Marcelo Rezende
Há cerca de dois anos, todas as sextas-feiras eu escrevo esta coluna relacionada a datas e acontecimentos especiais. Os textos tratam de personalidades importantes de cinema, música, quadrinhos, televisão e cultura pop em geral. Gosto de homenagear artistas em vida, mas também presto tributo àqueles que já partiram. Desta vez venho prestar reverências a um artista que muito admiro e que faz parte da minha infância, adolescência e que vou carregar eternamente no coração. No fim da tarde de quarta-feira, fui pego de supetão com a triste notícia do falecimento de José Mojica Marins, o “Zé do Caixão”.
Ele tinha 83 anos e estava internado há cerca de 20 dias no Hospital Santa Maggiore, desde que contraiu uma infecção que evoluiu para uma pneumonia. Ele chegou a ser entubado e teve os tubos retirados após apresentar melhora, mas sua situação voltou a piorar na terça. Ausente da mídia desde 2014 , quando sofreu um enfarte, os problemas de saúde foram se agravando e ele parou de dar entrevistas por conta da fraqueza e de uma degeneração mental ocasionada pela velhice.
No ano passado, prestei homenagem ao Mojica, aqui na coluna, celebrando seus 83 anos completados no dia 13 de março. É triste. Hoje venho aqui dar adeus ao meu ídolo de infância. Aos 13 anos descobri seus filmes e virei fã. Mojica era diretor de cinema, ator, roteirista e produtor de televisão. Autodidata fazia seus filmes de forma artesanal e simplória que agradaram a ,uma legião de fãs no Brasil e mundo afora. Ele utilizava atores, técnicos e produtores de primeira viagem, improvisados, que pagavam para participar do filme por meio de cotas e, assim, financiavam a obra. Isso tudo pode ser conferido na obra “Maldito”, de André Barcinski e Ivan Finotti, uma biografia definitiva para quem quer conhecer a trajetória do gênio, muitas vezes incompreendido.
Na década de 1990, Zé do Caixão apresentou o programa “Cine Trash”, que, como o próprio nome diz, exibia filmes de terror de baixo custo e divertidíssimos, com intervenções de Mojica sorteando VHS de filmes de terror e rogando a sua praga do dia. Esse era o momento mais esperado por mim. O programa obteve alta audiência e as apresentações macabras de Zé do Caixão se tornaram um marco na televisão; o programa foi exibido na Rede Bandeirantes. Que saudade, quanta nostalgia!
Mojica teve seus títulos lançados na Europa e nos Estados Unidos, onde participou de mostras, festivais, recebeu prêmios e foi reconhecido por atores e diretores de filmes de terror. No Brasil, infelizmente, não conseguiu o mesmo sucesso e reconhecimento. Existem poucos títulos de seus filmes disponíveis no mercado, o que tornou sua obra pouco conhecida. De 2008 a 2013, Mojica apresentou “Estranho Mundo de Zé do Caixão”, no Canal Brasil. Era um talk show excêntrico com entrevistas bem-humoradas que revelavam curiosidades, histórias engraçadas e o lado obscuro de celebridades, em que frequentemente ele trocava o nome dos convidados, o que tornava o programa mais hilário ainda.
Sempre que me perguntavam sobre qual personalidade eu gostaria de entrevistar, eu respondia na lata: José Mojica Marins! Infelizmente não consegui esse feito, mas li tanto sobre ele, assisti a seus filmes, curti os programas de televisão, que parece que o conheço como se fosse um velho amigo ou um parente querido. É exatamente isso que me deixa mais triste neste momento. Mesmo sabendo que a obra cinematográfica, pelo menos em parte, esteja disponível, ele vai fazer muita falta. Sua genialidade vai deixar saudades, o português errado que ele falava, a postura cênica e principalmente a simplicidade daquele que foi sem dúvida nenhuma, ao menos para minha pessoa, um dos maiores gênios do cinema brasileiro. Descanse em paz, Mojica, e obrigado por tudo que fez.
- Editor do Caderno de Arte & Lazer do Jornal O Estado