* Marcelo Rezende
Renato Russo, o eterno vocalista do Legião Urbana embalou uma geração inteira com canções de amor, revolta e contestação. Até certa idade usava seu nome de batismo, Renato Manfredini Júnior, mas aos 15 anos sofreu de epifiólise, uma doença que tira os movimentos das pernas. A doença durou dois anos e nesse tempo Renato leu muito. Inspirado pelos filósofos Jean-Jacques Rousseau e Bertrand Russel e pelo cineasta Ken Russel, adotou o sobrenome Russo, que o imortalizaria na música brasileira. Suas principais influências eram as bandas de pós-punk que surgiram na época. Renato Russo se espelhava no trabalho de Robert Smith, vocalista do The Cure, e Morrissey, ex-vocalista da banda The Smiths.
Cantor, compositor, baixista e líder da Legião Urbana, Renato Russo partiu no dia 11 de outubro de 1996, no Rio de Janeiro, vítima de complicações da AIDS. Nascido no dia 27 de março, de 1960, na capital fluminense, ele deixou a cidade quando tinha seis anos. Depois de uma breve passagem com a família por Nova York, morou a partir dos nove anos em Brasília.
Na capital, fez parte da banda Aborto Elétrico, entre 1978 e 1982. Depois, integrou a Legião Urbana, pela qual gravou nove discos e permaneceu até sua morte. Renato Russo também gravou três trabalhos solo: The Stonewall Celebration Concert, Equilíbrio Distante e O Último Solo.
À frente da Legão Urbana, ele se consolidou como um dos mais influentes músicos do rock nacional e deixou clássicos como Será, Geração Coca-Cola, Que País é Este?, Eduardo e Mônica e Faroeste Caboclo. Para alguns fãs, a paixão e a veneração pela banda chegava a ter um tom messiânico, sendo que alguns a chamavam de Religião Urbana. Renato Russo, contudo, sempre rejeitou este status.
Até Dinho Ouro Preto, contemporâneo de Renato Russo nos tempos de Aborto Elétrico, teceu elogios ao Legião, em sua apresentação no Rock in Rio 2019. Além de definir a banda como “melhor banda do Brasil”, o Capital Inicial fez uma versão de “Tempo Perdido”, que Dinho classificou como “um dos momentos mais inspirados do Renato”. Antes, ele ainda desabafou dizendo que “é difícil escolher que música tocar porque uma música é melhor do que a outra”.
Conheci o Legião, em 1987, e pude vê-los ao vivo no estádio Guanandizão em 1990, quando divulgavam a turnê do disco “As Quatro Estações”, que teve 2,6 milhões de cópias vendidas e uma coletânea de singles, tocados à exaustão nas rádios e nos programas de televisão. Esse disco representa também o ápice do grupo e uma profunda mudança estética na sonoridade e no repertório. Na época, com 18 anos presenciei aquele que foi, um dos melhores shows da minha vida. Renato Russo saracoteava pelo palco, horas lembrava Robert Smith, horas agitava os braços tal qual Morrisey. Quando Dado Villa-Lobos deu os primeiros acordes lembro-me de sair pulando, descoordenadamente, curtindo o espetáculo que estava apenas começando. Pais e Filhos me emocionou muito, dez anos depois segurei meu filho no colo pela primeira vez, e chorei lembrando dessa música que assisti ao vivo aqui em Campo Grande.
Outro grande momento do show foi a execução de Monte Castelo, canção carregada de espiritualismo e inspirada nos poemas I Coríntios 13 e Soneto 11, de Luis de Camões. Me lembro bem de ir às lágrimas nessa hora. Renato Russo, visivelmente emocionado, interpretou impecavelmente essa canção. Fui para casa de alma lavada com a certeza de que precisava de uma banda para ter algum sentido à minha vida cheia de incertezas, de quem acabava de entrar na vida adulta, mas que gostaria de extravasar suas frustrações empunhando um instrumento. Alguns anos depois, me tornava baixista dos Bêbados Habilidosos, e Renato Russo é parte disso. Nunca vou esquecer aquele show.