apuração”.
O Delegado Carlos Delano acredita que a literatura tem um papel fundamental na aproximação da sociedade com os desafios enfrentados pelos profissionais da segurança pública. Para ele, “narrativas apresentadas em forma literária transmitem ideias, sentimentos e realidades que não poderiam ser passadas em uma entrevista ou de outra maneira”. Delano ressalta ainda que a leitura propicia reflexões singulares em cada pessoa, permitindo que diferentes perspectivas sobre o trabalho policial sejam formadas a partir das histórias contadas.
Ao ser questionado sobre o que gostaria que os leitores sentissem ou refletissem ao final da leitura, Delano respondeu com sensibilidade. “Eu ficaria satisfeito se os leitores e leitoras do livro lamentassem pelos crimes ocorridos, pela decisão dos criminosos de cometê-los, pelo sofrimento das vítimas e familiares”, explica. Para ele, a empatia é um sentimento essencial, não apenas pelas vítimas, mas também pelos policiais que dedicam suas vidas à busca pela justiça.
O delegado enfatiza que deseja que o público reconheça o esforço e a entrega dos profissionais de segurança pública. Ele destaca que, por trás de cada investigação bem-sucedida, há sempre “policiais dispostos a abrir mão de rotina, conforto e segurança pessoal”. Dessa forma, ‘Mariza Queria Ser Livre’ não é apenas um livro sobre crimes, mas uma homenagem à coragem, à humanidade e ao comprometimento dos que atuam nas linhas de frente do combate à criminalidade.
Por Carolina Rampi
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