‘Ainda Estou Aqui’ no Oscar: cineastas de MS comentam que vitória foi merecida e significativa

Walter Salles - Foto: Frederic J. Brown/AFP
Walter Salles - Foto: Frederic J. Brown/AFP

A repercussão da história: o filme levou o Oscar 2025 de Melhor Filme Internacional

Tal qual como Rebeca Andrade nas Olimpíadas, o Brasil cravou sua participação no Oscar de 2025 ao ganhar a estatueta como Melhor Filme Internacional com o filme ‘Ainda Estou Aqui’, no último domingo (2). A premiação, realizada em Los Angeles, mostrou para o mundo o poder do cinema brasileiro e da sua história, de um passado que não deve ser jamais esquecido.

A campanha do filme já foi digna de Oscar: o brilhantismo de Fernanda Torres, que deu vida a Eunice Paiva, contagiou os atores ‘hollywoodianos’; a inteligência e humildade de Walter Salles foi primorosa para a divulgação da história dos Paiva. Crítica especializada rasgou elogios para as atuações e direção, e rendeu a exibição do longa em mais de 700 salas de cinema, só nos Estados Unidos. No Brasil, o filme está há 18 semanas consecutivas com exibição. Antes do anúncio do Oscar, o filme já havia recebido prêmios no Globo de Ouro, Goya, Festival de Veneza, Festival Internacional de Roterdã, entre outros.

Há tempos, o Brasil batia na trava em relação à premiação. Em 1960, a obra ‘Orfeu Negro’ venceu o Oscar como Melhor Filme Estrangeiro, mas a estatueta ficou para a França, país do diretor Macel Camus. O Pagador de Promessas (1963), O quatrilho (1996), O que é isso companheiro? (1998), Central do Brasil (1999, também de Salles e com Fernanda Montenegro como protagonista) e Cidade de Deus (2004) também passaram pela premiação, mas sem levar nada. A conquista de Ainda Estou Aqui é histórica.

Eu cheguei de muito longe

O longa é baseado no livro de mesmo nome, de Marcelo Rubens Paiva, e traz como protagonista Eunice Paiva, que lutou de forma incansável por 40 anos em busca de justiça pelo marido, o ex-deputado Rubens Paiva, sequestrado e assassinado na Ditadura Militar (1964-1985). Símbolo de resistência conta a ditadura, Eunice equilibrou uma vida de busca sobre o paradeiro de Rubens e as responsabilidades familiares, ao tomar as rédeas de uma casa sem um de seus pilares principais. Marcelo é um dos filhos de Eunice e Rubens.

Para Salles, a produção cativou e mobilizou por ser uma história sobre resistência, em um contexto de fragilidade democrática que percorre o mundo.

“Em nome do cinema brasileiro, é uma honra tão grande receber isso de um grupo tão extraordinário. Isso vai para uma mulher que, depois de uma perda tão grande no regime tão autoritário, decidiu não se dobrar e resistir… Esse prêmio vai para ela: o nome dela é Eunice Paiva. E também vai para as mulheres extraordinárias que deram vida a ela. Fernanda Torres e Fernanda Montenegro”, disse Walter Salles durante seu discurso e agradecimento.

Nas redes sociais, Fernanda Torres, que infelizmente perdeu na categoria de Melhor Atriz, celebrou a estatueta como Melhor Filme Internacional. “Nós vamos sorrir. Sorriam”, em alusão a uma fala de Eunice no filme. “Ainda Estamos Aqui Comemorando”, postou em foto onde segurava o troféu ao lado de Walter Salles,

Selton Melo, que deu vida a Rubens Paiva, também celebrou a conquista. “Todos ganhamos hoje. Os sensíveis ganharam esse prêmio com a gente. Celebrem muito. Isso aqui é histórico”. Ainda no texto, Selton diz que o longa seria “importante e necessário de qualquer maneira”, mas que o troféu “celebra a equipe, aditiva o filme, honra a família Paiva e, mais do que isso: aumenta consideravelmente o interesse no nosso potente cinema brasileiro”.

Mas enfim aqui estou

Diretor e curador sul-mato-grossense, Joel Pizzini disse ao jornal O Estado que o Oscar foi uma conquista significativa para o cinema brasileiro. “Ele volta a recuperar o seu prestígio internacional, abrindo espaço no mercado exterior para futuras coproduções”, pontua.

