Oficina mostrará como o trabalho manual já ultrapassou as práticas e se tornou arte pura
O bordado é, tradicionalmente, associado às práticas artesanais e ao universo doméstico, realizado por mulheres mais velhas, por exemplo. Mas, nos últimos tempos, as artes manuais ganharam destaque entre pessoas de todas as idades, e ocuparam locais como o da arte contemporânea, com uma ampliação de seu potencial expressivo e simbólico. Uma das novas vertentes é o bordado em fotografia. Não conhece? A Casa de Cultura de Campo Grande realiza neste sábado (28), uma oficina da técnica, para interessados, sem precisar de conhecimento prévio.
Nessa técnica, o bordado deixa de ser apenas algo estético/decorativo, e passa a funcionar como meio de criação e resistência, e atravessa as fronteiras entre artesanato, artes visuais, moda e design. Ele combina duas modalidades, e consistem em adicionar elementos bordados à imagem fotográfica, criando uma peça com elementos visuais e até textuais. Essa hibridização de linguagens — ao incorporar bordado a outras práticas artísticas, como pintura, escultura, fotografia e instalação — dá origem a obras potentes que exploram texturas, narrativas pessoais e coletivas, além de reflexões sobre gênero, memória e identidade. Assim, o bordado artístico e criativo revela-se um território fértil para experimentações estéticas e conceituais, abrindo novos caminhos para o diálogo entre o tradicional e o contemporâneo.
Como será
“A oficina terá três horas de duração e será dividida em duas etapas; a primeira será um pouco mais breve, e vamos distribuir uma material didático para cada participante, e faremos um contexto histórico sobre o bordado na arte. A nossa intenção é desvincular o bordado, o trabalho com linha e agulha, como apenas manual, se tornando uma ferramenta de produção artística mesmo. Vou abordar alguns artistas e apresentar algumas propostas, mostrando de que forma conseguimos utilizar as técnicas tradicionais de bordado em uma produção artística e contemporânea”, explicou ao jornal O Estado o especialista em educação, arte e cultura, coordenador da Casa de Cultura e um dos ministrantes do curso, Diego Torraca.
Cada aluno levará sua própria foto, e durante a oficina outras intervenções poderão ser feitas na imagem como recortes e colagens, conforme a estética que o aluno quiser ter no seu trabalho e as referências passadas.
A artesã e artista Kelly Jara, que trabalha com bordados há 14 anos, também será ministrante da oficina. “Em um segundo momento, a professora Kelly ensinará a técnica do bordado, teremos alguns pontos básicos e a partir dai o aluno colocará a sua expressão artística dentro da sua imagem. Vamos disponibilizar também imagens impressas, para que o aluno possa fazer as outras intervenções”.
Referências
A oficina trará como referência artistas como Leonilson (trouxe o bordado para universo da arte contemporânea, com peças que abordam mémorias, sentimentos e desejos), Clarice Borian (utiliza o bordado em folhas secas, como forma de criar imagens que unem técnicas tradicionais a uma estética contemporânea), Pedro Luís Figueiredo (explora o bordado artístico como linguagem para tratar questões identitárias e sociais, com criações que combinam bordado e outros materiais, como a fotografia) e Heloísa Marques (desenvolve um trabalho em que o bordado criativo dialoga com a pintura e o desenho).
Para a reportagem, a professora Kelly relembra que o bordado faz parte da família e das memórias. “Faço bordados desde pequena, é uma tradição de família: minha mãe, tia, todos fazem. Aprendi o choche aos seis anos, quando me pedi para me ensinarem”.
Acostumada com o bordado em tecidos, a técnica em fotografia será um novo desafio para a carreira. “Fazer em fotografia foi um desafio que aceitei. Sempre faço em panos, mas quando me convidaram fui testar em fotos e ficaram lindas. As técnicas são as mesmas, o que muda é o material. Vou ensinar os pontos atrás, haste, margarida, nó francês e o ponto rosa”, explica.
Como educador, Torraca já havia explorado a técnica. “Eu utilizo a técnica desde 2018, quando ainda era professor, com alunos de 9º anos. Bordávamos em papel, folhas de árvores e também em tecido”, recorda.
Ele vê como necessário o surgimento de novas vertentes nas produções artísticas. “Surge da necessidade de explorar novos materiais e testar possibilidades. A arte contemporânea propicia essas experimentações. Tanto o bordado, que nos remete às nossas avós, mas trazendo em uma roupagem nova, e a fotografia, que nos traz também essas memorias afetivas, a infância, os acontecimentos bons que vivemos”, opina.
Para além do resultado, os ministrantes acreditam que a oficina só tem a agregar. “Acredito que o ganho pessoal prevalece, pois a técnica desperta memórias de entes queridos e nos levam para lugares até então esquecidos. Através do bordado eu acredito que nossa imaginação viaja para além do esperado”, disse o coordenador.
“Acredito que seja um misto porque para cada pessoa a oficina pode despertar um propósito diferente. Para algumas o fator da memória pode desencadear uma pesquisa bem aprofundada, para outros, a técnica do bordado pode ser levada a um patamar mais técnico e manual”, finaliza Kelly.
Serviço: O curso será no sábado (28), às 9h30, na Casa de Cultura, av. Afonso Pena, 2270. Mais informações pelo telefone 2020 4310 ou redes sociais.
Por Carolina Rampi