Classe artística avalia o setor e aposta em união para superar crise

Em um ano marcado pela pandemia da COVID-19, o setor cultural foi duramente castigado com o fechamento de bares, teatros, cinemas e cancelamento de eventos. Foi com muita luta e mobilização que a Lei Aldir Blanc foi aprovada, mas ainda há muito a ser feito, segundo a própria categoria, quando o assunto é cultura. Figuras importantes do cenário artístico de Mato Grosso do Sul fazem um balanço de 2020 e falam dos anseios para o ano que já está para chegar.

Presidente do Fórum Municipal de Cultura e também membro do Colegiado de Dança do município e do Estado, Franciella Cavalheri relembra como foi o ano. “Dentro do âmbito municipal, no início da pandemia, a gente vinha num ano tranquilo, embora houvesse atrasos em editais de fomento. Os artistas, de maneira geral, não andam muito satisfeitos com o governo federal. O presidente tirou os artistas do auxílio emergencial e foi aí que começou uma mobilização nacional pela construção e depois pela aprovação da lei Aldir Blanc”, relembra.

Franciella, que também integra a Companhia de Dança Dançurbana, conta que todo o trabalho precisou ser adaptado para que não parasse totalmente. “Às vezes, é necessário se reinventar. A companhia Dançurbana, por exemplo, alugou um apartamento que tem uma sala grande. Um projeto que estava em andamento necessitou ser adaptado para o formato online. Eles não pararam de produzir e conseguiram fazer temporadas solo transmitidas pela internet. Mas a dança de salão, por exemplo, tem mais dificuldade, pois precisa do contato, da proximidade. Quem não conseguiu adaptar-se ficou em situação bem difícil”, pontua Franciella.

Para o presidente do Conselho Municipal de Políticas Culturais André Vilela Pereira, o popular André Samambaia, lembra que o setor cultural deve ser o último a voltar, apesar de ter sido o primeiro a parar. “Claro que nem todos os trabalhadores do setor cultural tiveram exatamente o mesmo impacto. Algumas linguagens e algumas pessoas conseguiram, ainda que parcialmente, se adaptar aqui e ali para ter algum respiro de sobrevivência. Mesmo aqueles que encontraram caminhos, dificilmente atingiram qualquer proximidade com o ritmo de trabalho e remuneração que tinham antes da pandemia. O impacto no setor foi tremendo”, garante.

Sobre a Lei Aldir Blanc, Samambaia lembra que nem metade dos municípios sul-mato-grossense se cadastraram para receber os recursos. Segundo ele, Campo Grande deve devolver ao governo federal R$ 1,6 milhão dos R$ 5,5 milhões recebidos.

”MS está comemorando que usou cerca de 25% do recurso e que isso nos coloca entre os cinco estados que mais usaram. Mas é muito pouco e muito triste imaginar devolver R$ 16 milhões que poderiam atender tanta gente. As comunidades indígenas, artesãs terenas e de outras etnias, artistas de rua, pequenos sebos, quantos foram contemplados? Artistas que nunca participaram de editais, quantos conseguiram responder a isso agora?”, questiona André.

Diante do cenário desanimador da Lei Aldir Blanc em Mato Grosso do Sul, André Samambaia defende a prorrogação do prazo para execução do auxílio. Na avaliação dele, municípios e estados precisariam de mais tempo para usar a parte do recurso ainda disponível. Assim, seria possível alcançar novos produtores culturais que, por ventura, não se encaixaram nos editais já publicados.

Fernando Cruz, ator e diretor do Grupo Teatro Imaginário Maracangalha, acredita que através da união da classe artística é possível cobrar o poder público efetivamente. “Uma boa parte do recurso vai voltar e fica evidente que a burocracia afeta o nosso setor. Ela está presente e não dá mais para maquiar. A gente tem que se juntar com artistas e mudar isso na ocupação dos espaços públicos. Eu acho que é positivo reconhecer que nós não podemos fazer nada sozinhos. A gente precisa fortalecer nossas vivências e ações coletivas para transformar o mundo e transformar o nosso meio”, defende.

A cantora, compositora, musicista e escritora Lenilde Ramos aposta em um posicionamento de luta para garantir os direitos de quem trabalha com a cultura. “Sem dúvida, 2020 foi uma grande prova para todos. Mesmo pensando positivo, vejo que 2021 continuará sendo, mas com perspectivas melhores de vencermos essa corrida de obstáculos. Esse foi o ano do ‘o rei está nu’ porque esse vírus expôs nossas fraquezas e nossa capacidade de superação. A ordem é sobreviver e continuar lutando”, finaliza.

(Texto: Marcelo Rezende)

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