Família e amigos se despedem de artista, que lutava contra doença desde 2023
O Brasil perdeu mais uma voz este ano: a cantora Preta Gil, de 50 anos, morreu nesse domingo (20), após intensa luta contra o câncer colorretal. Consagrada no meio da música, a artista fez seu nome ser reconhecido apesar do sobrenome de peso, navegando nos gêneros como axé, samba e pop. Em 2023 ela recebeu o diagnóstico da doença e tratava a doença desde então. No momento de sua morte, Preta estava nos Estados Unidos, para realizar um tratamento alternativo.
Filha de Gilberto Gil com Sandra Gadelha, afilhada de Gal Costa, sobrinha de coração de Caetano Veloso (que foi casado com Dedé Gadelha, irmã de Sandra) e Maria Bethânia, prima da atriz Patrícia Pillar e Luiza Possi, mãe de Francisco Gil e avó de Sol de Maria, Preta Gil carregava o amor pela família em suas músicas e em suas lutas.
A carreira como produtora cultural começou aos 16 anos, na organização do Prêmio Sharp (atual Prêmio da Música Brasileira). Nos anos 90 trabalhou nas produtoras Conspiração e Dueto, criando videoclipes para Ivete Sangalo e Ana Carolina, além de ter dirigido materiais para grupos como KLB e SNZ.
Em 2017 fundou a empresa Music2Mynd, que realiza agenciamento de artistas e marketing de influência, impulsionando a figura do artista como criador de conteúdo para plataformas digitais.
Na música
Sua jornada na música começou com o disco ‘Prét-A-Porter, 2003, projeto realizado com diversos outros artistas. Na sua discografia constam mais três álbuns autorais, ‘Preta’, de 2005, ‘Sou Como Sou’, de 2012, e ‘Todas as Cores’, de 2017, que traz colaborações com Gal Costa, Pabllo Vittar e Marília Mendonça. Ela ainda lançou dois discos ao vivo baseados nos shows ‘Noite Preta’, em 2010, e ‘Bloco da Preta’, em 2014. Entre seus principais sucessos estão ‘Sinais de Fogo’ (2003), ‘Espelhos d’água’ (2003), ‘Batom’ (2012), ‘Decote’ (2017), ‘Vá se benzer’, com Gal Costa’, ‘Só o amor’ (2019), ‘Meu Xodó’ (2021).
A última vez que Preta Gil subiu aos palcos foi ao lado do pai, em São Paulo, em uma apresentação emblemática, feita de surpresa durante show da turnê de despedida de Gilberto Gil, ‘Tempo Rei’. A dupla cantou ‘Drão’, música feita para Sandra Gadelha. No telão do show, foram exibidas imagens de arquivo da família, com um coro de ‘Preta! Preta!’ do público.
Voz
Desde o início de sua vida pública, Preta lutava incansavelmente pelas causas LGBT e feminista, pelo fim do racismo e gordofobia, dos quais foi vítima diversas vezes. Assumidamente bissexual, sempre defendeu a própria liberdade estética, mesmo estando fora do que muitos consideram o ‘padrão’ corporal.
Em 2016, época em que o racismo ainda corria desenfreado nas redes sociais, Preta sofreu uma onda de ataques, sendo chamada de ‘macaca’ e que deveria ‘voltar para a senzala’, em sua página pública. A artista não se calou e levou o crime para a delegacia, onde prestou queixa e incentivou outras vítimas a fazerem o mesmo.

Carolina Dieckmmann e Preta Gil – Foto: Reprodução
Repercussão
Conhecida por espalhar afetos, após a notícia de sua morte, amigos e celebridades prestaram homenagens a
Preta Gil nas redes sociais. A atriz Carolina Dieckmmann e o influenciador Gominho eram os melhores amigos de Preta, e estavam ao lado dela em seus últimos momentos, nos Estados Unidos, após o agravamento da saúde da cantora. Nas redes sociais, Dieckmmann publicou uma foto segurando a mão da amiga e texto em homenagem.