“Além de prestar contas com a memória de Rubens Paiva, sequestrado pelo regime de exceção, o filme traz a luz a luta de Eunice Paiva que não sucumbiu a essa tragédia e se dedicou até o final da vida à defesa dos povos originários, salvando inclusive a etnia Zoró de Mato Grosso ameaçada nos anos 80 de extinção. Embora tenha sido injustiçada, Fernanda Torres encarnou Eunice com brilho e o filme tem o mérito, sem retórica, de conectar a nova geração com um passado sombrio de nossa história que setores retrógrados tentam apagar sistematicamente”, destaca.

Também cineasta, roteirista, diretor e produtor sul-mato-grossense, Filipi Silveira, chama a obra de Salles de “unicamente brasileiro”.

“Em aspectos de narrativa, técnico e elenco estavam em uma harmonia que não é fácil de chegar, esse time formado por esse longa já se esperaria algo muito bom, mas ao assistir todo cuidado que tiveram chegaram ao extraordinário, é difícil de chegar. Todo este reconhecimento foi simplesmente merecido e agora se a cereja do bolo”, comentou.

Silveira ainda comenta que a ode ao filme fez o cinema nacional despontar não só em território internacional, mas dentro do próprio país. “Quando o filme chega no público é maravilhoso! Este filme é premiado, está sendo visto também em vários países e levou o público brasileiro de forma muito potente aos cinemas até hoje com esta história tão poderosa. Com ou sem Oscar, já é um vencedor e espero que de agora em diante possamos lotar cada vez mais as salas de cinema para ver nossos filmes. Que a retomada venha com força”.

Com o filme ainda em cartaz nos cinemas, o sucesso é um impulsionador, segundo Silveira.
“O cinema se faz de dinheiro e público, países com uma indústria local potente só brilhará quando o público e o sistema de distribuição de seu país de origem impulsionar os filmes locais”.

Pela mão de gente grande

Na noite de domingo (2), o presidente Luiz Inácio Lula da Silva comemorou nas redes sociais a conquista do Oscar. “Hoje é o dia de sentir ainda mais orgulho de ser brasileiro. Orgulho do nosso cinema, dos nossos artistas e, principalmente, orgulho da nossa democracia. Eu e Janja estamos muito felizes assistindo tudo ao vivo”, afirmou Lula.

O presidente ainda citou a importância da temática do filme. “O Oscar de Melhor Filme Internacional para Ainda Estou Aqui é o reconhecimento do trabalho de Walter Salles e toda equipe, de Fernanda Torres e Fernanda Montenegro, Selton Mello, do Marcelo Rubens Paiva e família e todos os envolvidos nessa extraordinária obra que mostrou ao Brasil e ao mundo a importância da luta contra o autoritarismo. Parabéns! Viva o cinema brasileiro, viva Ainda Estou Aqui”,

O vice-presidente da República, Geraldo Alckmin, também publicou nas redes sociais. “Um orgulho para todos os brasileiros e brasileiras que, em meio ao carnaval, pararam para assistir nosso país ser reconhecido mundialmente pela sua arte e pela defesa dos valores democráticos, tão bem representados pela família Paiva.”

Autoridades de Mato Grosso do Sul também publicaram em suas redes. “Fernanda Torres pode não ter levado o Oscar, mas levou o Brasil ao topo! Sua atuação foi grandiosa e seu talento é inquestionável. Por aqui, somos só orgulho dessa gigante do nosso cinema, e de toda a equipe de “Ainda Estou Aqui”, que levou o Oscar na categoria Melhor Filme Internacional”, escreveu a líder da bancada federal do Estado, a senadora Thronicke.

O governador do Estado, Eduardo Riedel (PSDB), república a foto de Torres com Salles. “Um momento de celebração para o cinema brasileiro e para nossa cultura, que brilha no cenário mundial”.

Mas não vou ficar calado, No conforto, acomodado

Quem também publicou em suas redes sociais foi a ex-presidente Dilma Rousseff. Vítima da ditadura, o pronunciamento dela traz forte alusão a situação vivida pela família Paiva. Foi graças a Comissão Nacional da Verdade, desenvolvida durante o governo Dilma, que o escritor Marcelo Rubens Paiva conseguiu resgatar a história da família.

“A premiação celebra uma obra que presta tributo à civilização, à humanidade e aos brasileiros que sofreram com a extinção das liberdades democráticas, lutando contra a ditadura militar. Trata-se de uma vitória internacional histórica, que honra a todos os que se foram, assim como reverencia aqueles que ainda estão aqui, defendendo a democracia e combatendo o fascismo. Meus aplausos a todos que tornaram esse filme possível”.

Por Por Carolina Rampi

 

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