“Não sei o que dizer… Estou sozinha no aeroporto, indo embora sem você. Esses últimos quatro dias, estar tão perto de você, foi o maior presente do mundo”, agradeceu. “O universo se abriu para que eu estivesse aqui. Nossa conexão me chamou, e eu vim. Descansa, meu amor. Como você lutou… Vai ser muito difícil. Vou morrer de saudade”.
Também amiga de longa data, Ivete Sangalo homenageou Preta com um vídeo de uma apresentação das duas e texto relembrando a conexão que tinham. “Me apaixonei por você no mesmo instante que nos encontramos. Foi fulminante e ainda é. Que caminhada, hein! Eu nem sei o que escrever pra você, porque meu coração tá tão pequenininho. Mas quero lhe dizer que bom que a gente se encontrou por aqui.”

Ivete Sangalo e Preta Gil – Foto: Reprodução
Ivete também destacou a luta de Preta contra o câncer e a falta que a cantora fará. “Não consigo entender essas notícias sobre sua partida. A sua luz é tão forte que, mesmo com toda essa loucura, nos fortalece. Você, tão corajosa, minha Pretoca, tão firme e valente. Ah, como eu vou sentir sua falta, viu”, escreveu. “Te amo infinito. Siga, meu amor, sem dores, sem tristeza. Siga em paz”.
Em nota publicada nas redes sociais, Gilberto Gil afirmou que a filha morreu em Nova York e que a família está em processo de repatriação do corpo da cantora. “Pedimos a compreensão de tantos queridos amigos, fãs e profissionais da imprensa enquanto atravessamos esse momento difícil em família. Assim que possível, divulgaremos informações sobre as despedidas”.
Diversos políticos também repercutiram a morte da cantora, e prestaram homenagens. “Estou profundamente triste em saber que Preta Gil nos deixou nesta noite de domingo. Talentosa e batalhadora em tudo o que fazia – seja como artista, seja como empresária – Preta seguiu espalhando a alegria de viver mesmo nos momentos mais difíceis de seu tratamento. Preta era uma pessoa extremamente querida e admirada pelo público e pelas pessoas que tiveram a felicidade de conviver com ela. Os palcos e os carnavais que ela tanto animou sentirão sua falta”, disse o Presidente Lula.
“Assim que soube da triste notícia, liguei para o companheiro Gilberto Gil e para Flora, para confortá-los nesse momento de dor. À toda família de Preta, Sandra, o filho Francisco e à neta Sol de Maria, quero deixar um abraço amigo e carinhoso. Que o amor que Preta compartilhou em sua vida siga acalentando os seus corações – e os corações de todas as pessoas que tanto a admiravam”, completou.
O vice-presidente Geraldo Alckmin disse que Preta foi uma artista que iluminou a vida da população, quebrou padrões e que lutou contra o preconceito. “Hoje, o Brasil se despede de @PretaGil, uma artista que iluminou nossas vidas com sua alegria contagiante e irreverência. Preta quebrou padrões e lutou contra o preconceito, sempre com coragem e autenticidade. Envio meus mais profundos sentimentos e minhas orações a @gilbertogil e toda sua família e amigos”, publicou nas redes sociais.
O prefeito do Rio de Janeiro, Eduardo Paes, disse que poucas vezes conheceu uma pessoa que trouxesse vibrações tão boas e que espalhasse alegria e amizades onde chegasse.
“Que tristeza ver uma pessoa assim nos deixar! Quero manifestar meu mais profundo pesar pela passagem da @pretagil. Que Deus possa confortar o coração dos fãs, da enorme legião de amigos dela, dos familiares e especialmente desse grande cara, meu amigo @gilbertogil. Toda força do mundo pra vocês!”, disse.
O governador do Rio de Janeiro, Cláudio Castro (PL) decretou luto oficial de três dias no estado. “Símbolo de representatividade na cultura brasileira, a voz da artista ecoou em causas sociais importantes, sempre com autenticidade, deixando um legado de alegria”, diz nota oficial divulgada pelo governo. Em publicação nas redes sociais, Castro disse que o país perdeu uma das mulheres mais marcantes da música e da cultura.
“Mais do que artista, Preta foi um exemplo de força e dignidade. Enfrentou com bravura a luta contra o câncer, compartilhando sua jornada com o país e inspirando milhares de pessoas com sua coragem e fé”, escreveu. O governador prestou solidariedade ao cantor Gilberto Gil, pai de Preta, à família, amigos e fãs.
Presidente da Aliança Nacional LGBTI+, Toni Reis, também lamentou a morte de Preta Gil. “Preta foi uma grande defensora dos direitos LGBTI+, uma pessoa que lutou com muita categoria, classe e coragem por uma sociedade mais justa, antirracista e livre da gordofobia”, escreveu. “Que Deus, os orixás ou quem você acreditar, acolham sua essência com amor, paz e luz. Que a memória de Preta Gil inspire muitas gerações a seguir lutando por um mundo mais igualitário e cheio de amor”.

Preta Gil posa com a madrasta Flora Gil e com o pai Gilberto Gil – Foto: Reprodução
MS
A Deputada Federal, Camila Jara (PT), que este ano foi diagnosticada com câncer de tireoide, publicou texto nas redes. “Recebemos com imensa tristeza a notícia da morte de Preta Gil. Preta lutou até o fim por uma vida que valia a pena ser vivida. Hoje, Preta se foi, mas deixou sua intensidade marcada na história da arte brasileira. Nossos sentimentos”.
A senadora do Podemos-MS, Soraya Thronicke, também prestou condolências. “Hoje o Brasil se despede de uma mulher que foi sinônimo de força. Preta Gil enfrentou uma doença cruel com coragem e dignidade, e deixou um legado de amor, autenticidade e resiliência”.
Ministra do Planejamento e Orçamento do Brasil, Simone Tebet (MDB), destacou a força de Preta. “Preta Gil foi uma voz potente em defesa da liberdade e do amor. Com coragem e autenticidade, enfrentou preconceitos, quebrou padrões e abriu caminhos para que tantas outras pessoas pudessem se expressar sem medo. Sua representatividade vai fazer falta, mas seu legado seguirá vivo.
Para o jornal O Estado, as cantoras Karla Coronel e Pretah comentaram a importância de Preta Gil para a música e para a formação cultural e social.
“A partida da Preta Gil me tocou profundamente. Sempre me identifiquei com a sua alegria de viver, sua coragem em ser quem é, e a forma linda como se conectava com as pessoas – especialmente com o público LGBTQIAP+, que também faz parte da minha trajetória como artista e como pessoa. Preta foi muito além do palco: ela foi uma presença forte na música, na luta por respeito, afeto e liberdade. Sua voz e sua postura deixaram marcas importantes na cultura brasileira. A comoção que sua morte causou mostra o quanto ela era amada e necessária. Vai fazer muita falta, mas sua luz e legado continuam vivos em todos nós”, disse Pretah.

Preta e irmã Bela Gil – Foto: Reprodução
“Falar da Preta Gil é falar de uma mulher que abriu caminhos com o próprio corpo, com a própria voz, com coragem. Como mulher preta e artista, eu sei o que é sentir que o mundo não foi feito pra gente — e ver a Preta ali, cantando, ocupando espaço, sendo livre, foi como respirar fundo e entender que a gente também pode”, destacou Karla.
Ela também enfatizou a importância de Preta ao se colocar como voz representativa de tantos públicos e emoções. “Ela foi uma das poucas artistas que sempre abraçou o diferente, que não se escondeu atrás de rótulo nenhum. Falava de amor, de prazer, de dor e de política — tudo junto, tudo dela. E o quanto ela foi importante pro público LGBTQIA+ não dá nem pra medir… Preta foi casa pra muita gente”.
Karla ainda finaliza pontuando que a perda da artista será sentida, mas que seu legado continua nos palcos, lutas e amizades. “Preta Gil é ancestral nova. Vai seguir pulsando em cada som, em cada corpo livre, em cada festa onde a gente puder ser quem se é”.
Por Carolina Rampi (com informações da Folhapress)